Em um boteco popular (em meu bairro ainda existe esse tipo de boteco), na última sexta, o varredor da rua e dois trabalhadores de reformas em apartamentos comiam seus PFs assistindo ao noticiário na televisão de parede.
Mostravam-se visivelmente impressionados com a comoção do povo venezuelano diante do caixão de Hugo Chávez.
Na calçada, eu havia reduzido os passos para observar a cena. Aí ouvi nitidamente um deles perguntar: “Ele vai ser embalsamado, o que é isso?” Após a resposta do companheiro, comentou: “Entendi, o corpo também vai permanecer vivo.” Segui meu caminho com aquele “também” ecoando nos ouvidos.
Uma coisa era acompanhar os analistas se pronunciando sobre o assunto que continuaria em pauta. Outra coisa era constatar o alcance do carisma de Chávez no Rio de Janeiro, nas proximidades de minha casa.
Lembrei-me de imagens suas propagadas na mídia brasileira, como por exemplo, a do cartaz retratando-o ao lado de Jesus Cristo e Simon Bolívar. Brincadeira?
Os seguidores de Chávez foram induzidos a acreditar que sua missão na Terra (iniciada na América Latina) seria enfrentar os fariseus da hora (os imperialistas ianques) e criar uma nova doutrina: o socialismo do século XXI. Para isso desencadeara sua “revolução bolivariana”. Ou o que se tornou mais conhecido por chavismo.
E, queira-se ou não, essa trajetória surrealista baseia-se numa verdade: os eleitores de Chávez se sentem vivendo melhor do que antes. Pessoas como os moradores de Petare, a maior favela do Ocidente, o idolatram.
Isso é bom? Dificilmente a idolatria acaba bem. Ela fanatiza, aprisiona, causa violência, conflitos de morte. Porém, não há mistério no surgimento de figuras que adotam o culto à personalidade para se apoderarem das massas carentes.
Essas figuras se criam onde se permitiu desigualdades sociais que condenam a maioria da população a pobreza, miséria e ignorância.
Chávez não fascinou apenas o povão. Seduziu intelectuais nostálgicos, encantados por sua coragem em peitar o “império norte-americano”. Por gastar o dinheiro do petróleo com os pobres, alfabetizá-los (e doutriná-los)... E ter a possibilidade de se tornar o Fidel deste século.
Nem farda e boina faltaram ao comandante Chávez que, antes de tudo, era militar.
12 de março de 2013
Ateneia Feijó é jornalista
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