"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 23 de novembro de 2012

O SORRISO E O ESGAR


A foto de Dida Sampaio é mais que o registro do momento em que Dilma Rousseff, presidente da República há quase dois anos, cumprimentou o ministro Joaquim Barbosa, que acabara de assumir a presidência do Supremo Tribunal Federal.
A imagem documenta a colisão frontal, estridentemente silenciosa, entre sentimentos antagônicos.

O chefe do Poder Judiciário está feliz. A chefe do Poder Executivo está contrafeita, nas fímbrias da amargura.

Joaquim Barbosa é o anfitrião de uma festa. Dilma Rousseff é a conviva involuntária que nada tem a festejar. Ele se sente em casa e pensa no que fará. Ela pensa no que ele anda fazendo e se sente obrigada a enviar um recado fisionômico aos condenados no julgamento do mensalão: se pudesse, estaria longe dali.

Só ele sorri. O sorriso contido informa que o ministro não é homem de exuberâncias e derramamentos. Mas é um sorriso. Os músculos faciais se distenderam, os dentes estão expostos, o movimento da pálpebra escava rugas nas cercanias do olho esquerdo.
O que se vê no rosto da presidente é um esgar. A musculatura contraída multiplica os vincos na face direita, junta os lábios num bico assimetricamente pronunciado e desvia o olhar do homem à sua frente.

O descompasso das almas é sublinhado pelas mãos que não se apertam. A dele ao menos se abre. A dela, nem isso. Dilma apenas toca Joaquim com a metade dos quatro dedos. Ele cumprimenta como quem chegou. Ela cumprimenta como quem não vê a hora de partir.

Conjugados, tais detalhes sugerem que, se Joaquim Barbosa sabe que chefia um dos três Poderes independentes, Dilma Rousseff imagina chefiar um Poder que dá ordens aos outros. O julgamento do mensalão já deixou claro que não é assim.

A maioria dos ministros é imune a esgares. Os que temem carrancas nem precisam disso para atender aos interesses do governo. Não são juízes. São companheiros.

23 de novembro de 2012
Veja

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