Editorial do Estadão
Incapaz de planejar e de tocar projetos, o governo federal só conseguiu um bom nível de execução em pouco mais de metade - 54% - das 92 ações prioritárias incluídas no orçamento do ano passado, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU). O novo relatório sobre as contas governamentais, entregue ao presidente do Senado na terça-feira, vale como um atestado de incompetência gerencial. A execução de um quinto das ações foi considerada fraca ou muito fraca.
A de outros 26%, apenas razoável. Apontada muitas vezes como administradora severa e eficiente - uma fama inexplicável, quando se considera seu desempenho no governo central -, a presidente Dilma Rousseff completou seu primeiro ano de mandato com resultados muito pobres.
O quadro continua ruim, quando se deixa de lado o número de ações e se examinam os valores aplicados nos vários programas e projetos. No orçamento de 2011 foram autorizados R$ 17,3 bilhões para o conjunto de prioridades. Foram empenhados R$ 14,5 bilhões, 84% do total. Mas só foram efetivamente liquidados R$ 10,3 bilhões, 59,5% do valor previsto para o ano. Sobraram dos empenhos R$ 4,3 bilhões de restos a pagar transferidos para os anos seguintes.
O relatório chama a atenção para o atraso na execução de grande parte das obras de infraestrutura e para o consequente aumento de custos. Os problemas decorrem não só de falhas na preparação e na condução dos projetos, mas também da lentidão nas decisões. O autor do parecer, ministro José Múcio Monteiro, alerta para os riscos da indefinição quanto às concessões do setor de eletricidade com vencimento previsto para 2015. Esses contratos representam 18% de toda a geração de energia elétrica e 84% da rede básica de transmissão e envolvem 37 das 63 distribuidoras de energia.
Há problemas de atrasos em todos os setores, mas o quadro é especialmente preocupante quando se trata de energia e de transportes. Neste setor, falta a conclusão dos planos aeroviário, portuário e hidroviário. Sem avanço nesse trabalho, não haverá como consolidar o planejamento das várias modalidades.
Várias das grandes obras foram incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), lançado em 2007 e com execução muito atrasada, embora já tenha sido inaugurada oficialmente sua segunda fase. Previa-se inicialmente para 2014 a conclusão das obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte e da ferrovia de alta velocidade, mas o prazo dos dois projetos foi ampliado até 2019. "Esses atrasos não são isolados nem restritos aos grandes empreendimentos. No eixo Transportes, a diferença média entre os prazos repactuados no PAC 2 e os prazos estimados ao final do PAC 1 é de 437 dias por ação", comenta o autor do parecer.
A falta de capacidade de administrar grandes obras e projetos complexos caracteriza, segundo ele, tanto o governo federal quanto as administrações estaduais e municipais e até as empresas privadas, "responsáveis pela execução de grande parte das obras do PAC". A baixa qualidade dos projetos básicos também prejudica o rendimento dos investimentos, forçando revisões durante as obras, e, portanto, o cronograma e os custos.
O relator acentua a necessidade de melhoras no acompanhamento dos projetos e na avaliação dos resultados. Isso vale não só para as obras financiadas pelo setor público, mas também para o uso dos benefícios fiscais concedidos ao setor privado. A renúncia fiscal aumentou 30% em 2011 e chegou a R$ 187,3 bilhões, mas faltam, segundo o relatório, prestações de contas satisfatórias e indicadores para avaliação do uso desses recursos.
Diante disso, o relator sugeriu à Casa Civil dois cuidados na elaboração dos projetos de lei e de medidas provisórias para concessão ou ampliação de benefícios tributários: identificação do órgão gestor da política e especificação de objetivos, indicadores e critérios de avaliação de resultados.
A presidente Dilma Rousseff assumiu o governo prometendo elevar a qualidade do gasto público e a eficiência da administração federal. Pouco fez para cumprir essa promessa, até agora. Refletir sobre a análise e o parecer do TCU sobre o exercício de 2011 talvez a estimule a cuidar mais seriamente do assunto.
O Estado de S.Paulo
23 de junho de 2012
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