Um partido, em tese, se constitui para o exercício direto do poder; o PMDB, não: investe no papel de coadjuvante. Descobriu nesse veio uma engenhosa forma de garantir os interesses de seus dirigentes, sem o desgaste que o exercício direto do poder acarreta.
A única experiência na Presidência da República foi com José Sarney (1985-1990), que, à época, era um recém-chegado, acomodado à legenda por imperativo legal, para compor a chapa com Tancredo Neves.
Ele acabara de fundar a Frente Liberal (depois PFL, hoje DEM), dissidência do PDS (ex-Arena), que presidira ao tempo do regime militar. Ali estavam suas raízes e amizades.
Suas relações com o PMDB de então foram, a princípio, incômodas. O partido tinha chefe, Ulysses Guimarães, uma pedra no sapato por todo o tempo em que Sarney esteve na Presidência da República. Ainda não era o partido de hoje, federação de interesses regionais, conduzido por chefes políticos interioranos.
Foi somente após a morte de Ulysses que o PMDB adquiriu o formato atual. Esteve com Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma.
Pode-se ter dúvidas sobre quem será o próximo presidente da República, mas há ao menos uma sólida certeza: o PMDB será o parceiro principal, sócio vitalício do poder.
Cada estado é um feudo e cada feudo tem dono. Lá estão Jáder Barbalho (PA), Renan Calheiros (AL), José Sarney (AP e MA), Henrique Alves (RN), Romero Jucá (RR), entre muitos outros.
A rigor, há apenas duas exceções relevantes a essa regra: Pedro Simon (RS) e Jarbas Vasconcelos (PE), que o partido, por isso mesmo, nem contabiliza como correligionários. O grande mistério é saber por que lá permanecem.
O PMDB é a face atualizada de um velho Brasil, cujas origens remontam às capitanias hereditárias. Um Brasil que atravessou a colônia, o império, a República Velha e a Revolução de 1930.
Os coronéis-donatários modernizaram-se: usam tablets digitais, celulares de última geração, possuem redes de rádio e televisão, são donos dos principais jornais de suas capitanias.
Exercem, assim, com muito maior eficácia o papel de senhores feudais, num país de iletrados, condicionados a ver no Estado uma instância privada, da qual não são senhores, mas súditos. Trata-se, no fim das contas, de uma visão realista.
Até hoje, os brasileiros mais modestos acham que as leis trabalhistas foram gestos generosos e pessoais de Getúlio Vargas, assim como atribuem à bondade de Lula o Bolsa-Família. O populismo de direita ou de esquerda (qual a diferença?) ajusta-se como uma luva ao perfil do PMDB.
Lula, que o combateu quando na oposição, viu nele o interlocutor ideal para seu projeto político, em parceria idealizada desde o primeiro momento por José Dirceu.
Não há dobradinha mais harmônica. O partido, que é o maior do país, quer apenas a parte que lhe cabe no latifúndio do Estado, para continuar a saqueá-lo e manter seus domínios regionais.
Não tem preconceitos ou pleitos ideológicos, nem se opõe ao projeto de perpetuação do parceiro. Garantido o seu quinhão, deixa-o à vontade.
Sua única exigência, que aliás é recíproca, é a solidariedade moral em situações de flagrante delito.
Dentro desse acerto, lá estarão, por mais um biênio, Renan Calheiros no Senado, e Henrique Alves na Câmara. “A ética”, disse ontem Calheiros, “não é um fim, mas um meio”, seja lá o que isso signifique (seguramente nada que corra o risco de pô-la em cena).
Com o Congresso em tais mãos, a governabilidade – nome dado à vigência desse contrato comercial – está mais uma vez garantida. Tranquilizemo-nos todos. PT, saudações.
03 de fevereiro de 2013
Ruy Fabiano
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