"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

O PARTIDO-REDE

 

O partido que a ex-senadora Marina Silva começa a revelar amanhã na reunião plenária que marcará seu lançamento oficial pretende ser um instrumento para desmontar as velhas estruturas partidárias e estabelecer uma rede de relacionamento entre diversos políticos, pertencentes ou não à nova sigla, unidos em torno de princípios éticos e programáticos.

Seus fundadores veem essa “rede” como um instrumento estratégico para “dessacralizar” a imagem do partido tradicional, promovendo a ajuda a quadros em uma pluralidade de partidos e na sociedade civil que queiram trabalhar na mesma direção.

A ideia de que o “partido” concentra o jogo político, enquanto a “rede” o dispersa acompanha a formação da nova agremiação, que nasce com a intenção de “virar pelo avesso, o avesso em que vivemos”, na definição do deputado federal Alfredo Sirkis, que será um dos fundadores da rede, que ele sugere estar ligada à questão central do meio ambiente, algo como “Rede Eco” ou “Eco Brasil”.
Junto com ele devem ser fundadores os deputados Walter Feldman (PSDB-SP), Ricardo Tripoli (PSDB-SP), Domingos Dutra (PT-MA) e Reguffe (PDT-DF).

Marina está conversando com o deputado federal petista Molon, que vai ajudar, mas ainda não decidiu se oficialmente participa da fundação ou se vai esperar para inaugurar o tipo de aliança informal que está prevista na própria formação do novo partido-rede.

Seus organizadores têm a esperança que outros deputados que estão conversando se definam até amanhã, para que a “rede” comece com entre cinco e dez deputados federais.

Os “sonháticos", como se definem, esperam aproveitar a votação de quase 20% que a ex-senadora Marina Silva obteve em 2010 para, com quase três anos de atraso, tentar interferir na correlação de forças políticas existentes.

O entendimento é que, embora Marina não tenha aproveitado seu cacife eleitoral para obter acordos políticos relevantes com os dois finalistas daquela campanha, os eleitores que a viram como uma alternativa àquela época continuam sem perspectiva política e podem ser atraídos outra vez pela nova tentativa de mobilização de jovens e outras gentes ainda esperançosas de mudar o Brasil na direção da sustentabilidade.

Em vez de “pretensiosa e inútil ingenuidade”, os “sonháticos” acham que a melhor opção é ainda sonhar com novas correlações de força, já que a alternativa seria deixar tudo como está e entrar no jogo da maneira que ele está estabelecido, não abrindo “um canal de participação política novo para esses integrantes de nossa sociedade que anseiam por algo diferente”, como diz Sirkis.

É dentro desse conceito novo de fazer política que o partido-rede pretende aprovar na plenária de amanhã estatuto com diversas novidades: o limite de 16 anos no mesmo cargo eletivo, o que equivale a dois mandatos de senador (justamente o tempo que Marina permaneceu como senadora em Brasília) ou quatro mandatos de deputado federal, deputado estadual ou vereador.

Para contrastar, por exemplo, com os 11 mandatos de deputado federal do novo presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves. A ideia é evitar a criação de “parlamentares profissionais”.

Outro ponto destoante será a proibição de doações de campanha oriundas dos setores de bebida alcoólica, cigarro, arma e agrotóxicos. Estranhamente não há restrições ao financiamento de empreiteiras e bancos, setores muito mais envolvidos em polêmicas de financiamento do que as escolhidas.

Essas limitações têm a vantagem de diferenciar o novo partido-rede dos demais em atuação, mesmo com suas inconsistências internas.

O que não está claro é como esse partido-rede atuará, por exemplo, na formação de coligações partidárias para a disputa presidencial de 2014, quando a ex-senadora concorrerá novamente à Presidência da República.

Esses acordos “virtuais” podem até mesmo funcionar em votações suprapartidárias no Congresso, mas não funcionam quando objetivamente se tem que conseguir o maior tempo de propaganda no rádio e televisão numa campanha eleitoral.

15 de fevereiro de 2013
Merval Pereira, O Globo

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