À medida que se aproxima a hora da verdade, com os condenados pelo mensalão próximos do cumprimento das penas a que foram condenados, a ação política desesperada dos seguidores do ex-ministro José Dirceu, a começar pelo próprio, cria um clima de guerra contra o Supremo, numa tentativa de rever as condenações pela desmoralização dos juízes. Os “aloprados” do PT estão novamente à solta, desta vez para tentar controlar o Supremo Tribunal Federal (STF), numa retaliação clara à condenação dos mensaleiros.
A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ), que por sua composição esdrúxula já perdeu qualquer legitimidade — dois réus condenados, os deputados petistas José Genoino e João Paulo Cunha, fazem parte dela —, aprovou a proposta de emenda à Constituição (PEC) que submete algumas decisões tomadas pelo STF ao Poder Legislativo, numa tentativa patética de fazer retroceder a História, se não ao Segundo Reinado, pelo menos ao Estado Novo de Getulio Vargas, como ressaltou o ministro Gilmar Mendes.
A Constituição de 1937 dava ao presidente da República o poder de cassar decisões do STF e confirmar a constitucionalidade de leis derrubadas pela Corte.
O jurista Marcelo Cerqueira, no livro “A Constituição na História”, fala da “regressiva” Lei de Interpretação de 1840, “expediente destinado a restringir alguns artigos da reforma constitucional”.
Não foi à toa que essa emenda de um obscuro petista surgiu no horizonte político quando se abre o prazo para os recursos das defesas, numa clara tentativa de tumultuar o ambiente, que já está bastante conturbado com a polêmica sobre os chamados “embargos infringentes”.
Os órgãos a serviço dos mensaleiros, sejam blogs ou mesmo associações corporativas dominadas pelos petistas, já comemoram o que seria uma derrota do STF, que estaria sendo obrigado a aceitar os “embargos infringentes” devido à pressão que vem sofrendo dos que consideram que o julgamento do mensalão foi uma farsa política.
Dessa maneira, os amigos de José Dirceu, e ele próprio quando acusa em suas palestras pelo país os juízes do STF de ter protagonizado um julgamento político, criam nos componentes do plenário do Supremo um espírito de corpo na defesa da instituição, mesmo naqueles que estão convencidos de que o Regimento Interno, como dizia o jurista Afonso Arinos, é do tipo constitucional e não pode ser alterado por uma lei.
Ao transformar a eventual aceitação da figura dos “embargos infringentes” em uma derrota do STF, e até mesmo numa admissão de culpa de seus juízes, os defensores dos mensaleiros levam para o plano político uma disputa que deveria ser eminentemente técnica.
O ministro Teori Zavascki, que entrou no lugar do aposentado Cezar Peluso, passa a ser o fiel da balança não de uma decisão apenas jurídica, mas de característica política que pode levar à desmoralização do Supremo diante da opinião pública.
Se José Dirceu conseguir redução de sua pena com uma mudança de voto provocada pela participação do novo ministro, ele poderá conseguir até mesmo ficar em prisão domiciliar, aproveitando-se de falhas no sistema penal brasileiro: o regime semiaberto deve ser cumprido teoricamente em colônia agrícola, industrial ou outro similar. Se não houver vaga num estabelecimento desse tipo — e no Brasil é comum não haver —, o sentenciado poderá ficar em outro local que adote “medidas que se harmonizem com o regime semiaberto”.
Na impossibilidade de outro estabelecimento penal, é pacífico entre os juristas que é direito do sentenciado e dever do Estado que o réu aguarde “em regime mais benéfico”, no caso, o aberto, até que haja vaga em estabelecimento adequado.
Mesmo a prestação de pena em regime aberto tem suas peculiaridades. O condenado deveria dormir em albergues depois de passar o dia livre. Mas, como não os há em número suficiente, o mais provável é que o condenado cumpra sua pena em regime domiciliar, com o compromisso de se recolher em sua residência no período noturno e em finais de semana. Em alguns locais, é exigido que compareçam regularmente em juízo.
É aí que tentam chegar os mensaleiros.
25 de abril de 2013
Merval Pereira, O Globo
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