"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 10 de março de 2013

EQUIVOCOS E PRECONCEITOS

 

O economista e professor da UFRJ Mauro Osório, especialista em planejamento urbano e estudos sobre o Rio, diz que a percepção de que o Estado do Rio e suas municipalidades brigam por privilégios inaceitáveis está “ancorada em equívocos”, e demonstra que muitos deles têm origem em distorções de cunho político e econômico. O primeiro equívoco é o de que o estado já disporia de boa soma de recursos públicos e teria inclusive uma das maiores cargas tributárias no cenário federativo. 
Essa versão foi divulgada há alguns anos pelo Banco Mundial e pelo Ipea, mas Osório diz que, quando comparamos a carga tributária das 27 unidades federativas brasileiras, o Estado do Rio fica apenas na 21ª posição. Na versão do Ipea, as duas maiores cargas tributárias seriam a do Distrito Federal e a do Rio. Curiosamente, a capital e uma ex-capital do país.
 
“Provavelmente, relacionaram equivocadamente alguma contribuição arrecadada nessas regiões, mas diretamente direcionada ao poder federal”.
 
Reforçando a tese de que não temos privilégio tributário, ao estudarmos a receita pública municipal per capita, através de dados do Finbra/MF, vemos que, na média, a totalidade dos municípios fluminenses apresentou, no ano de 2011, uma receita pública per capita de R$ 2.160,10, contra uma receita pública per capita para a totalidade dos municípios da Região Sudeste de R$ 2.009,67.
 
Ou seja, a receita pública média dos municípios do Rio é bastante próxima à média dos municípios dos demais estados da Região Sudeste.
 
Não existe, por exemplo, uma situação de privilégio no Estado do Rio relativamente a Minas, como afirmou nos debates, no dia da votação, uma deputada federal mineira.
 
O que temos são alguns poucos municípios com privilégio do ponto de vista da receita pública. Entre os municípios com alta receita pública, principalmente advinda dos royalties, Osório cita Quissamã, Macaé e Armação dos Búzios, com receitas públicas, em 2011, de, respectivamente, R$ 10.225,11; R$ 7.296,35; e R$ 5.681,94.
 
No entanto, ressalva Mauro Osório, temos que ter claro que os privilégios em termos de receita pública entre os municípios fluminenses são a exceção e não a regra. Fazendo um ranking, por exemplo, dos municípios da Região Sudeste com maior receita pública per capita, vemos, entre os 20 primeiros colocados, Quissamã na 5ª posição, Macaé na 11ª e Búzios na 20ª.
 
Além desses municípios fluminenses, verifica-se apenas Porto Real, na 4ª posição, mas a sua forte receita pública per capita municipal advém do fato de estar instalada em seu território a Peugeot Citroën.
 
Nesse ranking, aparecem nas três primeiras posições os municípios de Presidente Kennedy (ES); São Gonçalo do Rio Abaixo (MG); e Paulínia (SP).
 
O que ocorre no Estado do Rio é uma má distribuição das receitas de royalties interna, entre os municípios, explica Osório. “Mas o estado como um todo não apresenta qualquer privilégio tributário no cenário federativo”.
 
Além disso, há diversos municípios, principalmente na periferia da Região Metropolitana do Rio, com uma receita pública per capita extremamente baixa, sendo inclusive que, em 2011, populosos municípios da periferia da Região Metropolitana — São Gonçalo, São João de Meriti, Belford Roxo e Nova Iguaçu — possuíam uma receita pública per capita inferior a R$ 1.000,00.
 
Isso ocorre, além do fato da má distribuição dos royalties internamente no Estado do Rio, principalmente, pela regra brasileira atual do Fundo de Participação dos Municípios, prejudicial aos municípios com grande densidade populacional. “Ou seja, não é razoável discutir a questão dos royalties como se eles fossem a única receita municipal e não levando em conta a necessidade de discutir também a regra atual de partição dos recursos do Fundo de Participação dos Municípios e também o dos Estados”, adverte.
 
Com relação aos municípios, ele diz que a situação é ainda mais grave, pois a maioria dos municípios fluminenses possui dependência dos royalties igual ou superior a 10% do total da receita pública municipal.
 
Entre os dez municípios mais dependentes de royalties, o quadro de dependência percentual é a seguinte: São João da Barra, 74,2%; Campos, 61,2%; Rio das Ostras, 56,5%; Casimiro de Abreu, 48,3%; Carapebus, 44,8%; Quissamã, 43,7%; Cabo Frio, 40,9%; Armação dos Búzios, 40,3%; Parati, 36%; e Silva Jardim, 35%.

10 de março de 2013
Merval Pereira, O Globo

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