"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 6 de setembro de 2012

FUNDOS DE PENSÃO DE ESTATAIS PODEM SER CONSIDERADOS MINORITÁRIOS DE EMPRESAS LIGADAS AO GOVERNO? NÃO!!!

 

O Óbvio Ululante (personagem evocado pelo centenário imortal Nelson Rodrigues) nem sempre é ouvido e praticado corretamente no mercado. Certas coisas que deveriam ser óbvias acabam dando margem a discussões e interpretações absolutamente sem sentido, sempre de acordo com agendas (mal) escondidas. É o caso da discussão sobre a atuação do BNDES e dos fundos de pensão de empresas estatais na assembleia de empresas controladas pelo governo.

Fundos de pensão de estatais podem ser considerados minoritários de empresas ligadas ao governo? Primeiramente, a resposta já foi dada pelo regulador, e é NÃO. A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) se manifestou nos casos Mendesprev e Sergus, no sentido de que uma entidade fechada de previdência privada não pode ser considerada minoritária na assembleia de sua patrocinadora, se restar comprovado que a governança daquela tem influência desta. O primeiro caso, inclusive, foi plenamente ratificado pelo “Conselhinho”, encerrando assim a discussão na esfera administrativa.

Os maiores fundos de pensão de estatais têm virtualmente a mesma estrutura de governança: um conselho deliberativo de 6 membros, com representação paritária entre participantes e patrocinadora, mas com a presidência cabendo a esta última. Com a presidência vai o voto de minerva, que garante à patrocinadora a prevalência nas decisões. Ou seja, no final das contas, quem manda é o governo.

Mas essa discussão formal, embora cristalina, deveria ser irrelevante frente a um argumento ainda mais forte. Como dizia Doutor Ulysses Guimarães - “Sua Excelência, o Fato”.

E o fato é que até mesmo as areias do Mourisco, as pedras da Rua do Ouvidor e as janelas espelhadas de Brasilia sabem exatamente quem dá as cartas nos fundos de pensão de estatais: é o Governo Federal ! Alegar o contrário é insultar a inteligência da contraparte – e não precisamos ir além da última sucessão na Previ para termos prova disso. Isto é o que alguns redatores neste site Alerta Total chamam de “Capimunismo”: o Estado e seu governo interferindo sempre e diretamente nas decisões econômicas, principalmente das grandes empresas privadas ou de economia mista.

No caso da Petrobrás, é sabido que os conselheiros eleitos pelos fundos estatais foram convidados para esta função diretamente pelo governo. E embora sejam brasileiros de ilibada reputação, não podem ser considerados independentes na função de conselheiros da Petrobrás. Antes terem deveres fiduciários em relação a esta, devem fidelidade às suas respectivas organizações – que também são empresas abertas com acionistas minoritários. Não é por outra razão que os conselheiros ditos independentes aprovaram a capitalização da Petrobrás, que tantos prejuízos gerou a seus acionistas.

No mais, alegam-se factoides para sugerir que os fundos poderiam votar como minoritários – subtraindo assim dos minoritários legítimos – inclusive eu e você – a prerrogativa de eleger administradores verdadeiramente independentes.

Factoide 1: a natureza de direito privado dos fundos de pensão – fato pacificado, que provavelmente é alegado na página aí ao lado. Trata-se de discussão absolutamente irrelevante para a determinação da natureza dos fundos de pensão como minoritários. São entidades de direito privado sim, mas têm seus desígnios determinados nos gabinetes de Brasilia.

Factoide 2: a abstenção, mandatória ou voluntária, de conselheiros eleitos pela patrocinadora. A abstenção dos administradores não afasta a ligação estrutural entre os fundos de pensão, estatais e, consequentemente, governo. Ilustrando: uma abstenção da Sra. Maria das Graças Foster de deliberação do conselho da BR Distribuidora não muda o fato de que esta é uma subsidiária da Petrobrás. Da mesma forma, a abstenção de um diretor da Petros nomeado pela Petrobrás não elimina sua condição de parte relacionada – o que aliás é reconhecido até mesmo no balanço da Petrobrás.

É triste que o óbvio precise ser dolorosamente defendido para finalmente se impor. A inação da CVM em casos como a assembleia da Petrobrás, e a incapacidade de investidores institucionais em acionar a Justiça para fazer prevalecer a verdade colocam em xeque a essência dos freios e contrapesos que deveriam ser a base de nosso mercado de capitais.

Enquanto prevalecer o modelo capimunista, os grandes lesados são os investidores minoritários que ainda apostam em ganhos com atividades empreendedoras – cada vez mais inviabilizadas no Brasil em que o governo em tudo se mete, abusa de corrupção e pratica o confisco direto da renda da sociedade com os impostos extorsivos.

A Especulação, a Politicagem e a Roubalheira não podem vencer aqueles que são honestos e acreditam em investimentos produtivos.
06 de setembro de 2012
Romano Guido Nello Gaúcho Allegro, Presidente do Instituto Brasileiro de Ativismo Societário e Governança, é Administrador especializado em mercado de capitais.

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