Renúncia de tributos é investigada pelo Ministério Público e TCU
Em meio à onda de protestos nas ruas, com pesadas críticas aos gastos bilionários nos 12 estádios da Copa, a presidente Dilma Rousseff negou, em rede nacional, o uso de dinheiro do Orçamento da União na construção das arenas.
Dilma, porém, não fez qualquer menção à isenção fiscal concedida às construtoras.
A renúncia de tributos para a construção dos estádios já soma R$ 461,7 milhões, e passou a ser investigada pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
O MPF identificou uma manobra no cálculo do custo dos estádios, que não estava levando em conta o valor da isenção fiscal, e acionou o TCU numa tentativa de evitar prejuízos aos cofres públicos.
Em abril, o tribunal cobrou explicações do Ministério do Esporte, da Receita Federal e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), responsável pelo financiamento das obras. Até agora, o TCU não fez análise definitiva sobre as supostas irregularidades na concessão dos benefícios.
O TCU abriu processo em fevereiro para investigar o teor de uma representação elaborada pelo grupo de trabalho sobre a Copa de 2014 vinculado à Procuradoria Geral da República (PGR).
O documento, assinado pelos procuradores da República Athayde Ribeiro e José Alfredo de Paula, detalha as possíveis irregularidades no Regime Especial de Tributação para Construção, Ampliação, Reforma ou Modernização de Estádios de Futebol (Recopa), instituído em 2010.
Conforme os procuradores, o cálculo dos custos dos estádios para a Copa das Confederações e a Copa do Mundo não levou em conta a renúncia dos tributos, o que é “inadmissível”, segundo os procuradores. Eles lembram na representação que projetos já contratados poderão se beneficiar de isenção fiscal a partir de aditivos contratuais.
“A aferição do real impacto das isenções nos orçamentos das obras não está sendo adequadamente providenciada pela União. Tal omissão pode ensejar o superfaturamento das obras de construção das arenas”, cita o documento do MPF, que aponta o Ministério do Esporte, a Receita Federal e o BNDES como responsáveis pela suposta irregularidade. Os procuradores sugerem a necessidade de “reequilíbrio econômico-financeiro” dos projetos assinados antes do Recopa.
Itaquerão teve maior isenção
No curso do processo no TCU, o Ministério do Esporte informou os dados atualizados dos benefícios tributários concedidos, em documento enviado em março. O maior valor de isenção fiscal, R$ 83,3 milhões, se destina à Arena Fundo de Investimento Imobiliário, uma parceria do Corinthians com a Odebrecht para a construção da Arena Corinthians, o Estádio do Itaquerão, palco da abertura da Copa. A segunda maior concessão, R$ 62 milhões, foi feita à Andrade Gutierrez, responsável pelo Estádio Beira-Rio, em Porto Alegre.
Em entrevista ao GLOBO, o procurador José Alfredo criticou o “vácuo” existente na fiscalização dos benefícios tributários concedidos às empreiteiras responsáveis pelos estádios. Segundo ele, ainda não houve um posicionamento definitivo do TCU sobre o assunto.
— Há um jogo de empurra dos órgãos públicos. A isenção tributária é substancial, e ninguém checa, ninguém fiscaliza. O Estado tem a obrigação de checar, pois se trata de dinheiro público que deixa de entrar — disse o procurador.
José Alfredo afirmou ainda que o MPF poderá cobrar uma eventual devolução de dinheiro repassado irregularmente às empreiteiras:
— O benefício tributário é um dado relevante nessa equação e precisa ficar claro, para que não haja enriquecimento.
O TCU já determinou que o Ministério do Esporte informe o real impacto das renúncias de tributos no custo das obras dos estádios da Copa. Segundo o tribunal, a pasta ainda enviará novos dados para análise. “O ministro Valmir Campelo, relator dos processos referentes à Copa de 2014, prefere não se pronunciar neste momento, já que os números deverão ser atualizados”, diz a assessoria de imprensa do TCU.
Numa auditoria analisada em plenário em novembro de 2012, o tribunal apontou que a renúncia de tributos e a aplicação de subsídios para a concessão dos financiamentos somam mais de R$ 1 bilhão, dinheiro que deixa de entrar nos cofres da União em prol da Copa do Mundo. Naquela ocasião, a renúncia fiscal pelo Recopa era de R$ 329 milhões – já são R$ 461,7 milhões. A isenção tributária à Fifa, responsável pela Copa, era de R$ 559 milhões, conforme os dados de novembro. Os subsídios na concessão dos financiamentos, por sua vez, chegavam a R$ 189 milhões.
Ministério do Esporte reconhece falha na lei, mas nega superfaturamento
O Ministério do Esporte reconhece uma falha na legislação que instituiu os benefícios tributários para a construção dos estádios. Por meio da assessoria de imprensa, a pasta sustenta que a lei do Recopa não atribui ao Esporte “a tarefa de aferir a efetiva utilização dos insumos e dos serviços contratados”. “Mesmo porque não poderia fazê-lo, haja vista a falta de pessoal especializado e a necessária contratação de serviço de auditoria.”
O ministério compara o Recopa ao regime especial de tributação para implantação de redes de telecomunicações, instituído em 2012.
No caso deste último, ao contrário do Recopa, a lei definiu atribuições do Ministério das Comunicações no acompanhamento dos projetos, inclusive com a necessidade de informar a Receita sobre a renúncia fiscal. A pasta diz que a responsabilidade por verificar as desonerações às empreiteiras dos estádios é dos tribunais de contas dos estados.
Ainda segundo o ministério, não houve descumprimento da legislação do Recopa, nem superfaturamento.
A Pasta diz que não haverá alterações na concessão dos benefícios tributários e que o TCU e o MPF são informados periodicamente sobre os benefícios inerentes ao Recopa.
07 de julho de 2013
VINICIUS SASSIN - O Globo
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