"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 22 de janeiro de 2013

A FALÁCIA DA MULTIPLICAÇÃO DE MUNICÍPIOS

 

Assim que se instalou a indústria de criação de municípios, impulsionada por interesses políticos paroquiais, ficou claro que a pulverização de prefeituras não melhoraria a administração pública.

Impulsionada pela Constituição de 1988, esta indústria chegou ao auge com a possibilidade de as assembleias legislativas poderem aprovar a realização de plebiscitos para a emancipação de distritos e povoados. Como as Casas legislativas estaduais estão muito próximas da influência de caciques políticos locais, foi uma farra, principalmente até 1996, quando emenda constitucional passou a subordinar à lei complementar federal a criação de municípios.

De 1984 a 2000, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), surgiram 1.405 prefeituras. Hoje são, ao todo, 5.568, um universo disforme que pesa mais no bolso do contribuinte do que o atende em serviços.

O que era visível há tempos agora passa a ser contabilizado, com a criação, pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro, do Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFDM), composto por informações dos ministérios do Trabalho, da Educação e da Saúde. O Ipea, do governo federal, também trabalha numa metodologia para acompanhar os municípios.

Com base no IFDM, foram analisadas 58 prefeituras criadas entre 2001 e 2010. E ficou comprovado que é uma falácia o discurso de que a emancipação leva ao desenvolvimento. Muitas vezes ocorre o inverso — eles retrocedem, como demonstra reportagem do GLOBO.

O diretor de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais do Ipea, Rogerio Boueri, diz que isso se explica pelo fato de as novas prefeituras criarem despesas antes inexistentes. Afinal, passam a contar, por exemplo, com uma estrutura de funcionários públicos no Executivo e no Legislativo.

E como não costumam explorar a principal fonte de receita tributária municipal, o IPTU, viram eternas dependentes do Fundo de Participação, alimentado por repasses federais e estaduais.

A grande maioria das 5.568 cidades não sobrevive com recursos próprios. Hoje, esta dependência é sério obstáculo à redução da carga tributária total, para a economia ganhar competitividade.

As 58 prefeituras estudadas criaram 31 mil empregos públicos — o total da folha de servidores de Curitiba —, receberam, nos últimos cinco anos, R$ 1,3 bilhão do Fundo de Participação, mas não melhoraram a vida de suas populações em itens fundamentais: saneamento, coleta de lixo, água encanada. Há também números preocupantes em Educação e problemas em Saúde.


Deveria ser levada a sério a proposta de reversão de emancipações sem qualquer perspectiva de sobreviverem como municípios autônomos. Haverá menos gastos públicos, impostos menos pesados e melhores serviços à população.

Mas, para isso, a baixa política, que se beneficia do empreguismo e do tráfego de dinheiro federal e estadual, terá de ser vencida.

22 de janeiro de 2013
Editorial d'O Globo

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