"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 9 de maio de 2013

O PODER QUE SE AFASTA DO POVO

   
 
Reza a lenda que, quando era governador de Minas, Juscelino Kubitschek, quando se sentia entediado, em alguma noite mais quente, descia do palácio para dar uma volta na praça. Teria feito isso umas tantas vezes: durante sua caminhada, inevitavelmente, cruzava com as pessoas, que, como ele, preferiam a fresca noturna ao bafo dos cômodos. Também não havia como escapar dos cumprimentos, de um diálogo fortuito e mesmo das queixas no tête-à-tête.
Mas, e daí? Que mal tinha em ouvir o povo?Eram outros tempos, é verdade. Belo Horizonte tinha pouco mais de 350 mil habitantes no começo dos anos 50. Era pouco maior do que é, hoje, Rio Branco, no Acre, mas de tamanho menor do que a atual Macapá. As relações sociais também mudaram.
 
Aqueles cidadãos, integrantes de uma rede mais transparente, na qual todos os pontos se conhecem e se observam, se impeliam a ser mais ordeiros: a mera acusação de um crime tornava um pária qualquer sujeito.Pois imagine, hoje, o governador do Estado fazendo “footing” na orla da Pampulha!
 
É imaginável, sim, por que não? A sociedade é outra, fragmentou-se. Contudo, por que mudou, também, o modo de se fazer política? A “tribuna” fria e unidirecional dos meios de comunicação de massa consolidou-se como norma. E a exceção é o contato, feito de dois em dois anos, concentrado na hora de pedir voto.
 
LONGE DO POVOJusto o JK, que ironia – ainda que sob um discurso desenvolvimentista de desbravador -, levou o poder para longe do povo. Tardiamente, há três anos, o governo de Minas adotou o mesmo expediente: tirou a sede do Estado e suas secretarias do centro da capital e transplantou-se no extremo Norte da cidade.
 
Na área concentrada, cercada, às margens da rodovia, não se entra sem identificação nem razão.Agora, a Prefeitura de Belo Horizonte também almeja a migração em bloco para um centro administrativo, uma sede única e própria (o argumento de cortar a despesa com o aluguel também é bem-empregado como justificativa).
 
A coesão física dá a impressão de blindagem. Parece que o poder não gosta do povo, do qual e para o qual se exerce. Contraditório, não? Seja por segurança, por motivo financeiro ou estratégico, criaram-se, ao longo do tempo, camadas, biombos, entre o Executivo e o eleitor/contribuinte/cidadão.
 
A exemplo da estrutura hierárquica do Egito antigo, quanto mais estratos até a base inferior, mais se porta como faraó aquele que se senta no topo.A presidente da República, é notório, tem aversão a dar entrevistas à imprensa no Brasil. Se é coletiva, ocorre no exterior.
É um sintoma claro de distanciamento, especialmente para quem é do Partido dos Trabalhadores. E, por aqui, o último 21 de Abril, em Ouro Preto, teve a praça cercada: o povo foi proibido de assistir à solenidade ou se manifestar.
E Tiradentes, com a corda no pescoço, não pôde descer de seu pedestal de bronze.
 
09 de maio de 2013
João Gualberto Jr. (O Tempo)

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