Enquanto os parlamentares se esmeram para criar dias nacionais disto e daquilo, Supremo se adianta e preenche o ‘vácuo legal’ no país
Você já ouviu falar do Dia Nacional de Luta dos Acidentados por Fontes Radioativas? Tinha conhecimento do Dia Nacional de Valorização da Família? Talvez nunca tenha sabido — até hoje, é claro — da existência de um Dia Nacional do Suinocultor, nem tampouco de um Dia Nacional do Reggae, muito menos do Dia Nacional do Quilo. Dia Nacional do Quilo? Sim, 3 de novembro.
E, não, o segundo domingo de maio não é mais só das mães; agora é também do Buda Shakyamuni.
Mais surpreendente do que, digamos, a peculiaridade de algumas das homenagens contidas nestas datas comemorativas é saber que só no último mês de maio os senhores parlamentares brasileiros criaram nada menos do que 27 efemérides oficiais.
Além das citadas acima, o Congresso Nacional ainda incluiu no calendário oficial brasileiro o Dia Nacional do Ouvidor, o Dia Nacional das Hemoglobinopatias e o Dia Nacional de Conscientização e Incentivo ao Diagnóstico Precoce da Retinoblastoma, entre outras datas especiais, como o Dia Nacional da Umbanda — que, em tempo, cai no dia 13 de novembro.
Legislativo que não legisla
O Dia do Quilo, por exemplo, é um evento promovido pela ONG Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e pela Vida, fundada pelo sociólogo Herbet de Sousa, o Betinho, que morreu em 1997. O Dia do Quilo já fazia parte da programação da Campanha Natal sem Fome, com o objetivo de arrecadar alimentos e promover discussões sobre o problema da fome no Brasil. A data, 3 de novembro, é o dia do aniversário de Betinho, e a partir deste ano entra para o calendário nacional por iniciativa do ex-deputado Carlos Santana (PT-RJ), com a relatoria favorável do senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) e a sanção da presidente Dilma Rousseff.
E assim, com a criação de uma efeméride, a atual legislatura federal talvez tenha dado a sua maior contribuição para o combate à miséria no Brasil…
Enquanto as homenagens eleitoreiras tramitam de forma célere no Congresso Nacional e chegam aos montes na mesa de Dilma para a pronta e rápida sanção presidencial, nos últimos anos deputados e senadores assistem o Supremo Tribunal Federal se adiantar e preencher vários “vácuos legais” criados por um legislativo que não legisla, como nas questões da união civil entre homossexuais, direito de greve dos servidores e aviso prévio.
‘Compensações simbólicas’
Falando ao site Consultor Jurídico sobre as 27 datas comemorativas criadas em maio pelo Congresso Nacional, o coordenador do curso de Direito da Fundação Getulio Vargas em São Paulo, o cientista político Frederico Almeida, avalia que isso reflete a necessidade de o parlamentar justificar o voto que recebeu, nem que seja com um projeto irrelevante, como talvez o de um hipotético Dia Nacional do Esforço em Prol de Uma Profunda e Necessária Reforma Política, para fazer fumaça à inoperância que é regra no que tange aos assuntos que realmente importam para o dia a dia do povo:
“A satisfação que o deputado que não é líder pode dar ao público é encaixar emendas no orçamento, o que depende de acordos com lideranças, em um nível mais paroquial, ou dar essas compensações simbólicas, como datas comemorativas”.
Afinal, nada como uma amenidadezinha aqui e ali para escamotear a absoluta incapacidade de o Congresso Nacional ter uma rotina de trabalho em prol dos interesses da população. E assim caminha o Brasil, com seu povo bancando os salários, as despesas e que tais de uma “classe política”, por assim dizer, que se esmera para produzir “compensações simbólicas” para a a sua própria falência.
13 de junho de 2012
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