Quem canta vantagem tem que garantir desempenho, caso contrário seu mundo desaba. Incrível a virulência dos comentários sobre a derrota de Anderson Silva para Chris Weidman porque o “Spider” teria “brincado” no ringue. E isso em todas as mídias: no Facebook, no Twitter, na grande mídia e na blogosfera.
Sem dúvida o velho ditado sobre a mulher de César continua sendo um ótimo conselho.
Mesmo sabendo que tudo aquilo não era
brincadeira e sim uma técnica psicológica que objetiva a desconcentração e a
desestabilização do adversário, porém, eu também “não perdoo” o Anderson
Silva.
Na minha opinião, seja qual for sua área de
especialização, se ela inclui disputar algo contra algum adversário, é no seu
desempenho que o profissional deve confiar, não na sabotagem do desempenho do
outro através de técnicas emocionais ou de qualquer modo alheias à habilidade
específica que está sendo medida.
Outros dirão: “na guerra só o que importa é o
resultado, você tem que agir com todas as forças e usar todos os recursos
disponíveis, ou será derrotado”. Sim, reconheço que em alguns tipos de conflito
isso pode ser verdade, dependendo do adversário. Gandhi não teria vencido Hitler
ou Stalin, simplesmente porque qualquer um dos dois o mataria assim que pusesse
as mãos nele. Quando o adversário joga pela tática da aniquilação total, ignorar
esse dado é suicídio.
No caso de um assalto, estupro, invasão de
residência, etc., igualmente: não vejo problema nenhum em olhar com cara de
espanto para o lado de trás do agressor e arrancar a jugular dele com os dentes
quando ele virar para ver o que haveria ali. Quando se luta pela sobrevivência
contra um agressor injusto, não se pode condenar esse tipo de
estratégia.
Só que o Anderson Silva é um desportista
profissional, e, se existe uma atividade que por excelência não deve usar o
vocabulário da guerra, esta é o esporte competitivo. No esporte as regras são,
ou deveriam ser, outras. Vencer não é o que importa. Vencer de modo honesto,
justo e digno é o que importa. A ética e o cavalheirismo são a essência do
esporte competitivo. Quando essa noção é desrespeitada, a reação costuma ser de
indignação. E isso é justo, muito justo.
O deboche, a provocação com intuito de
desestabilizar psicologicamente o adversário, o beijo na pesagem e as mãos na
cintura durante a luta não são ilícitos no tipo de esporte competitivo em que
Anderson Silva se especializou, mas não são percebidos como fair play, não são algo
que pareça a coisa certa a ser feita, não representam a ética que o esporte
deveria representar – e por isso muita gente desabafou sua insatisfação contra o
dez vezes campeão Anderson Silva.
Isso é sinal de que não estava contente com o
comportamento do campeão, que esperava uma postura melhor dele. É justo isso?
Não muito, no sentido em que Anderson Silva sempre foi um excelente lutador,
respeitador das regras dento e fora do ringue. Mas o episódio deixa bem claro
que a estética tem muito a ver, sim, com a ética, como já sabia o próprio Júlio
César, autor da máxima: “à mulher de César não basta ser honesta, ela também deve parecer
honesta“.
07 de julho de 2013
Arthur Golgo Lucas
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