"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sábado, 13 de julho de 2013

"LIMITAÇÕES DO SINDICALISMO OFICIALISTA"

É árdua a tarefa de ir à rua para não criticar o governo, no momento em que a inflação se mantém elevada, o crescimento é anêmico e há riscos da volta do desemprego
 
Depois do abalo sísmico causado na política nacional pela erupção de manifestações de rua articuladas em junho por meio de redes sociais, à margem de partidos e outras organizações políticas estabelecidas, o agendamento para quinta-feira do “Dia Nacional de Luta”, por sindicatos e partidos como PT, ganhou um caráter de confronto.
 
Quem mais mobilizaria: sindicatos com ligações governamentais — uns mais próximos do Planalto como a CUT, outros, como a Força, em fase de ensaio de voo solo partidário — ou grupos interconectados na internet? Frustrou-se quem esperava uma resposta à altura do esquema incrustado no poder há mais de dez anos. Até o PT, o outrora rei das ruas, se manteve recolhido, depois de escorraçado de algumas passeatas no mês passado. Justificou que preferiu deixar os espaços para os sindicatos. Pode haver quem acredite.
 
Foram visíveis as diferenças. Primeiro, de tamanho: 1 milhão de pessoas, estimadas para as capitais no dia 20 de junho, contra algo em torno de 100 mil na quinta-feira. Mais importante que isso, porém, foi a diferença das pautas de reivindicação.
 
Enquanto as manifestações de junho, com muito mais jovens, trataram de questões amplas, capazes de sensibilizar todos — combate à corrupção, ética na política, baixos investimentos em transporte, educação e saúde —, os sindicatos oficialistas colocaram a tropa nas ruas com a velha agenda trabalhista, corporativista: redução da jornada de trabalho com manutenção dos salários, fim do fator previdenciário, aumentos salariais etc.

Alguns dos pedidos são inexequíveis, sob o risco de explodir de vez as contas públicas. É o caso do fator previdenciário, um “jeitinho” de compensar o efeito negativo no caixa da Previdência da possibilidade de aposentadoria independentemente da idade até que se faça a necessária reforma a fim de instituir o limite etário mínimo para a obtenção do benefício. Houve um ensaio de críticas ao governo.
 
A Força, cujo, líder, Paulo Pereira da Silva, trabalha para lançar um partido, pediu o afastamento do ministro Guido Mantega, algo que imagina ser popular. Mas nada de mirar na corrupção, pois o oficialismo de cada um os impede disto. Até porque há sempre a possibilidade de alguma pedra atingir o próprio telhado de vidro de quem se já se refestelou no condomínio criado no orçamento do Ministério do Trabalho. Restou ao movimento a abusiva e criminosa paralisação de rodovias, algo que começa perigosamente a se transformar em rotina.
 
O artificialismo das manifestações organizadas por máquinas profissionais de protesto ficou visível na confecção industrial de faixas — em contraposição às cartolinas escritas à mão, de junho —, carros de som e na comprovação do pagamento a “manifestantes”. Resta provado que é árduo não criticar um governo quando a economia vai mal, com inflação renitente, crescimento anêmico e perspectivas da volta do desemprego. O que leva à falta de palavras de ordem convincentes para encher as ruas.

13 de julho de 2013
editorial de O Globo

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