Que o
Executivo se desmoralize, faz parte da vida política. O Executivo gere a grana e
grana é o que os corruptos mais almejam. Natural que procurem água na fonte. Que
o Legislativo se desmoralize, também faz parte da vida. É o lugar das grandes
barganhas, onde um voto pode valer milhões. Mas quando o Judiciário se
desmoraliza, a nação está definitivamente doente.
O Supremo Tribunal Federal, isto é, a suprema instância da Justiça do País, em menos de um ano rasgou duas vezes a Constituição, jogando a lógica na lata de lixo e apelando a recursos poéticos, para dizer o mínimo. A primeira vez foi no ano passado, quando aprovou, com as fanfarras da imprensa, o reconhecimento da tal de união homoafetiva. A nova palavrinha designa o que antes chamávamos de homossexual. E ainda trouxe outra em seu bojo. O ministro Carlos Ayres Britto, relator do caso, pretende ter criado, por analogia, o neologismo heteroafetivo. Assim sendo, atenção à linguagem, leitor. Homossexuais não mais existem. Agora são todos homoafetivos.
Antes de ir adiante: o neologismo não tem pé nem cabeça. O componente grego da palavra – homo – nada tem a ver como homossexualismo. Homo quer dizer mesmo. A construção capenga – homoafetivo – significaria quem cultiva o mesmo afeto.
Em defesa da nova terminologia, o ministro diz que o vocábulo foi cunhado pela vez primeira na obra União Homossexual, o Preconceito e a Justiça, de autoria da desembargadora aposentada e jurista Maria Berenice Dias, consoante a seguinte passagem: “Há palavras que carregam o estigma do preconceito. Assim, o afeto a pessoa do mesmo sexo chamava-se 'homossexualismo'. Reconhecida a inconveniência do sufixo 'ismo', que está ligado a doença, passou-se a falar em 'homossexualidade', que sinaliza um determinado jeito de ser. Tal mudança, no entanto, não foi suficiente para pôr fim ao repúdio social ao amor entre iguais”.
Bem que eu desconfiava que cristianismo, catolicismo, marxismo, socialismo, espiritismo e outros ismos eram doenças, e das mais graves.
Adelante! O voto inaugural do ministro Ayres Britto está eivado de uma poesia extraordinária: “Em suma, estamos a lidar com um tipo de dissenso judicial que reflete o fato histórico de que nada incomoda mais as pessoas do que a preferência sexual alheia, quando tal preferência já não corresponde ao padrão social da heterossexualidade. É a perene postura de reação conservadora aos que, nos insondáveis domínios do afeto, soltam por inteiro as amarras desse navio chamado coração”. Só tem um detalhe: a Constituição só reconhece como entidade familiar a união entre homem e mulher:
Art. 226, § 3º. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
Da mesma forma, diz o Código Civil:
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
Mas para o STF, constituições ou códigos são papéis pintados com tinta, como diria Pessoa. Que podem ser rasgados ao sabor das ideologias. Lixe-se a Carta Magna. A modernidade exige audácia.
Em abril deste ano, o STF oficializou, por unanimidade, o racismo no país. Pela segunda vez, revogou, com a tranqüilidade dos justos, mais um artigo da Constituição Federal, ao decidir por unanimidade que o sistema de cotas nas universidades é constitucional. No caso, o art 5º, segundo o qual todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza. A partir de então, oficializa-se a prática perversa instituída por várias universidades, de considerar que negros valem mais do que um branco na hora do vestibular.
As tais de ações afirmativas tiveram certo prestígio quando surgiram. Hoje, o sistema de cotas é ilegal nos Estados Unidos. Onde surgiu. Sempre na rabeira da História, o Brasil adota hoje o que nos Estados Unidos foi jogado na famosa lata de lixo da História.
Ao arrepio de toda lógica, o STF tem rasgado serenamente a Constituição. Com o aplauso da imprensa e de grupos de pressão, para os quais respeitar leis é formalismo burguês. O STF afirma que branco é preto ou que preto é branco e ficamos por isso mesmo. Com um agravante: quando a suprema corte do país afirma que preto é branco, passa a ser crime afirmar que preto é preto. Ou branco é branco. Onde se lia homem e mulher, leia-se homem e homem, ou mulher e mulher e estamos conversados. A partir de hoje, onde se lia “todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza”, leia-se: todos são iguais perante a lei, exceto os negros, que valem mais. Simples assim.
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Cinco anos depois, o julgamento do mensalão ainda nem começou. Só vai começar dia 02 do mês que vem, e isso porque o relator do julgamento, ministro Ricardo Lewandowski, foi pressionado pela imprensa e por seus colegas de curul a apresentar seu relatório em tempo hábil, para evitar a prescrição de alguns dos crimes cometidos pelos quarenta implicados.
Conforme o tempo despendido pelo voto dos ministros, alguns réus ainda não precisam preocupar-se. Conforme a lerdeza da corte, o julgamento pode ainda ficar para o ano que vem. Dependendo das penas que eventualmente receberem, 22 dos 38 réus - entre eles o ex-ministro José Dirceu - poderão terminar o julgamento com a prescrição do crime de formação de quadrilha, o que equivale a uma absolvição. O ministro Joaquim Barbosa anuncia um voto de mais de mil páginas, que exigirá quatro dias para ser lido. Bem que o ministro podia, em nome do bem da nação, fazer um cursinho rápido de redação que lhe fornecesse noções mínimas de síntese.
Antes de ir adiante: se alguém quiser uma antevisão das sentenças, lá vai a minha. Obviamente, os réus serão punidos. A suprema corte não será surda aos anseios da opinião pública. Mas serão punições simbólicas, levinhas, certamente reversíveis em prestação de trabalhos à comunidade, e olhe lá! Se alguém espera ver José Dirceu algemado sendo conduzido ao cárcere, pode tirar seu cavalinho da chuva.
Foi cassado hoje o mandato do senador Demóstenes Torres por quebra de decoro parlamentar. A defesa do senador foi patética. Durante vários dias, proclamou sua inocência ante a perplexidade das poltronas de um plenário vazio. No memorial de sua defesa, seu advogado citou tanto Martin Luther King como Fernando Pessoa.
Que cite Martin Luther King se entende. É um canalha pedindo o apoio de outro canalha ilustre. O santo homem plagiou sua tese de doutorado e, mesmo tendo cometido este crime de lesa-academia, recebeu o Nobel da Paz em 64. Isso sem falar que desviou verbas de suas campanhas em prol da igualdade racial para orgias com profissionais do sexo. "A injustiça num lugar qualquer é uma ameaça à justiça em todo lugar", diz a frase citada de Luther King. Muito coerente que o advogado do senador corrupto invoque o apoio de um colega também corrupto.
Daí a meter Fernando Pessoa neste espúrio imbróglio, é um crime contra tudo que de melhor a humanidade produziu. Do poeta, citou: “Ergo-me da cadeira com um esforço monstruoso, mas tenho a impressão de que levo a cadeira comigo, e que é mais pesada, porque é a cadeira do subjetivismo”. Ora, que tem isto a ver com suas maracutaias?
Pessoa foi um gênio que viveu uma modesta vida de contador, sem nunca preocupar-se com fortuna ou holofotes, tanto que morreu obscuro e quase inédito. Jamais foi tentado pelos pássaros ávidos da fama nem pelo dinheiro alheio. Chamá-lo em defesa do senador é um contra-senso que pede aos céus reparação. O advogado do senador devia ser incurso em crime de lesa-poesia.
Mas não era disto que queria falar. E sim de um desejo do senador, que a meu ver desmoraliza definitivamente o STF. “Me deixem ser julgado pelo Judiciário”, manifestou Demóstenes. O senador conhece os seus. Sabe em que corte pode ser absolvido. E já no começo da noite de hoje afirmou, pelo Twitter, que vai recorrer ao STF para defender o mandato que o "povo de Goiás" lhe concedeu.
Jus non sucurrit dormientibus.
12 de julho de 2012
janer cristaldo
O Supremo Tribunal Federal, isto é, a suprema instância da Justiça do País, em menos de um ano rasgou duas vezes a Constituição, jogando a lógica na lata de lixo e apelando a recursos poéticos, para dizer o mínimo. A primeira vez foi no ano passado, quando aprovou, com as fanfarras da imprensa, o reconhecimento da tal de união homoafetiva. A nova palavrinha designa o que antes chamávamos de homossexual. E ainda trouxe outra em seu bojo. O ministro Carlos Ayres Britto, relator do caso, pretende ter criado, por analogia, o neologismo heteroafetivo. Assim sendo, atenção à linguagem, leitor. Homossexuais não mais existem. Agora são todos homoafetivos.
Antes de ir adiante: o neologismo não tem pé nem cabeça. O componente grego da palavra – homo – nada tem a ver como homossexualismo. Homo quer dizer mesmo. A construção capenga – homoafetivo – significaria quem cultiva o mesmo afeto.
Em defesa da nova terminologia, o ministro diz que o vocábulo foi cunhado pela vez primeira na obra União Homossexual, o Preconceito e a Justiça, de autoria da desembargadora aposentada e jurista Maria Berenice Dias, consoante a seguinte passagem: “Há palavras que carregam o estigma do preconceito. Assim, o afeto a pessoa do mesmo sexo chamava-se 'homossexualismo'. Reconhecida a inconveniência do sufixo 'ismo', que está ligado a doença, passou-se a falar em 'homossexualidade', que sinaliza um determinado jeito de ser. Tal mudança, no entanto, não foi suficiente para pôr fim ao repúdio social ao amor entre iguais”.
Bem que eu desconfiava que cristianismo, catolicismo, marxismo, socialismo, espiritismo e outros ismos eram doenças, e das mais graves.
Adelante! O voto inaugural do ministro Ayres Britto está eivado de uma poesia extraordinária: “Em suma, estamos a lidar com um tipo de dissenso judicial que reflete o fato histórico de que nada incomoda mais as pessoas do que a preferência sexual alheia, quando tal preferência já não corresponde ao padrão social da heterossexualidade. É a perene postura de reação conservadora aos que, nos insondáveis domínios do afeto, soltam por inteiro as amarras desse navio chamado coração”. Só tem um detalhe: a Constituição só reconhece como entidade familiar a união entre homem e mulher:
Art. 226, § 3º. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
Da mesma forma, diz o Código Civil:
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
Mas para o STF, constituições ou códigos são papéis pintados com tinta, como diria Pessoa. Que podem ser rasgados ao sabor das ideologias. Lixe-se a Carta Magna. A modernidade exige audácia.
Em abril deste ano, o STF oficializou, por unanimidade, o racismo no país. Pela segunda vez, revogou, com a tranqüilidade dos justos, mais um artigo da Constituição Federal, ao decidir por unanimidade que o sistema de cotas nas universidades é constitucional. No caso, o art 5º, segundo o qual todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza. A partir de então, oficializa-se a prática perversa instituída por várias universidades, de considerar que negros valem mais do que um branco na hora do vestibular.
As tais de ações afirmativas tiveram certo prestígio quando surgiram. Hoje, o sistema de cotas é ilegal nos Estados Unidos. Onde surgiu. Sempre na rabeira da História, o Brasil adota hoje o que nos Estados Unidos foi jogado na famosa lata de lixo da História.
Ao arrepio de toda lógica, o STF tem rasgado serenamente a Constituição. Com o aplauso da imprensa e de grupos de pressão, para os quais respeitar leis é formalismo burguês. O STF afirma que branco é preto ou que preto é branco e ficamos por isso mesmo. Com um agravante: quando a suprema corte do país afirma que preto é branco, passa a ser crime afirmar que preto é preto. Ou branco é branco. Onde se lia homem e mulher, leia-se homem e homem, ou mulher e mulher e estamos conversados. A partir de hoje, onde se lia “todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza”, leia-se: todos são iguais perante a lei, exceto os negros, que valem mais. Simples assim.
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Cinco anos depois, o julgamento do mensalão ainda nem começou. Só vai começar dia 02 do mês que vem, e isso porque o relator do julgamento, ministro Ricardo Lewandowski, foi pressionado pela imprensa e por seus colegas de curul a apresentar seu relatório em tempo hábil, para evitar a prescrição de alguns dos crimes cometidos pelos quarenta implicados.
Conforme o tempo despendido pelo voto dos ministros, alguns réus ainda não precisam preocupar-se. Conforme a lerdeza da corte, o julgamento pode ainda ficar para o ano que vem. Dependendo das penas que eventualmente receberem, 22 dos 38 réus - entre eles o ex-ministro José Dirceu - poderão terminar o julgamento com a prescrição do crime de formação de quadrilha, o que equivale a uma absolvição. O ministro Joaquim Barbosa anuncia um voto de mais de mil páginas, que exigirá quatro dias para ser lido. Bem que o ministro podia, em nome do bem da nação, fazer um cursinho rápido de redação que lhe fornecesse noções mínimas de síntese.
Antes de ir adiante: se alguém quiser uma antevisão das sentenças, lá vai a minha. Obviamente, os réus serão punidos. A suprema corte não será surda aos anseios da opinião pública. Mas serão punições simbólicas, levinhas, certamente reversíveis em prestação de trabalhos à comunidade, e olhe lá! Se alguém espera ver José Dirceu algemado sendo conduzido ao cárcere, pode tirar seu cavalinho da chuva.
Foi cassado hoje o mandato do senador Demóstenes Torres por quebra de decoro parlamentar. A defesa do senador foi patética. Durante vários dias, proclamou sua inocência ante a perplexidade das poltronas de um plenário vazio. No memorial de sua defesa, seu advogado citou tanto Martin Luther King como Fernando Pessoa.
Que cite Martin Luther King se entende. É um canalha pedindo o apoio de outro canalha ilustre. O santo homem plagiou sua tese de doutorado e, mesmo tendo cometido este crime de lesa-academia, recebeu o Nobel da Paz em 64. Isso sem falar que desviou verbas de suas campanhas em prol da igualdade racial para orgias com profissionais do sexo. "A injustiça num lugar qualquer é uma ameaça à justiça em todo lugar", diz a frase citada de Luther King. Muito coerente que o advogado do senador corrupto invoque o apoio de um colega também corrupto.
Daí a meter Fernando Pessoa neste espúrio imbróglio, é um crime contra tudo que de melhor a humanidade produziu. Do poeta, citou: “Ergo-me da cadeira com um esforço monstruoso, mas tenho a impressão de que levo a cadeira comigo, e que é mais pesada, porque é a cadeira do subjetivismo”. Ora, que tem isto a ver com suas maracutaias?
Pessoa foi um gênio que viveu uma modesta vida de contador, sem nunca preocupar-se com fortuna ou holofotes, tanto que morreu obscuro e quase inédito. Jamais foi tentado pelos pássaros ávidos da fama nem pelo dinheiro alheio. Chamá-lo em defesa do senador é um contra-senso que pede aos céus reparação. O advogado do senador devia ser incurso em crime de lesa-poesia.
Mas não era disto que queria falar. E sim de um desejo do senador, que a meu ver desmoraliza definitivamente o STF. “Me deixem ser julgado pelo Judiciário”, manifestou Demóstenes. O senador conhece os seus. Sabe em que corte pode ser absolvido. E já no começo da noite de hoje afirmou, pelo Twitter, que vai recorrer ao STF para defender o mandato que o "povo de Goiás" lhe concedeu.
Jus non sucurrit dormientibus.
12 de julho de 2012
janer cristaldo
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