“Se o governo federal entende que a Amazônia só faz parte do Brasil para lhe pagar imposto, não tem de que se estranhar se os habitantes de lá acharem que tal honra lhe sai muito cara, e procurarem constituir-se em nação independente”.
(Associação Comercial do Amazonas ao governador Jonathas Pedrosa, em Jul 1913 – Antonio Loureiro, em A GRANDE CRISE, pág. 146).
1. Considerações Básicas
A Bacia Amazônica é uma imensa região natural da América do Sul, provida de um sistema fisiográfico fechado, dotado de características ecológicas singulares e isolado do restante do continente. Essa configuração da natureza tem favorecido a unidade política da Amazônia Brasileira.
O território amazônico encerra um potencial incomensurável de recursos naturais, sendo a última fronteira biológica e mineral do planeta. Contudo, o conhecimento dessas peculiaridades ainda representa um desafio à ciência.
A “esfinge amazônica” de Djalma Batista destaca um dilema histórico: povoá-la e explorá-la, com o risco de desequilibrar os ecossistemas, ou preservá-la para o futuro, privando a geração presente do usufruto de seus recursos e aceitando um risco crescente à soberania nacional.
O professor Armando Mendes alertou que “o maior problema político da Amazônia é o seu vazio populacional”. Sem população, não existe atividade econômica, nem presença institucional. Daí, a causa principal da ausência do Estado.
O povoamento efetivo dos vales da calha Sul do rio Amazonas ocorreu durante o ciclo da borracha, graças ao atrativo da “hevea brasiliensis”, uma árvore de grande produtividade, que enriqueceu os seringais. Na Calha Norte, porém, o território permaneceu deserto, devido ao predomínio da seringueira “hevea benthamiana”, de baixa produtividade, que inviabilizava a sua exploração econômica. A área compreendida entre os estados de Roraima e Amapá, ainda hoje, continua como um grande vazio demográfico, potencializando o risco geopolítico da Região.
O professor Samuel Benchimol enfatizava que “a poluição maior é a da miséria”, e que “os anseios sociais da comunidade nativa não podem ser ignorados em favor de interesses exógenos”. A pobreza vem aumentando, com o crescimento vegetativo da população, que avança a uma taxa superior à média nacional. Segundo o IBGE, são 42% de pobres. Assim, dentre os 24 milhões de habitantes da Amazônia Legal, há cerca de 11 milhões de pessoas na pobreza.
Em acréscimo, a falta de condições de sobrevivência na área rural estimula um fluxo migratório contínuo, que engrossa as cidades e esvazia o interior. Atualmente, 80% dos nativos residem nas cidades, enquanto apenas 20% povoam o imenso deserto verde.
O abandono da Região Amazônica vem sendo inspirado pelas campanhas midiáticas do movimento ambientalista-indigenista internacional, que, sem dúvida, constitui o maior risco à soberania nacional. Outras ameaças menos decisivas provêm da biopirataria, que, de certa forma, é dirigida por esses mesmos grupos de interesse; do crime organizado transnacional e das guerrilhas do entorno estratégico.
Portanto, é preciso superar os óbices existentes, para integrar a Amazônia, desenvolvê-la em bases autossustentáveis e tornar a sua economia autossuficiente.
2. Plano Estratégico de Integração e Desenvolvimento
Um plano estratégico deve englobar um conjunto criterioso de políticas do setor público, com potencial sinérgico para provocar a deflagração de outras atividades do setor privado, atraindo investimentos que lhe complementem o escopo.
Para a Amazônia, a primeira providência há de ser legislativa e midiática. É preciso substituir o paradigma da “preservação ambiental” pelo da “sustentabilidade”, isto é, a preservação do equilíbrio ecológico. O ser humano não pode ser considerado um intruso na natureza. Se esse sofisma fosse verdadeiro, a Terra já teria entrado em colapso, devido à explosão populacional dos dois últimos séculos. Como exemplo, o projeto URUCU da Petrobrás mostrou que é possível explorar sem degradar.
Nesse contexto, também, é preciso reverter o paradigma da “interação indígena”, introduzido na Constituição Federal de 1988, por pressão do movimento indigenista internacional, retornando o País à política tradicional de “integração do índio à comunhão nacional”, como previsto no Estatuto do Índio, a fim de lhe proporcionar as condições de acesso ao progresso. A massa de 68,5% de mestiços na composição populacional da sociedade nativa indica o caminho natural a ser seguido, desmentindo as teses artificiais dos chamados “antropólogos da ação”. Essa providência visa a contribuir para a integração psicossocial da Região e do Brasil.
O passo seguinte é estimular a formação de um grande mercado regional na Amazônia brasileira, a fim induzir atração gravitacional sobre as economias circunvizinhas, sem depender das hesitações dos condôminos da OTCA. Para isso, aplicar um plano de desenvolvimento regional integrado e autossustentável, com as ações propostas a seguir, a fim de reverter a matriz econômica extrativista, tornando a Região autossuficiente.
Conectar fisicamente o território brasileiro a todos os países condôminos da Pan-Amazônia, a despeito das restrições existentes, como reservas indígenas e áreas da proteção ambiental contíguas à Faixa de Fronteira. Esses entraves foram criados, exatamente, para impedir ou retardar a integração.
Conceber um programa de infraestrutura, a exemplo do antigo POLAMAZÔNIA, que estimule investimentos públicos e privados para efetivar a vocação geoeconômica de Belém como entreposto de comércio internacional; de Manaus, como centro regional; de Vilhena e Porto Velho, como entrepostos entre a região Centro-Oeste e a Amazônia; e da região Acre/Rio Branco, como grande entreposto entre o Brasil e o Oceano Pacífico.
Desatar as restrições ambientais e indigenistas de Roraima, a fim de liberar o desenvolvimento do Estado, reativando o seu potencial agropecuário e mineral. Cabe observar que o território roraimense está inserido no espaço geopolítico definido como “Ilha da Guiana”, uma área de exclusão socioeconômica preconizada pelos centros decisórios do movimento indigenista-ambientalista internacional.
Planejar a autonomia progressiva do território do Alto Rio Negro/S. Gabriel da Cachoeira, mediante uma evolução institucional e da sua infraestrutura econômica e social.
Construir o complexo hidrelétrico do rio Trombetas, a fim de prover energia para o médio Amazonas, viabilizar a exploração do alumínio e expandir o polo estratégico de Oriximiná.
Transformar os canteiros dos empreendimentos hidrelétricos federais na Região em polos de desenvolvimento econômico e social.
Paralelamente, vitalizar a presença diplomática e de inteligência junto aos centros decisórios do movimento indigenista-ambientalista internacional, antecipando providências e neutralizando as suas campanhas midiáticas. Simultaneamente, “quebrar o braço nacional” desse mesmo movimento, por meio de um controle estrito sobre as ONGs internacionais que operam no Brasil e suas subsidiárias nacionais. Essa estratégia implica estancar as transferências de recursos públicos para as ONGs indigenistas e ambientalistas, amparadas no Termo de Parceria previsto no Art. 2º da Lei das OSCIPs (Lei 9790, de 23 de março de 1999).
E, objetivando contribuir para a integração física dos centros estratégicos regionais, recomenda-se a execução dos seguintes projetos:
- restauração e pavimentação da rodovia BR-319 (Manaus-Porto Velho);
- pavimentação da rodovia BR-163, para efetivar a ligação alternativa entre o Centro-Oeste (Cuiabá) e o Médio Amazonas (Santarém);
- pavimentação da rodovia Transamazônica, no trecho entre Altamira/PA a Humaitá/AM. Cabe esclarecer que é falso o noticiário de que essa estrada degrada o ecossistema amazônico, pois o seu traçado desenvolve-se na faixa de transição entre os ecossistemas da Bacia Amazônica e do Cerrado do Centro-Oeste.
- proteção do fluxo rodoviário regional, com a presença permanente da Polícia Rodoviária Federal em todas as rodovias federais.
- construção de um complexo rodoferroviário e de transmissão de energia e dados sobre o rio Amazonas, na região de Óbidos/PA, para integração da Calha Norte e do polo de Oriximiná/PA à região de Santarém.
No campo da saúde, criar programas destinados à erradicação das principais moléstias tropicais que flagelam a população nativa. Para isso, vitalizar e integrar os centros de pesquisa científica sediados em Manaus e Belém e estender a rede de pesquisa de campo às regiões endêmicas, visando ao desenvolvimento de vacinas e medicamentos de ponta.
No campo da Ciência e Tecnologia, implementar um plano estratégico de pesquisa e desenvolvimento, vitalizando e integrando as atividades e a comunidade científica dos institutos de pesquisa de Manaus e Belém (INPA, EMBRAPA, EMÍLIO GOELDI e outros). Fomentar, prioritariamente, os projetos de estudo e pesquisa do solo, da água e da flora, voltados à agricultura, à silvicultura, à fitoterapia e à aquicultura, assim como a atividade de extensão rural.
No quadro das políticas sociais governamentais, criar programas de nutrição, saúde e educação específicos para os indígenas e a população rural da Faixa de Fronteira. Mediante alterações na legislação geral, atribuir um tratamento preferencial aos indígenas, para ingresso no serviço público dessas áreas, priorizando o seu recrutamento como técnicos de saúde, vigilantes sanitários, fiscais de órgãos federais e outros serviços.
Formar mão-de-obra indígena, para depois absorvê-la no serviço público, considerando que a melhor estratégia de assimilação é pelo recrutamento de seus membros para a assistência social às suas próprias comunidades. Esta proposta, que se inspira no trabalho do marechal Rondon, poderia ser concretizada com o apoio do Exército.
Finalmente, aumentar a presença militar no território, consoante o planejamento das Forças Armadas, e ampliar as atribuições da autoridade militar, concedendo-lhe poder de polícia em toda a Amazônia Legal, em acréscimo à sua destinação constitucional.
3. Epílogo
A indecisão política e as condições adversas geradas por pressões e outros óbices têm postergado indefinidamente a solução dos problemas amazônicos. Enquanto isso, cresce a população, potencializam-se as carências e esvai-se a esperança.
Como ficou demonstrado pelos jornalistas Lorenzo Carrasco e Silvia Palácios, em seu livro Quem Manipula os Povos Indígenas Contra o Desenvolvimento do Brasil, há uma estranha convergência de interesses socialistas e capitalistas ligados à Amazônia, em conspiração contra a soberania brasileira, fazendo com que grupos de aguerridos militantes de esquerda batalhem por objetivos inconfessáveis da elite capitalista global.
Em resposta a esse cenário conflituoso, este trabalho sintético visa a contribuir com uma agenda de propostas específicas para a conscientização patriótica em torno de um interesse nacional tão candente.
Um século depois, o brado de alerta de Euclides da Cunha, no auge do ciclo da borracha, permanece a ecoar, ainda mais forte, clamando a atenção das novas gerações:
“Se as nossas autoridades não se preocuparem com a Amazônia, mais cedo ou mais tarde ela se destacará do Brasil, natural ou irresistivelmente, como se desprega uma nebulosa de seu núcleo, pela expansão centrífuga de seu próprio movimento”.
06 de agosto de 2013
Maynard Marques de Santa Rosa é General de Exército na Reserva.
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