"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sábado, 23 de junho de 2012

CASO MALUF. LULA VAI A DILMA PARA RECUAR E TV GLOBO MANTÉM SILÊNCIO

 
Impressionante o recuo de Lula diante da reação da opinião pública contra o encontro com Paulo Maluf, na mansão do deputado, em torno da tentativa (vã) de fazer decolar a candidatura Fernando Haddad na cidade de São Paulo.

Sentindo o peso do erro, sob todos os sentidos e pretextos, o ex-presidente da República procurou Dilma Rousseff no hotel em que está hospedada no Rio para ser fotografado ao lado da sucessora que elegeu. A foto saiu com o destaque merecido na edição de O Globo de quinta-feira 21. Mas quem foi o autor da foto? Ricardo Stuckert, que trabalha para o Instituto Lula.

O Globo, como sempre, deu o crédito a autoria. Portanto deixou claro que a iniciativa de produzir a imagem foi de Lula. Nada de mal há nisso. Porém, assim agindo, deixou claro seu propósito de despoluir a foto tirada nos jardins suspensos do bairro mais sofisticado de São Paulo.

Reportagem, muito bem escrita, de Maria Lima e Júnia Gama, focaliza o encontro entre Lula e Dilma e reproduz pontos do diálogo. Portanto, as repórteres encontravam-se bastante próximas.
Agora sim, disse Luís Inácio, aí está uma foto ambientalmente correta. Rousseff acrescentou: isso mesmo, ambientalmente correta.

Não se pode retirar o texto do contexto, regra essencial do jornalismo. Portanto, ao afirmar que a foto com Dilma era ambientalmente adequada, Lula – é claro – confessou que a tirada com Paulo Maluf foi embientalmente incorreta. Uma coisa leva a outra. E ao realçar a colocação, a presidente Dilma, não só reforçou a frase, como deixou transparecer ter identificado poluição ética e política na imagem nos jardins do palacete do parlamentar. Nada contra a mansão em si, penso eu, mas contra o protocolo impresso e impróprio.

Uma convergência no século 21 depois de inúmeras e profundas divergências no século 20? Não é provável. Um acordo entre ideologias tão opostas? Impossível. Qualquer denominador comum desqualifica a essência das duas correntes. Principalmente a petista, já que Maluf não saiu da extrema direita.

Foi Lula, isso sim, que se moveu da posição reformista de centro-esquerda para ir a seu encontro. Um encontro no campo do adversário. Lula cedeu.

Ficou mal na foto e na história. Nesta altura gostaria de apagar a imagem e a iniciativa. Mas é tarde. Todas as redes de televisão, exceto a Globo, divulgaram a matéria. Da mesma forma, na primeira página, os jornais que amanheceram nas bancas no dia seguinte. O silêncio da Globo, no Jornal Nacional que tem William Bonner como editor, causou perplexidade.

Houve algum problema, algum obstáculo. Pois o editor, que é experiente, sabe muito bem que nenhuma empresa de comunicação pode brigar com os fatos. Ou ignorá-los. Assim, a omissão da Globo não tem explicação lógica. Sobretudo porque, como escrevi anteontem, a Globo News divulgou amplamente o absurdo praticado por Lula. E O Globo manchetou na primeira página.

A verdade emergirá. Por mais lenta que apareça, como diz o velho ditado, virá a cavalo. Mas falei em brigar com os fatos. Aconteceu com Ezra Pound, artista de grande expressão, americano de Idaho, que, durante a segunda guerra mundial, voltou-se contra seu próprio país e apoiou a Alemanha de Hitler. Quando da invasão da Normandia, em 44, por uma rádio italiana, informou falsamente que as tropas aliadas estavam sendo dizimadas por Rommel. Mentiu cinicamente. Acontecia exatamente o contrário.

Lula – evidentemente – não é Ezra Pound. Não é um traidor. Apenas cometeu o maior erro político de sua vida. Agora tenta usar a imagem de Dilma Rousseff para nublá-lo e esquecê-lo. Não será fácil. Sem memória não se vive.

Nenhum comentário:

Postar um comentário