A definição sobre as penas dos condenados no processo do mensalão será mais complicada do que se imagina, e por isso fez bem o relator Joaquim Barbosa em pedir uma reunião extraordinária para tentar encerrar na próxima semana o julgamento do último item, o de formação de quadrilha.
Há detalhes de todo tipo a determinar maior ou menor pena. O caso do ex-ministro José Dirceu, de que tratei na coluna de ontem, tem mais nuances. Dos nove crimes de corrupção ativa por que ele foi condenado, nada menos que oito deles foram cometidos em 2003 e são puníveis pela lei antiga, alterada em novembro daquele ano.
A pena mínima, em vez de dois anos, era de um ano, e a máxima, de oito anos, em vez de 12. Se os ministros decidirem que o caso é de “concurso material”, a soma das penas deve ser reduzida.
Mas, se decidirem que houve “crime continuado”, quando as penas não acumulam, a nova lei deve ser a base para a definição da pena, pois de acordo com a súmula 711 do Supremo, quando uma legislação mais dura substitui uma anterior, ela é que deve ser utilizada para basear a pena.
A defesa teme que o relator Joaquim Barbosa faça pressão para manter a acusação nos termos do procurador-geral. O advogado Antonio Carlos Almeida Castro, o Kakay, que levou à absolvição do marqueteiro Duda Mendonça, acha que manter o “concurso material”, em que as penas acumulam, seria dar a José Dirceu uma pena que nem Fernandinho Beira-Mar receberia.
No voto de Barbosa que vazou logo no início do julgamento, ele condenava Kátia Rabello e o núcleo financeiro a penas muito duras, o que leva a crer que ele vai pedir penas duras para todos, podendo com isso encaminhar a votação.
Barbosa fixou a pena de Marcos Valério, a quem classificou ontem como “agente criminoso”, para o crime de lavagem de dinheiro em 12 anos e sete meses de reclusão. A dona do Banco Rural, Kátia Rabello, e o ex-vice-presidente da instituição José Roberto Salgado receberam do relator dez anos de reclusão.
Nos três casos, Barbosa votou pelo início do cumprimento da pena em regime fechado, “sendo incabível” a substituição por penas restritivas de direitos. Além disso, votou pela perda, em favor da União, “dos bens, direitos e valores objeto do crime”.
Como a discussão das penas será feita em reunião aberta, com TV ao vivo, como é hábito nas reuniões do STF, a posição dos ministros será exposta à opinião pública.
O destino de Duda
Não foram apenas as falhas apontadas por especialistas da acusação do procurador-geral da República que possibilitaram a absolvição do marqueteiro Duda Mendonça. Se o relator Joaquim Barbosa tivesse dado o seu voto pela condenação de Duda Mendonça por evasão de divisas, como fez ontem, talvez o marqueteiro não estivesse comemorando hoje sua absolvição tanto por lavagem de dinheiro como por evasão de divisas.
A absolvição de Duda Mendonça aconteceu porque Barbosa mostrou dúvidas sobre o caso em seu voto. Ora, se ele, que é o mais aguerrido, estava em dúvida, todos os outros ministros se sentiram sem base para condenar.
No seu voto na sessão de segunda-feira, Barbosa alegou que a denúncia e o extrato bancário demonstram que Duda Mendonça e sua sócia Zilmar Fernandes tinham depósitos em 2003 com saldo abaixo de 600 dólares. Como não estavam obrigados a declarar, não se caracterizou crime, “razão pela qual se impõe a absolvição de ambos”.
Mas o relator Barbosa também não estava certo sobre o saldo, pois disse que não há dúvidas de que eles mantiveram valores superiores a cem mil dólares escondidos sem declaração. Por isso, admitiu: “Se o plenário decidir em contrário do encaminhamento que fiz acima, admito mudar meu posicionamento.”
Para Joaquim Barbosa, o objetivo final de Duda e Zilmar era o recebimento da dívida e, analisando todo esse contexto, disse que não havia como afirmar que ambos integravam a quadrilha ou a organização criminosa.
Barbosa admitiu que seria “até possível dizer que Duda e Zilmar tinham o objetivo de sonegar tributos, mas eles foram denun, ciados por lavagem, e não por sonegação fiscal”.
18 de outubro de 2012
Merval Pereira, O Globo
Há detalhes de todo tipo a determinar maior ou menor pena. O caso do ex-ministro José Dirceu, de que tratei na coluna de ontem, tem mais nuances. Dos nove crimes de corrupção ativa por que ele foi condenado, nada menos que oito deles foram cometidos em 2003 e são puníveis pela lei antiga, alterada em novembro daquele ano.
A pena mínima, em vez de dois anos, era de um ano, e a máxima, de oito anos, em vez de 12. Se os ministros decidirem que o caso é de “concurso material”, a soma das penas deve ser reduzida.
Mas, se decidirem que houve “crime continuado”, quando as penas não acumulam, a nova lei deve ser a base para a definição da pena, pois de acordo com a súmula 711 do Supremo, quando uma legislação mais dura substitui uma anterior, ela é que deve ser utilizada para basear a pena.
A defesa teme que o relator Joaquim Barbosa faça pressão para manter a acusação nos termos do procurador-geral. O advogado Antonio Carlos Almeida Castro, o Kakay, que levou à absolvição do marqueteiro Duda Mendonça, acha que manter o “concurso material”, em que as penas acumulam, seria dar a José Dirceu uma pena que nem Fernandinho Beira-Mar receberia.
No voto de Barbosa que vazou logo no início do julgamento, ele condenava Kátia Rabello e o núcleo financeiro a penas muito duras, o que leva a crer que ele vai pedir penas duras para todos, podendo com isso encaminhar a votação.
Barbosa fixou a pena de Marcos Valério, a quem classificou ontem como “agente criminoso”, para o crime de lavagem de dinheiro em 12 anos e sete meses de reclusão. A dona do Banco Rural, Kátia Rabello, e o ex-vice-presidente da instituição José Roberto Salgado receberam do relator dez anos de reclusão.
Nos três casos, Barbosa votou pelo início do cumprimento da pena em regime fechado, “sendo incabível” a substituição por penas restritivas de direitos. Além disso, votou pela perda, em favor da União, “dos bens, direitos e valores objeto do crime”.
Como a discussão das penas será feita em reunião aberta, com TV ao vivo, como é hábito nas reuniões do STF, a posição dos ministros será exposta à opinião pública.
O destino de Duda
Não foram apenas as falhas apontadas por especialistas da acusação do procurador-geral da República que possibilitaram a absolvição do marqueteiro Duda Mendonça. Se o relator Joaquim Barbosa tivesse dado o seu voto pela condenação de Duda Mendonça por evasão de divisas, como fez ontem, talvez o marqueteiro não estivesse comemorando hoje sua absolvição tanto por lavagem de dinheiro como por evasão de divisas.
A absolvição de Duda Mendonça aconteceu porque Barbosa mostrou dúvidas sobre o caso em seu voto. Ora, se ele, que é o mais aguerrido, estava em dúvida, todos os outros ministros se sentiram sem base para condenar.
No seu voto na sessão de segunda-feira, Barbosa alegou que a denúncia e o extrato bancário demonstram que Duda Mendonça e sua sócia Zilmar Fernandes tinham depósitos em 2003 com saldo abaixo de 600 dólares. Como não estavam obrigados a declarar, não se caracterizou crime, “razão pela qual se impõe a absolvição de ambos”.
Mas o relator Barbosa também não estava certo sobre o saldo, pois disse que não há dúvidas de que eles mantiveram valores superiores a cem mil dólares escondidos sem declaração. Por isso, admitiu: “Se o plenário decidir em contrário do encaminhamento que fiz acima, admito mudar meu posicionamento.”
Para Joaquim Barbosa, o objetivo final de Duda e Zilmar era o recebimento da dívida e, analisando todo esse contexto, disse que não havia como afirmar que ambos integravam a quadrilha ou a organização criminosa.
Barbosa admitiu que seria “até possível dizer que Duda e Zilmar tinham o objetivo de sonegar tributos, mas eles foram denun, ciados por lavagem, e não por sonegação fiscal”.
18 de outubro de 2012
Merval Pereira, O Globo
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