"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 16 de julho de 2012

HISTÓRIAS DO JORNALISTA SEBASTIÃO NERY

AS SOLUÇÕES DO MAJOR DEDÉ

Ninguém conhecia os irmãos Melo e Silva pelo sobrenome. Eram gente só de nome. E nome nacional. Drault Ernâni, banqueiro. Bivar Olinto, deputado. Adelgilson, personagem desta história. Na seca de 32, Adegilson de Melo e Silva era o major Dedé, chefe político e prefeito de Patos.
A fome estava feia, major Dedé fundou a sua Sunab: baixou portaria tabelando os preços de alimentos e mandou pregar na feira.

O povo gostou. Mas o engenheiro Palunga, chefe do 3º Distrito do Dnocs, na Paraíba, e responsável pelas medidas federais contra a seca no Estado, achou que era uma arbitrariedade do prefeito. E mandou rasgar a portaria.

Major Dedé foi à pensão onde o engenheiro Palunga estava hospedado e tentou explicar. A situação era de emergência, havia fome demais e ele, com o prefeito, tinha que tomar uma providência. A providência era o tabelamento. Fez nova tabela, mandou pregar na feira.

O engenheiro Palunga não disse nada. Saiu, foi à feira, rasgou de novo a tabela. Major Dedé chamou dois ajudantes e tocou para a pensão. O engenheiro Palunga ia saindo do banho todo enrolado. Major Dedé levou-o para o quarto, pediu a mão e deu doze bolos. Seis em cada uma.

No dia seguinte, o engenheiro Palunga viajou para João Pessoa e mandou ofício para José Américo, o ministro das secas. Ninguém sabe o que José Américo respondeu. O que se sabe é que a tabela do major Dedé ficou na feira de Patos até a seca acabar.

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AGORA É DE GRAÇA

Major Dedé se cansou da vida pública e veio para o Rio. Jurou nunca mais se meter em brigas cívicas. Um dia, foi ao Aeroporto Santos Dumont receber uma casal de amigos que não conhecia o Rio. Entrou no táxi, pediu ao motorista:

- Estes meus amigos não conhecem a cidade. Vão para o hotel. Mas antes eu queria que o senhor desse uma volta pelo Flamengo e Botafogo, para eles começarem a conhecer.

- Só vou para Copacabana. E direto.

- Mas, meu senhor, compreenda. O senhor não vai perder nada. Pode cobrar em dobro, eu pago. Apenas queria que eles tivessem uma primeira visão do Rio. É coisa rápida.

- Já disse. Só vou para Copacabana. E direto.

Major Dedé ficou parado, pensou na paz que tinha vindo buscar no Rio, mas se lembrou de Patos, lá na Paraíba, puxou um 38 de cano curto, encostou no ouvido do motorista:

- Meu senhor, o senhor vai dar uma voltinha, pela cidade todinha. E, agora, de graça.

Sebastião Nery
16 de julho de 2012

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