Mantega reforça que governo persegue 2,3% do PIB em superávit primário e não descarta novos cortes de despesas. Ministro diz que ‘grosso da inflação está caindo’, mas que compra de roupas de inverno pode pressionar preços do grupo Vestuário
No mesmo dia em que o dólar comercial fechou cotado acima de R$ 2,154 pela primeira vez desde 30 de abril de 2009, o governo anunciou nesta quarta-feira mais uma medida para tentar segurar a escalada da moeda americana. O Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 1% que incidia sobre operações no mercado de câmbio futuro, foi zerado. Desde julho de 2011, os investidores vinham sendo tributados sobre posições vendidas (que apostam na queda do dólar) a partir de um determinado valor.
É a segunda redução de impostos em menos de um mês anunciada pelo governo para frear o dólar. No começo de junho, já havia sido suspensa a cobrança de IOF sobre aplicações de renda fixa para estrangeiros.
— Não faz sentido manter o empecilho para que as posições vendidas em dólar no mercado futuro sejam penalizadas com alíquota de 1%. Estamos reduzindo esta alíquota de modo a facilitar para aqueles que quiserem fazer aplicações de posição vendida em dólar. Com isso, haverá uma oferta maior de moeda no mercado futuro e, com isso, a diminuição da valorização do dólar — explicou o ministro Fazenda, Guido Mantega.
Ele lembrou que o cenário em 2011 era diferente, pois a moeda americana estava em queda, o que favorecia especulações no mercado futuro, aumentando as posições vendidas. Segundo Mantega, com o dólar subindo, não há motivo para manter medidas que pressionem ainda mais o câmbio.
Agora, a única barreira imposta ao ingresso de dólares no mercado brasileiro é uma alíquota de 6% cobrada sobre empréstimos tomados no exterior com prazos inferiores a 12 meses. A retirada também está em estudo, segundo técnicos.
Mantega voltou a afirmar que o mercado está volátil em função da sinalização que vem sendo dada pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano) de que os EUA vão praticar uma política monetária menos expansionista e subir juros. Isso tem provocado uma fuga de capitais de mercados de maior risco e valorizado o dólar.
— É um processo de ajuste da economia mundial — disse o ministro, defendendo que as medidas que o governo adota não são de curto prazo.
Com a forte alta do dólar nos últimos dias, a equipe econômica vinha sendo pressionada pelo mercado a suspender o IOF sobre derivativos. Parte dos técnicos defendia que o imposto fosse reduzido, mas não totalmente zerado, porque a tributação também serve para monitorar operações especulativas .
— Uma boa parte dessas operações é para dar hedge para as empresas. É para dar uma margem de garantia. (...) — explicou o ministro.
Compromisso com a meta fiscal
Nesta quarta-feira, sem uma intervenção do Banco Central, o dólar registrou alta de 0,84%, a R$ 2,154. Na máxima do dia, a moeda chegou a ser negociada a R$ 2,158. No mercado internacional de divisas, no entanto, o dólar americano perdeu força na comparação com moedas de países emergentes.
O efeito da retirada do IOF sobre os derivativos de câmbio dividiu economistas consultados pelo GLOBO. Para Sergio Goldenstein, sócio-gestor da Arsa Investimentos, a medida foi “importante para segurar a desvalorização do real” e ajudará a moeda a recuar para perto de R$ 2,10 no curto prazo.
— IOF de 1 % estava favorecendo a depreciação do real. Gerava um viés de alta para o câmbio. Essa medida é bastante importante e tende a acalmar o mercado — disse Goldenstein.
Já Fabio Kanczuk, professor da USP, avalia que a medida “não vai fazer nenhum efeito”. Isso porque ainda terá mais força o cenário internacional de valorização da moeda americana na medida em que surgem sinais de recuperação da economia americana.
— A outra medida que fizeram, a de retirar o IOF de renda fixa, durou 5 minutos de efeito. Essa não dura nem 5 minutos — afirmou Kanczuk.
Embora com efeito limitado, a isenção do imposto era inevitável, segundo Sidnei Nehme, diretor da NGO Corretora de Câmbio.
— O tipo de dinheiro que resta ao Brasil é de natureza especulativa. Portanto, essa medida era necessária — disse.
Mantega tratou também das cobranças do mercado em relação à política fiscal. O ministro explicitou com que meta de superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida pública) a equipe econômica trabalha para 2013. Ele disse que a meta é equivalente a 2,3% do PIB, o que demonstra uma disposição do governo de tornar as contas mais transparentes. A declaração foi dada poucos dias depois de a agência de classificação de risco Standard & Poor´s (S&P) ter ameaçado rever para baixo o rating do Brasil por causa do baixo crescimento da economia e da política fiscal expansionista.
— Procuramos conter as despesas com custeio de modo que o objetivo do primário que vamos alcançar em 2013 é de 2,3% do PIB — afirmou ele, assegurando que o governo pode eventualmente fazer mais cortes de despesas para garantir esse compromisso.
Dívida pública deve cair
Como adiantou o GLOBO, a decisão da S&P e as críticas do ex-ministro Delfim Netto à política fiscal levaram a equipe econômica a avaliar o que pode ser feito para mostrar mais compromisso com a meta de superávit primário. O governo estuda segurar despesas por meio de um novo contingenciamento e pela redução no ritmo das desonerações, de modo que parte delas só impacte as contas públicas a partir do ano que vem.
Mesmo assim, Mantega fez questão de afirmar que as principais despesas do governo — com Previdência, gasto de pessoal e juros — estão controladas.
Segundo ele, o superávit primário do país tem sido o melhor do mundo nos últimos 10 anos. O ministro destacou que o governo vem conseguindo reduzir a dívida pública, que fechou o ano passado em 35,4% do Produto Interno Bruto (PIB) e deve ficar em torno de 34,7% do PIB em 2013.
— Estamos tendo um excelente desempenho fiscal e não vejo motivos para questionamentos.
Ainda segundo o ministro, a tendência é de “uma inflação mais bem comportada” no Brasil. Ele admitiu uma preocupação com o aumento dos preços no início do ano, principalmente com alimentos. Mas, agora, diz: “o grosso da inflação está caindo”.
13 de junho de 2013
Martha Beck e Cristiane Bonfanti - O Globo
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