"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 27 de julho de 2012

O ÚLTIMO ROUND

A denúncia contra os réus do mensalão inclui indiciamentos por lavagem de di­nheiro, peculato, corrupção passiva e ativa e evasão de divisas. Mas não im­porta qual dessas acusações pese sobre seus clientes, os advogados de defesa têm pelo me­nos uma tese em comum: a de que o mensalão nunca existiu. Em meio a esse coro quase unís­sono dos réus, existe uma única voz dissidente.
O ex-deputado Roberto Jefferson vai insistir no argumento de que deputados federais recebiam uma mesada do governo para votar de acordo com os interesses do Palácio do Planalto. E, mais uma vez, o pivô do escândalo do mensalão vai bater na tecla de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi alertado sobre o esquema.
Apesar da tese comum de que o mensalão não teria passado de uma invenção de Roberto Jefferson, as defesas dos acusados são extensas e trazem centenas de outros argumentos para tentar livrar os réus da condenação — que em vários casos poderá levá-los diretamente para a cadeia.
A concordância dos advogados quanto à suposta inexistência do mensalão se restringe a esse tema. As peças entregues pelas defesas trazem acusações mútuas entre os réus, além de sucessivas tentativas de desqualificar a de­núncia da Procuradoria Geral da República.
O marqueteiro Duda Mendonça acusa Marcos Valério de ter feito variadas remessas de recur­sos ao exterior. Já o ex-ministro José Dirceu acusa Roberto Jefferson de ser uma pessoa sem credibilidade para figurar como denunciante principal do esquema. Jefferson, por sua vez, dispara contra todos e ainda tenta trazer o ex- presidente Lula para o meio do furacão.

O advogado Marcelo Leonardo, que repre­senta Marcos Valério, diz que as denúncias levantadas contra o seu cliente não terão reflexos no julgamento. "Essas acusações feitas por al­guns dos réus não são relevantes e não influen­ciam em nada. Portanto, não nos preocupam", comenta o criminalista. Sobre a tese de que o mensalão não existiu, ele explica que a afirma­ção se repete em todas as defesas porque não há provas nos autos que demonstrem o paga­mento de mesada a parlamentares. "A única pessoa que fala em mensalão é o Roberto Je­fferson, mais ninguém.

Foram ouvidas 500 tes­temunhas ao longo do processo e nenhuma delas confirma a versão. Ele (Roberto Jefferson) ficou isolado", comenta Marcelo Leonardo. Segundo a denúncia da PGR,o empresário Marcos Valério seria o operador de repasses de recursos financeiros a partidos, agindo sob a orientação do ex-tesoureiro Delúbio Soares.

A defesa de Valério rebate a acusação e, assim c­mo Roberto Jefferson, questiona por que o ex-presidente Lula não aparece entre os réus. "É raríossimo caso de versão acusatória de crime em que o intermediário aparece como a pessoa mais importante da narrativa, ficando mandantes e beneficiários em segundo plano, alguns inclusi­ve de fora da imputação, como o ex-presidente Lula", diz um trecho da defesa do publicitário.

Para tentar emplacar a tese do mensalão propagada por Jefferson, seu advogado, Luiz Francisco Corrêa Barbosa, diz que há, sim, pro­vas do pagamento de mesada. "É natural que pessoas acusadas com flagrante rejeitem os fa­tos.
Mas há recibo e impressões digitais no caso do mensalão", diz o advogado, referindo-se às imagens divulgadas à época de deputados e empresários sacando recursos do Banco Rural, em um shopping da cidade.
"A denúncia contra ele diz respeito ao recebimento de R$ 4 mi­lhões. Mas essa transferência foi para o paga­mento de campanhas das eleições municipais de 2004 e foi, portanto, um repasse lícito."
Quadrilha
Apontado como "o chefe da quadrilha pela Procuradoria-Geral da República, o ex-ministro ( da Casa Civil José Dirceu segue a linha de que o mensalão não existiu e também adota o dis­curso de desqualificar Roberto Jefferson. "A nossa avaliação é de que, após cinco anos de processo e mais de 500 testemunhas ouvidas, não existe qualquer documento, reunião ou indício que possa incriminar o José Dirceu", diz o advogado do ex-ministro, José Luís Oliveira Lima.

As principais alegações do réu são de que, na Casa Civil, ele não teria ingerência sobre o PT nem mantinha vínculos com o empresário Marcos Valério. "A denúncia feita pelo Ministé­rio Público não tem qualquer consistência.

Não existe possibilidade de contaminação po­lítica do julgamento, estamos tranqüilos quan­to a isso porque os ministros são experientes."

O ex-presidente do PT José Genoino é acusa­do de participação nas negociações relativas ao repasse de recursos a partidos políticos aliados.

O réu, hoje assessor do Ministério da Defesa, nega a existência do mensalão e chama essa acusação de "fantasiosa". O advogado de Genoino, Luiz Fernando Pacheco, acredita que seu cliente será absolvido e que o julgamento servirá para "limpar o nome" de Genoino. "Depois de sete anos, teremos a oportunidade de limpar o nome de um homem público honesto e com conduta irrepreensível. Não existe o mínimo indício de qualquer pagamento de mesada para que os deputados votassem com o governo."

O advogado tenta minimizar a influência de Genoino no PT e diz que o ex-presidente não foi eleito, mas assumiu involuntariamente o cargo quando José Dirceu virou ministro da Ca­sa Civil. "Genoino tomou-se presidente de uma diretoria já eleita. O PT não tinha crédito na praça e Delúbio conseguiu no BMG e no Banco Rural. Os empréstimos são legítimos", assegura Luiz Fernando.

O ex-presidente do Partido Progressista (PP) Pedro Corrêa foi um dos três deputados cassa­dos à época do escândalo do mensalão, ao lado

de Roberto Jefferson e de José Diiceu. Ele é acusado de receber R$ 4,1 milhões do esquema. "O di­nheiro foi totalmente usado para pagar despesas de campanha. Parte dos recursos foi repassado para o João Cláudio Genu (que era assessor de Jo­sé Janene), que assinou até recibo. Como é que vão dizer que era propina se tem recibo?", ques­tiona o advogado Marcelo Leal, do escritório Eduardo Ferrão advogados associados.

Correio Braziliense (DF)
HELENA MADER e PAULO DE TARSO LYRA
27 de julho de 2012

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