Nós sabemos e ele sabe, mas o Governo se esconde até o instante da tragédia.
A cobrança da sociedade é logo esquecida, o próprio desalento se transforma em
vezes nada.
A imprensa se despede e leva consigo os políticos. Ficamos nós que já não somos. Quem falou em banalidade do mal?
As autoridades se surpreendem quando a chuva cai e o balão pega fogo. Não importa, haverá abrigos para os rotos, teto para os desabrigados, hospitais para os feridos e pêsames para os mortos.
A fatalidade ignora culpa, até por que é fatalidade. Mas a mentira no Brasil tem perna curta, embora ninguém ligue por que a memória também é curta.
Seja como for, nos primeiros dias da catástrofe há uma euforia do desespero; a mobilização é instantânea, a solidariedade é sôfrega e comovente, o socorro trafega rápido trazendo bombeiros, a Defesa Civil, médicos, enfermeiros, voluntários e as autoridades.
É possível conhecer a dimensão do flagelo pela importância dos representantes públicos presentes. A proporcionalidade deve ser respeitada; quanto maior o estrago e o número de mortos (o número de desabrigados e feridos é quase irrelevante), maior a hierarquia do preposto da República no local do acidente (do presidente ao vereador).
EM CADEIA NACIONAL
Assim, dependendo da magnitude do cataclismo, em cadeia nacional ou na rádio da região afetada, os políticos prestam depoimentos para uma imprensa ofegante pelas melhores tomadas das visões do horror. Em geral, deploram a desgraça havida, prometem investigação extenuante, a crucificação dos culpados em praça pública, compensação para as vítimas, providências incontinenti, milhões e milhões dos fundos de emergência, e vão embora.
Antes, instalam o gabinete da crise para enfrentar aquela situação angustiante e se deixam todos fotografar, com o rosto crispado e circunspecto, reunidos em uma enorme mesa, com ouvidos atentos para as orientações sempre sensatas dos especialistas em desastres.
Em seguida à reunião, os representantes do poder, os mais graduados, concedem entrevistas e dissertam sobre as medidas imediatas a ser adotadas e projetam a adoção de diversas outras para um futuro próximo.
Logo, as vozes de indignação e de promessas vão diminuindo, diminuindo, até que não se ouve sequer um suspiro soprado pelo vento mais indiscreto. As ações reparadoras duram menos ainda.
Na data do aniversário da hecatombe, algum jornal se lembra e reclama a falta do compromisso assumido e não concretizado pelo Governo. No dia seguinte, depois de uma explicação técnica e contundente do ministro ou secretário responsável, a marola se dissolve e até o silêncio pede desculpas.
O Ministério Público, atento à justificativa, fecha a cara, diz um palavrão, anda de um canto para outro, toma um whisky, olha para o lado, e vai dormir.
Se não fosse pela criação do gabinete da crise, haveria, ao menos, uma leve, levíssima, sensação de conforto.
(artigo enviado por Mário Assis)
15 de fevereiro de 2013
Francisco de Assis Chagas de Mello e Silva
A imprensa se despede e leva consigo os políticos. Ficamos nós que já não somos. Quem falou em banalidade do mal?
As autoridades se surpreendem quando a chuva cai e o balão pega fogo. Não importa, haverá abrigos para os rotos, teto para os desabrigados, hospitais para os feridos e pêsames para os mortos.
A fatalidade ignora culpa, até por que é fatalidade. Mas a mentira no Brasil tem perna curta, embora ninguém ligue por que a memória também é curta.
Seja como for, nos primeiros dias da catástrofe há uma euforia do desespero; a mobilização é instantânea, a solidariedade é sôfrega e comovente, o socorro trafega rápido trazendo bombeiros, a Defesa Civil, médicos, enfermeiros, voluntários e as autoridades.
É possível conhecer a dimensão do flagelo pela importância dos representantes públicos presentes. A proporcionalidade deve ser respeitada; quanto maior o estrago e o número de mortos (o número de desabrigados e feridos é quase irrelevante), maior a hierarquia do preposto da República no local do acidente (do presidente ao vereador).
EM CADEIA NACIONAL
Assim, dependendo da magnitude do cataclismo, em cadeia nacional ou na rádio da região afetada, os políticos prestam depoimentos para uma imprensa ofegante pelas melhores tomadas das visões do horror. Em geral, deploram a desgraça havida, prometem investigação extenuante, a crucificação dos culpados em praça pública, compensação para as vítimas, providências incontinenti, milhões e milhões dos fundos de emergência, e vão embora.
Antes, instalam o gabinete da crise para enfrentar aquela situação angustiante e se deixam todos fotografar, com o rosto crispado e circunspecto, reunidos em uma enorme mesa, com ouvidos atentos para as orientações sempre sensatas dos especialistas em desastres.
Em seguida à reunião, os representantes do poder, os mais graduados, concedem entrevistas e dissertam sobre as medidas imediatas a ser adotadas e projetam a adoção de diversas outras para um futuro próximo.
Logo, as vozes de indignação e de promessas vão diminuindo, diminuindo, até que não se ouve sequer um suspiro soprado pelo vento mais indiscreto. As ações reparadoras duram menos ainda.
Na data do aniversário da hecatombe, algum jornal se lembra e reclama a falta do compromisso assumido e não concretizado pelo Governo. No dia seguinte, depois de uma explicação técnica e contundente do ministro ou secretário responsável, a marola se dissolve e até o silêncio pede desculpas.
O Ministério Público, atento à justificativa, fecha a cara, diz um palavrão, anda de um canto para outro, toma um whisky, olha para o lado, e vai dormir.
Se não fosse pela criação do gabinete da crise, haveria, ao menos, uma leve, levíssima, sensação de conforto.
(artigo enviado por Mário Assis)
15 de fevereiro de 2013
Francisco de Assis Chagas de Mello e Silva
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