"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quarta-feira, 24 de outubro de 2012

BRASIL MARAVILHA DOS FARSANTES: UM PAÍS EMPERRADO

 


A empresa brasileira gasta em média 2.600 horas, cada ano, para cuidar dos impostos.

A empresa colombiana, 203.
Na União Europeia, o dispêndio é de 193 horas.
Indicadores desse tipo mostram uma economia travada, onde os empresários têm muito menos tempo que seus concorrentes estrangeiros para cuidar de inovação, produção, qualidade e estratégia comercial.

São forçados a enfrentar, no dia a dia, uma sequência absurda de obstáculos criados quase sempre pelo setor público - por excessos burocráticos, por inépcia administrativa ou simplesmente por omissão.

Mais uma vez a pesquisa Doing Business, realizada anualmente pelo Banco Mundial, mostra o Brasil em péssima posição na escala internacional de facilidades - ou dificuldade - de fazer negócios. O levantamento cobre principalmente as condições de operação de pequenas e médias empresas em 185 países, mas as diferenças encontradas valem, de modo geral, para o conjunto de cada economia.

O ambiente de negócios é descrito com base em dez tópicos - abertura da empresa, licenças de construção,
acesso à eletricidade,
registro de propriedade,
obtenção de crédito,
segurança do investidor,
pagamento de impostos,
comércio internacional,
garantia de contratos e processos de insolvência.

O relatório aponta avanços em muitos países em desenvolvimento, mas, no caso brasileiro, as mudanças têm sido escassas e de alcance limitado.
Somadas e ponderadas todas as notas, o Brasil, como no ano anterior, ficou em 130.º lugar na classificação geral, logo depois de Bangladesh e um posto à frente da Nigéria.

Só um dos Brics, a Índia, apareceu em posição pior, a 132.ª.
A África do Sul ocupou o 39.º posto,
a China, o 91.º,
e a Rússia, o 112.º.

A Itália, terceira maior economia da zona do euro, foi a 73.ª colocada, mas, de modo geral, as potências capitalistas foram bem classificadas, com os Estados Unidos em 4.º lugar,
depois de Cingapura,
Hong Kong e Nova Zelândia.

Num estudo mais amplo de competitividade seria preciso levar em conta fatores como o peso e a qualidade dos impostos, a infraestrutura, os investimentos em inovação, a qualidade e a disponibilidade da mão de obra, entre outros fatores. Nesse caso, as vantagens das economias mais desenvolvidas seriam mais nítidas e a classificação geral seria diferente.

Mas o ambiente de negócios, foco da pesquisa Doing Business, também afeta a eficiência e o poder de competição das empresas e, no caso do Brasil, o peso negativo desse conjunto de fatores é indiscutível. Vários países latino-americanos ficaram em posições bem melhores na classificação geral - casos do Chile (37.ª),
do Peru (43.ª),
da Colômbia (45.ª)
e do México (48.ª).

Com 13 procedimentos e 119 dias para abrir um negócio (contra 13 dias na Colômbia, por exemplo), o empreendedor brasileiro precisa de muita persistência só para iniciar a atividade. A obtenção de licenças para construção consome no Brasil 131 dias, bem mais que a média regional, 95.

O acesso à eletricidade é uma das poucas vantagens comparativas do empresário brasileiro - demora de 57 dias, contra 98 nos países ricos da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Mas essa vantagem se perde no meio de uma porção de entraves, como os 14 procedimentos (o dobro da média regional) e 34 dias necessários para registrar uma transferência de propriedade.

O Brasil perde também quando se trata das condições do comércio exterior. Nesse quesito, o País ficou em 123.º lugar na classificação global. Os países da União Europeia ficaram em 36.º e as economias de alta renda da OCDE em 33.º.

O Chile foi classificado na 48.ª posição e o Peru, na 60.ª. As empresas brasileiras precisam de 7 documentos para exportar (4 na União Europeia) e de 13 dias para o embarque - posição até razoável diante dos padrões globais (10 dias para as economias mais ricas da OCDE).

Mas os custos são desastrosos:
US$ 2.215 por contêiner, contra US$ 1.004 na União Europeia, US$ 980 no Chile e US$ 890 no Peru. Procedimentos (burocracia excessiva, por exemplo) e infraestrutura são alguns dos itens considerados.

Esses indicadores mostram apenas alguns dos entraves à eficiência. Um quadro completo incluiria vários outros fatores, como o fracasso dos investimentos públicos, as deficiências do transporte, os custos da segurança, o peso e a inadequação do sistema tributário e a situação desastrosa do ensino fundamental.

Parte dos empresários e dos analistas prefere, no entanto, discutir a taxa de câmbio. Há quem defenda R$ 2,40 por dólar.
Por quanto tempo?

É uma atitude confortável para o governo, porque reforça o discurso contra os tsunamis monetários, justifica a solução simplista do protecionismo e torna mais aceitável a política dos incentivos parciais.

Já começou a campanha por mais uma prorrogação do IPI reduzido. Para que perder tempo com assuntos de maior alcance?

Rolf Kuntz O Estado de S. Paulo
24 de outubro de 2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário