A julgar pelo noticiário – porque infelizmente lá não pude ir -, essa Rio+20 nos deixou a indelével marca da dignidade de um punhado de brasileiros: os índios.
Já tive a oportunidade de registrar nestes artigos uma certa admiração pelos que não têm “vez nem voz”, esses primeiros habitantes desta Pindorama.
No dia da votação do sistema de cotas nas universidades no Supremo Tribunal Federal, um deles foi arrastado pelos seguranças porque, a certa altura, como se não estivesse naquele “excelso Pretório” (como se dizia na Faculdade de Direito), ousou levantar a voz e gritar contra os que aprovavam a existência de “cotas” para negros, como se os negros tivessem sido os únicos a pagar pelo chamado desenvolvimento do país.
Agora, em meio à sandice generalizada com que se comportaram todos, os que pagam o pato e os que contribuem para que o planeta sofra cada vez mais os efeitos da barbárie, os índios manifestaram em público um tipo de comportamento que se torna cada vez menos usual.
Refiro-me a gestos aparentemente até simplórios, mas muito diferentes, opostos mesmo, eu diria, ao comportamento dos que se submetem, que dobram a espinha, que se curvam aos ditames dos que mandam de fato ou dos que servem aos que mandam.
Aqui estou relembrando que, num tipo de sociedade como a brasileira, há os que se julgam donos da vontade alheia, prefeitos, governadores e presidentes da República (atual ou pretéritos) – os chamados mandatários ou dignitários -, e os que eles representam, grandes agricultores, industriais, banqueiros de toda espécie, e os que recebem as migalhas dos banquetes dos ricos.
Foram três cenas memoráveis: numa delas (que de fato foram duas), os índios apontaram arco e flecha para aqueles que tentavam impedir a marcha livre a que estão acostumados na floresta.
A arma de agressão e de defesa, o arco e a flecha, foram apontados primeiramente para guardas de trânsito que (pareceu-lhes) poderiam impedir a marcha que faziam e, a segunda vez, contra seguranças do BNDES.
Quanta ironia! Uma das camadas menos protegidas de nossa sociedade apontando armas para o guardião que, segundo a crença geral, protege, aqui, os que precisam ser protegidos.
Depois, os índios foram interpelar, por um de seus líderes, um bando de atores que cantava, festivamente, protestando sabe-se lá contra o quê, com uma antiga música de Carnaval: “Índio quer apito, se não der pau vai comer”. Lembro-me bem dessa marchinha, dos meus tempos de juventude.
Por fim, alguns deles, espremidos em um ônibus, não se contiveram quando ouviram – imagino que perplexos – o comentário de alguns brancos: “Isso é programa de índio”. Iam todos para a Lapa, lugar delicioso dos boêmios no Rio de Janeiro.
Estou morrendo de inveja deles, isto é, eu também gostaria de ter a capacidade de brigar pela dignidade de minha gente, como acabo de aprender com os índios do Brasil.
Já tive a oportunidade de registrar nestes artigos uma certa admiração pelos que não têm “vez nem voz”, esses primeiros habitantes desta Pindorama.
No dia da votação do sistema de cotas nas universidades no Supremo Tribunal Federal, um deles foi arrastado pelos seguranças porque, a certa altura, como se não estivesse naquele “excelso Pretório” (como se dizia na Faculdade de Direito), ousou levantar a voz e gritar contra os que aprovavam a existência de “cotas” para negros, como se os negros tivessem sido os únicos a pagar pelo chamado desenvolvimento do país.
Agora, em meio à sandice generalizada com que se comportaram todos, os que pagam o pato e os que contribuem para que o planeta sofra cada vez mais os efeitos da barbárie, os índios manifestaram em público um tipo de comportamento que se torna cada vez menos usual.
Refiro-me a gestos aparentemente até simplórios, mas muito diferentes, opostos mesmo, eu diria, ao comportamento dos que se submetem, que dobram a espinha, que se curvam aos ditames dos que mandam de fato ou dos que servem aos que mandam.
Aqui estou relembrando que, num tipo de sociedade como a brasileira, há os que se julgam donos da vontade alheia, prefeitos, governadores e presidentes da República (atual ou pretéritos) – os chamados mandatários ou dignitários -, e os que eles representam, grandes agricultores, industriais, banqueiros de toda espécie, e os que recebem as migalhas dos banquetes dos ricos.
Foram três cenas memoráveis: numa delas (que de fato foram duas), os índios apontaram arco e flecha para aqueles que tentavam impedir a marcha livre a que estão acostumados na floresta.
A arma de agressão e de defesa, o arco e a flecha, foram apontados primeiramente para guardas de trânsito que (pareceu-lhes) poderiam impedir a marcha que faziam e, a segunda vez, contra seguranças do BNDES.
Quanta ironia! Uma das camadas menos protegidas de nossa sociedade apontando armas para o guardião que, segundo a crença geral, protege, aqui, os que precisam ser protegidos.
Depois, os índios foram interpelar, por um de seus líderes, um bando de atores que cantava, festivamente, protestando sabe-se lá contra o quê, com uma antiga música de Carnaval: “Índio quer apito, se não der pau vai comer”. Lembro-me bem dessa marchinha, dos meus tempos de juventude.
Por fim, alguns deles, espremidos em um ônibus, não se contiveram quando ouviram – imagino que perplexos – o comentário de alguns brancos: “Isso é programa de índio”. Iam todos para a Lapa, lugar delicioso dos boêmios no Rio de Janeiro.
Estou morrendo de inveja deles, isto é, eu também gostaria de ter a capacidade de brigar pela dignidade de minha gente, como acabo de aprender com os índios do Brasil.
Sandra Starling (O Tempo, de BH)
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