Das nove associações que as arrebanharam, pelo menos duas, a Força Sindical e a União Geral dos Trabalhadores (UGT), contrataram "manifestantes" a R$ 50 e R$ 70 por cabeça.
Contrastando com a profusão de faixas, balões, bandeiras, camisetas, bonés e fitas, tudo confeccionado em escala industrial pelas centrais que devem a sua prosperidade exclusivamente à aberração do Imposto Sindical - o dia de salário por ano compulsoriamente recolhido de todos quantos tenham carteira assinada -, o clima era de apatia.
"Uma representante da CUT desfilou durante algum tempo diante do carro de som com um rolo de bandeiras debaixo do braço, procurando militantes para empunhá-las", relatou um repórter deste jornal. "Não encontrou."
O que era para ser uma quinta-feira difícil na maior metrópole brasileira acabou sendo um domingo extra. Inumeráveis empresas, temendo o pior, dispensaram seus empregados. Ônibus e metrô circulavam com poucos passageiros.
Na cidade conhecida mundo afora por seu trânsito engarrafado, o congestionamento mal passava dos 10 quilômetros. Realizados em 68 cidades, incluindo todas as capitais e o Distrito Federal, os protestos foram maiores ali onde o transporte público deixou de funcionar, a exemplo de Belo Horizonte e Vitória. Mas, tudo somado, apenas umas 100 mil pessoas participaram das passeatas.
O Brasil dos carros de som, da discurseira sem fim da caciquia das centrais - essas "entidades burocratas", como bem as qualificou Mayara Vivian, uma das ativistas do Movimento Passe Livre (MPL) que entrou para a história por ter dado a partida às recentes megamanifestações - é um Brasil em marcha batida para a irrelevância.
A afiliação a sindicatos ainda é relativamente expressiva entre nós, mas a tendência é de declínio. Em 2011, último ano para o qual há dados disponíveis, a taxa de sindicalização era de 17,2% do total da população ocupada, ante 18,6% no ano de pico de 2006, a contar da década de 1990. E isso considerando o aumento do nível de emprego regular, a expansão do setor de serviços e da sindicalização do funcionalismo.
O sindicalismo no Brasil - em especial o que se pode chamar "sindicalismo de rua", por sua capacidade de arregimentar - é uma caricatura do que foi outrora o poder sindical em países como França, Espanha, Itália, Grã-Bretanha e mesmo nos Estados Unidos (onde, de um recorde de 35% de sindicalizados nos anos 1950, o índice atual é 1/5 disso). Na Europa, a CGT e seus similares, como o TUC britânico, mobilizavam legiões e influíam como nenhuma outra força nos partidos de esquerda.
Aqui, ao revés, as centrais ou são criaturas de agremiações políticas, como a CUT em relação ao PT, ou trampolim para carreiras políticas, como a do notório Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, ex-PTB, hoje no PDT e com planos de ter um partido para chamar de seu, o Solidariedade.
Do pelegato da era Vargas ao sindicalismo de resultados, aplica-se às organizações que falam em nome dos assalariados, de resto compelidos por lei a sustentá-las, o que o antropólogo Claude Lévi-Strauss dizia, em outro contexto, sobre a "obsolescência do inacabado".
Quando Lula, o metalúrgico, irrompeu na cena nacional, defendendo a formação de associações de classe que não fossem correias de transmissão dos governantes de turno, parecia que uma página verdadeiramente nova começava a ser escrita numa história pouco edificante. Lula, o presidente, alojou na máquina estatal os condutores da máquina sindical ligada ao PT. O aparelhamento era o que faltava para envelhecer o sindicalismo brasileiro sem que tivesse passado pela maturidade.
A um oceano de distância dos idos de junho, o Dia Nacional de Lutas foi o retrato acabado desse definhamento.
13 de julho de 2013
Editorial do Estadão
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