"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 12 de julho de 2012

HISTÓRIAS DO JORNALISTA SEBASTIÃO NERY

VITAMINAS DO PODER

Quando Juscelino, em 1959, depois de romper com o Fundo Monetário Internacional (FMI), estava fazendo a reforma do ministério, Horácio Lafer teve um enfarte e foi internado no Hospital dos Servidores do Estado, no Rio. JK foi visitá-lo e o encontrou todo cheio de fios, numa tenda de oxigênio.

- Horácio, vim aqui visitá-lo e dizer a você, em homenagem a D. Mimi, que resolvi poupá-lo. Você seria meu ministro do Exterior, mas fique tranqüilo que não exigirei esse esforço de você.
Lafer, os olhos de repente iluminados, chamou a mulher, arrancou aqueles fios todos e sentou-se na cama:

- Juscelino, você está enganado. Eu não estou morrendo não. Estou apenas fazendo um check-up.

Aceito o convite e vou assumir o ministério.
Ficou bom, assumiu e viveu mais seis anos. Foi a vitamina do poder.

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COELHO DA PÁSCOA

Nos primeiros dias de abril de 64 o “Comando Revolucionário “mandou a São Paulo, em um fim de semana, os coronéis Martinelli e Igrejas, líderes da chamada “linha dura”, para exigirem do governador Ademar de Barros a reforma total do secretariado. Ademar, ainda mais matreiro do que gordo, imaginou sair de banda:

- Quer dizer que é para trocar alguns auxiliares, não, coronéis?
- Alguns, não, governador, todos.
- Mas todos, como? Eles são revolucionários da primeira hora. De quem é mesmo a recomendação?
- É do Alto Comando, governador. E não é recomendação, é ordem.

Ademar mudou de tom:

- Quanto os senhores ganham, coronéis? A vida está cara, muito difícil, o Jango inflacionou tudo, os militares estão sacrificados, não e’?
- Isto é problema nosso, governador. O assunto é outro.

Ademar puxou uma gaveta, tirou dois envelopes cheinhos de notas de mil cruzeiros e sorriu:

- Posso dar-lhes um presente, coronéis?

Martinelli, vermelho, apoplético, levantou-se aos gritos, indignado, querendo dar um murro no governador. Igrejas segurou-o e caiu numa gargalhada nervosa. Ademar passou a mão na barriga:

- Perdão, senhores, há um equívoco. Não estou querendo comprar ninguém. Será que a gente não pode mais nem dar um coelhinho de Páscoa?

Era um domingo de Páscoa, Ademar conhecia outras vitaminas do poder, mas errou na dose.

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