"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

A DESTRUIÇÃO DA SOCIEDADE E DA DEMOCRACIA

 

Tomemos o caso de Portugal. Por conta da má gestão financeira de governos sucessivos e da incúria na administração pública, Portugal quebrou. A receita imposta pelos alemães é dura. Muito dura.

A ponto de alguns, como o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, estar advertindo para o desmantelamento do Estado social em seu país por conta das medidas de austeridade estabelecidas pela Comunidade Europeia.Europa de hoje guarda relação com o que se deu no fim da Primeira Guerra Mundial. As sanções econômicas

Em que pese o eventual alarmismo da denúncia, o que se passa na infligidas pelos aliados aos alemães resultaram em sentimentos que desembocaram no nazismo.

Não creio que Portugal passará por fase semelhante à vivida pela Alemanha nos anos 20. Porém, o que ocorre no país é um imenso retrocesso que irá desembocar, fatalmente, em violência e desigualdade social.

O desemprego em Portugal subiu de 14,1% para 16,3%, de 2012 para janeiro de 2013. O que é mais dramático é a situação dos jovens: o desemprego entre adultos com menos de 25 anos é de aproximadamente 39%! Cinco pontos a mais do que em 2011.

É evidente que Portugal não soube aproveitar a bonança propiciada pela Comunidade Europeia para gerar um modelo de desenvolvimento econômica e socialmente sustentável.

O aumento das despesas públicas pressionou o endividamento, criando um ciclo vicioso que poderá levar o país a dever cada vez mais. Enquanto no Brasil a dívida líquida do setor público fechou 2012 em 35,1% do PIB, a dívida em Portugal ultrapassa os 120% do PIB!

Pior do que a realidade é a forma de enfrentá-la. Um misto de neoliberalismo econômico com fascismo social não é o melhor caminho. Não foi assim, por exemplo, que os Estados Unidos enfrentaram a Grande Depressão nem as crises subsequentes. Um traço comum foi estimular a economia.

O Japão foi tratado no pós-guerra com um regime de estímulos. O assistencialismo norte-americano e, depois, o intervencionismo estatal, mediante políticas industriais, fomentaram o milagre japonês. As duas “Alemanhas” também foram reunificadas à base de muito subsídio.

Não defendo que o caminho para a saída da crise seja mais descontrole de gastos e, sim, uma mirada mais atenta às questões sociais.

Naturalmente, a fórmula para Portugal deve ser adequada ao país, assim como as que deveriam ser aplicadas na Irlanda ou na Grécia. Cada realidade impõe seu diagnóstico. Porém, o que importa são os valores que devem orientar as escolhas e prioridades de uma sociedade em crise.

Sacrificar as políticas sociais é contrariar a essência da existência dos governos, que é proteger os governados de violências internas e externas.

O que acontece hoje na Europa é mais do que a destruição de sistemas sociais que deveriam ser adequados aos novos tempos. É uma ameaça ao sistema democrático, já que rebaixa a qualidade de quem vota.

O preço pelo erro vai ser pago com a degradação da sociedade e a negação de um futuro melhor para uma imensa parcela da população dos países do sul da Europa.

07 de fevereiro de 2013
Murillo de Aragão é cientista político

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