BUENOS AIRES – Quando chego aqui (e, desde 1955,venho quase todos os anos,
sempre me lembro do francês gordinho do simpatico hotel de Andorra, no pé dos
Pirineus soprados pela nevasca, em pleno dezembro.
Três mil metros de neve e precipícios, frio de menos de 30 graus, em cima o pico de Estats como um véu de noiva, embaixo o desfiladeiro, e o carro, com correntes nos quatro pneus, deslizando devagar a madrugada inteira, à beira dos abismos, na estrada branca e mal iluminada.
Ao amanhecer, afinal, um hotel. Chamava-se Argentina. Por que Argentina, ali embaixo da França, se ele era francês e a Argentina tão longe?
- É uma homenagem ao Brasil. Morei um ano no Rio, trabalhei lá em hotéis de Ipanema e tenho muita saudade das praias e das brasileiras.
- E o que é que a Argentina tem com isso, se não é Brasil?
- É porque Argentina é a palavra mais bonita da língua portuguesa.
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A PRATA
A orgulhosa Argentina fez com que lhe pintassem um universal retrato de arrogância, geralmente injusto. Buenos Aires, o “Puerto de Nuestra Señora Santa Maria Del Bueno Aire”, foi fundada em 1536 pelo espanhol Pedro de Mendoza e refundada pelos espanhóis em 1580,onde hoje é a Plazza de Mayo.
A independência é de 1816, com San Martin, o grande heroi nacional. Passaram séculos antes de a chamarem de Argentina.
Em documentos antigos, já se falava em “civitas argentea”, depois falaram em “argentópólis” e “argyrópolis”, até que o poeta Martin del Barco Centenera criou a “definitiva, bela e melodiosa, maravilhosamente poética” palavra “Argentina”, por causa da prata encontrada com os nativos: nome de mulher, do latim “argentinus”, deus das minas de prata (em latim “argentum”, cujo adjetivo é “argentinus”).
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O JARDIM
- “Na Argentina, onde se cospe nasce uma flor”, diziam os argentinos. Os não argentinos achavam petulância. Darwin esteve aqui em 1833:
- “Os habitantes respeitáveis do pais sempre ajudam os contraventores a escapar. Acham que eles pecaram contra o governo e não contra o povo”.
O comediante mexicano Cantinflas popularizou uma frase invejosa:
- “Os argentinos querem afundar a Argentina mas não conseguem”.
Einstein disse algo parecido quando passou por aqui em 1922:
- “Como é que um pais tão desorganizado pode progredir”?
Os espanhóis, pais da Argentina, vingavam-se deles :
- Um argentino dirigia em Madrid, avançou um sinal, o guarda o deteve:
- “Você é argentino, não é”?
– “Sou. E daí? Só os argentinos furam o sinal vermelho”?
– “Não. Mas só os argentinos fazem isso sorrindo”.
O brasileiro resumiu tudo na definição italiana :
- Compre um argentino pelo que vale e venda pelo que acha que vale.
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O MILAGRE
Na campanha eleitoral de 2003, que elegeu Nestor Kirchner, vi aqui a Argentina falida, afundada e humilhada pelo picareta Menem, que a vendeu ao FMI e aos banqueiros. Homens elegantes, de paletó e gravata, cabelos brancos bem penteados, a cabeça baixa envergonhada, oferecendo ninharias na Calle Florida, para poderem comer.
Um dos escritores mais lidos e respeitados do pais, Marcus Agnis, que já tinha sido ministro da Cultura, tentava explicar :
- “Excelente noticia é que os argentinos começam a exercer a autocrítica. A Argentina encontra-se mergulhada no sofrimento e chora como nunca ao ritmo de seu tango erótico, descarnado e cruel”.
Agora, começa nova campanha eleitoral para as eleições parlamentares do outono de 2013. Em quatro anos, aconteceu o milagre. A Argentina levantou a cabeça,deu a volta por cima e uma banana presidencial para o FMI.
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O FMI
As manchetes dos jornais diziam por que :
1. – “Papel Argentino Rendeu até 282% em 2006 – Titulos do governo com remuneração atrelada ao crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), estavam entre os mais rentáveis. – Mercado de ações e títulos privados colocou o pais entre os emergentes com ativos de maior rentabilidade.
2. – “O bom desempenho da economia do pais cresceu a taxas superiores a 8% desde 2003: em 2006, 8,5%; em 2007, continuou crescendo a mais de 8%”.
Qual o milagre? A Argentina derrotou o FMI.
A Argentina havia enquadrado e expulso o FMI (Fundo Monetario Internacional), pagando apenas 25% da Divida. O resto eram juros sobre juros, que o pais se negou a pagar. Até hoje o FMI e os banqueiros esperneiam, e a Argentina cresce este ano mais de 5% (o Brasil luta para chegar a 1%).
05 de outubro de 2012
Sebastião Nery
Três mil metros de neve e precipícios, frio de menos de 30 graus, em cima o pico de Estats como um véu de noiva, embaixo o desfiladeiro, e o carro, com correntes nos quatro pneus, deslizando devagar a madrugada inteira, à beira dos abismos, na estrada branca e mal iluminada.
Ao amanhecer, afinal, um hotel. Chamava-se Argentina. Por que Argentina, ali embaixo da França, se ele era francês e a Argentina tão longe?
- É uma homenagem ao Brasil. Morei um ano no Rio, trabalhei lá em hotéis de Ipanema e tenho muita saudade das praias e das brasileiras.
- E o que é que a Argentina tem com isso, se não é Brasil?
- É porque Argentina é a palavra mais bonita da língua portuguesa.
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A PRATA
A orgulhosa Argentina fez com que lhe pintassem um universal retrato de arrogância, geralmente injusto. Buenos Aires, o “Puerto de Nuestra Señora Santa Maria Del Bueno Aire”, foi fundada em 1536 pelo espanhol Pedro de Mendoza e refundada pelos espanhóis em 1580,onde hoje é a Plazza de Mayo.
A independência é de 1816, com San Martin, o grande heroi nacional. Passaram séculos antes de a chamarem de Argentina.
Em documentos antigos, já se falava em “civitas argentea”, depois falaram em “argentópólis” e “argyrópolis”, até que o poeta Martin del Barco Centenera criou a “definitiva, bela e melodiosa, maravilhosamente poética” palavra “Argentina”, por causa da prata encontrada com os nativos: nome de mulher, do latim “argentinus”, deus das minas de prata (em latim “argentum”, cujo adjetivo é “argentinus”).
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O JARDIM
- “Na Argentina, onde se cospe nasce uma flor”, diziam os argentinos. Os não argentinos achavam petulância. Darwin esteve aqui em 1833:
- “Os habitantes respeitáveis do pais sempre ajudam os contraventores a escapar. Acham que eles pecaram contra o governo e não contra o povo”.
O comediante mexicano Cantinflas popularizou uma frase invejosa:
- “Os argentinos querem afundar a Argentina mas não conseguem”.
Einstein disse algo parecido quando passou por aqui em 1922:
- “Como é que um pais tão desorganizado pode progredir”?
Os espanhóis, pais da Argentina, vingavam-se deles :
- Um argentino dirigia em Madrid, avançou um sinal, o guarda o deteve:
- “Você é argentino, não é”?
– “Sou. E daí? Só os argentinos furam o sinal vermelho”?
– “Não. Mas só os argentinos fazem isso sorrindo”.
O brasileiro resumiu tudo na definição italiana :
- Compre um argentino pelo que vale e venda pelo que acha que vale.
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O MILAGRE
Na campanha eleitoral de 2003, que elegeu Nestor Kirchner, vi aqui a Argentina falida, afundada e humilhada pelo picareta Menem, que a vendeu ao FMI e aos banqueiros. Homens elegantes, de paletó e gravata, cabelos brancos bem penteados, a cabeça baixa envergonhada, oferecendo ninharias na Calle Florida, para poderem comer.
Um dos escritores mais lidos e respeitados do pais, Marcus Agnis, que já tinha sido ministro da Cultura, tentava explicar :
- “Excelente noticia é que os argentinos começam a exercer a autocrítica. A Argentina encontra-se mergulhada no sofrimento e chora como nunca ao ritmo de seu tango erótico, descarnado e cruel”.
Agora, começa nova campanha eleitoral para as eleições parlamentares do outono de 2013. Em quatro anos, aconteceu o milagre. A Argentina levantou a cabeça,deu a volta por cima e uma banana presidencial para o FMI.
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O FMI
As manchetes dos jornais diziam por que :
1. – “Papel Argentino Rendeu até 282% em 2006 – Titulos do governo com remuneração atrelada ao crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), estavam entre os mais rentáveis. – Mercado de ações e títulos privados colocou o pais entre os emergentes com ativos de maior rentabilidade.
2. – “O bom desempenho da economia do pais cresceu a taxas superiores a 8% desde 2003: em 2006, 8,5%; em 2007, continuou crescendo a mais de 8%”.
Qual o milagre? A Argentina derrotou o FMI.
A Argentina havia enquadrado e expulso o FMI (Fundo Monetario Internacional), pagando apenas 25% da Divida. O resto eram juros sobre juros, que o pais se negou a pagar. Até hoje o FMI e os banqueiros esperneiam, e a Argentina cresce este ano mais de 5% (o Brasil luta para chegar a 1%).
05 de outubro de 2012
Sebastião Nery
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