Fundado por José Dirceu durante o congresso de uma certa União da Juventude Socialista, o Movimento Popular pela Impunidade dos Companheiros Pecadores demorou exatamente um mês para festejar a aparição do primeiro batalhão de voluntários. Formada por combatentes recrutados na Central Única dos Trabalhadores, dispostos a tudo para livrar da cadeia o bando do mensalão, a tropa é comandada pelo bancário Vagner Freitas, novo presidente da CUT, que melhorou o humor do guerrilheiro de festim com a entrevista concedida à Folha de S. Paulo.
“Todos sabem que esse julgamento é uma batalha política”, viajou José Dirceu em 9 de junho. “O julgamento não pode ser político”, concordou Vagner Freitas em 9 de julho. “Essa batalha deve ser travada nas ruas também, com a mobilização das forças progressistas e dos movimentos populares, porque senão a gente só vai ouvir uma voz, a voz pedindo a condenação, mesmo sem provas”, viajou Dirceu em 9 de junho. “Se o julgamento não for técnico, nós questionaremos, iremos para a rua, porque a CUT não vai ficar olhando”, concordou Freitas em 9 de julho.
Como as “forças progressistas e movimentos populares” que só Dirceu enxerga, o batalhão de sindicalistas, por enquanto, só existe na cabeça de Freitas. E é provável que nunca saia de lá. Sem as duplas sertanejas, o oceano de tubaína e sanduíches de mortadela em quantidade suficiente para alimentar um Sudão, manifestações convocadas pela CUT juntam menos gente que quermesse de vilarejo. No dia 29 de junho, por exemplo, a entidade tentou vitaminar a candidatura de Fernando Haddad com um ato de protesto contra as carências do transporte público em São Paulo. Atenderam à convocação pouco mais de 2 mil militantes.
“Se eu ficar dez minutos batendo lata no Viaduto do Chá, reúno cinco mil pessoas”, dizia Jânio Quadros. A maior metrópole da América Latina tem público para tudo ─ até para malucos espancando bumbos de alumínio. Mas vai ficando cada vez mais complicado encontrar espectadores para as óperas bufas encenadas por velhacos que, tão dependentes da mesada do governo quanto a pelegagem que desancavam no século passado, não renunciam à pose de fundadores do sindicalismo moderno.
O raquitismo das plateias contrasta com a arrogância da turma no palanque e, sobretudo, escancara o abismo escavado entre o discurso oportunista dos líderes e os reais interesses dos supostos liderados. Pelo que dizem os dirigentes, os trabalhadores filiados à CUT têm no momento uma só preocupação e um único pleito: insones desde que souberam que o julgamento vai começar em 2 de agosto, sonham acordados com a absolvição dos réus. O resto é o resto.
A paralisação das universidades federais, as greves que se alastram por mais de 20 categorias do funcionalismo público, os solavancos da inflação, o emagrecimento da indústria, o PIB anêmico ─ tudo isso pode esperar. O que importa é obrigar o STF a inocentar os mensaleiros. Para tanto, é fundamental que o julgamento seja “técnico”. “Minha expectativa é que os ministros do Supremo Tribunal Federal julguem segundo os autos”, declamou nesta terça-feira o inevitável Rui Falcão. “E julgando segundo os autos não há base para condenação”, delirou de novo o presidente do PT.
A versão governista da história, diria Stanislaw Ponte Preta, já descambou para o perigoso terreno da galhofa. Investigações realizadas pela Polícia Federal e por uma CPI ergueram um himalaia de provas. A devastadora denúncia encaminhada ao STF pelo procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza foi encampada pelo Supremo. O processo tem quase 70 mil páginas. Mas a tribo dos cínicos não tem compromisso com o real: sem ficar ruborizada, réus e comparsas juram que o mensalão não existiu.
“O que houve foi uma tentativa de golpe contra o meu governo, tramada pela oposição com o apoio de setores da mídia”, mentiu Lula quatro anos depois do desbaramento da quadrilha. O principal beneficiário das bandalheiras deve a permanência no Palácio do Planalto à tibieza e à miopia política da oposição, que não se animou a apresentar o pedido de impeachment. Embora não leia, sabe que a imprensa independente contou a verdade. E está pronta para noticiar a história do golpe se Lula identificar ao menos os líderes da conspiração que inventou.
A mentira é declamada de meia em meia hora pelo chefe da seita ou algum devoto. “O que houve foi uma tentativa de golpe contra o presidente Lula”, repetiu nesta segunda-feira o eletricitário Artur Henrique, de saída da presidência da CUT. Ainda indignado com a destituição do companheiro Fernando Lugo, ele lembrou que “esse ataque à democracia pode acontecer no Brasil”. E formulou as perguntas tremendas: “Ou não foi isso que tentaram neste país em 2005?. Ou não tentaram depor e derrubar o presidente Lula com o apoio da imprensa?”
CONVERSA DE VIGARISTA
Se acredita nisso, Artur Henrique precisa comunicar urgentemente a Dilma Rousseff que está ameaçada de despejo do gabinete presidencial por um grupo de conspiradores que junta ministros do Supremo, dois procuradores-gerais da República, FHC e, claro, a mídia reacionária. O ex-ministro Márcio Thomaz também acha que é preciso prender a liberdade de imprensa. “A mídia tomou partido nesse caso e faz publicidade opressiva”, descobriu o ex-ministro da Justiça que prospera colecionando sentenças injustas.
Essa conversa de vigarista foi longe demais, advertem os brasileiros decentes. Como em qualquer julgamento, os ministros do STF devem decidir amparados nos autos. Lá estão as incontáveis provas dos crimes. Lá está a radiografia da quadrilha composta por figurões federais, parlamentares alugados, ministros bandalhos e empresários canalhas.
Quem sempre sonhou com um julgamento político foi Lula. Nestes seis meses, o estadista de eleição municipal andou visitando ministros que nomeou para comunicar que perdoar os pecadores companheiros seria uma bem-vinda demonstração de gratidão. Só soube agora que acrobacias malandras inverteram o sentido das palavras. Se inocentar os réus, o STF terá feito um julgamento técnico. Se optar pela condenação, terá promovido um julgamento político.
O acervo de espantos da Era Lula inclui um presidente que não sabe escrever e nunca leu um livro, uma presidente incapaz de dizer coisa com coisa, um senador que revogou o irrevogável, um ministro da Fazenda especializado no estupro de sigilo bancário e em assessorias de araque, um trem-bala que só apita no PAC, um ministro da Indústria que quebrou uma fábrica de tubaína com dois ou três conselhos, um ministro da Pesca que não sabe colocar minhoca em anzol, um ministro da Educação que acha certo falar errado, um advogado que virou ministro do STF depois de reprovado em dois concursos para o ingresso na magistratura e, entre tantas outras esquisitices, a única central sindical do mundo que se proclama única embora existam mais cinco.
Se tiver algum juízo, a CUT esquecerá a ideia de ampliar a coleção de assombros com o o primeiro movimento da história assumidamente a favor dos corruptos. Qualquer entidade pode discordar de uma decisão do STF. Nenhuma pode negar-se a respeitá-la, sob pena de virar um caso de polícia intolerável. Se for consumada a afronta inverossímil, a confederação sindical subordinada ao PT se transformará numa organização fora da lei em guerra contra o Estado de Direito.
Nada que uma boa cadeia não resolva.
12 de julho de 2012
Augusto Nunes
“Todos sabem que esse julgamento é uma batalha política”, viajou José Dirceu em 9 de junho. “O julgamento não pode ser político”, concordou Vagner Freitas em 9 de julho. “Essa batalha deve ser travada nas ruas também, com a mobilização das forças progressistas e dos movimentos populares, porque senão a gente só vai ouvir uma voz, a voz pedindo a condenação, mesmo sem provas”, viajou Dirceu em 9 de junho. “Se o julgamento não for técnico, nós questionaremos, iremos para a rua, porque a CUT não vai ficar olhando”, concordou Freitas em 9 de julho.
Como as “forças progressistas e movimentos populares” que só Dirceu enxerga, o batalhão de sindicalistas, por enquanto, só existe na cabeça de Freitas. E é provável que nunca saia de lá. Sem as duplas sertanejas, o oceano de tubaína e sanduíches de mortadela em quantidade suficiente para alimentar um Sudão, manifestações convocadas pela CUT juntam menos gente que quermesse de vilarejo. No dia 29 de junho, por exemplo, a entidade tentou vitaminar a candidatura de Fernando Haddad com um ato de protesto contra as carências do transporte público em São Paulo. Atenderam à convocação pouco mais de 2 mil militantes.
“Se eu ficar dez minutos batendo lata no Viaduto do Chá, reúno cinco mil pessoas”, dizia Jânio Quadros. A maior metrópole da América Latina tem público para tudo ─ até para malucos espancando bumbos de alumínio. Mas vai ficando cada vez mais complicado encontrar espectadores para as óperas bufas encenadas por velhacos que, tão dependentes da mesada do governo quanto a pelegagem que desancavam no século passado, não renunciam à pose de fundadores do sindicalismo moderno.
O raquitismo das plateias contrasta com a arrogância da turma no palanque e, sobretudo, escancara o abismo escavado entre o discurso oportunista dos líderes e os reais interesses dos supostos liderados. Pelo que dizem os dirigentes, os trabalhadores filiados à CUT têm no momento uma só preocupação e um único pleito: insones desde que souberam que o julgamento vai começar em 2 de agosto, sonham acordados com a absolvição dos réus. O resto é o resto.
A paralisação das universidades federais, as greves que se alastram por mais de 20 categorias do funcionalismo público, os solavancos da inflação, o emagrecimento da indústria, o PIB anêmico ─ tudo isso pode esperar. O que importa é obrigar o STF a inocentar os mensaleiros. Para tanto, é fundamental que o julgamento seja “técnico”. “Minha expectativa é que os ministros do Supremo Tribunal Federal julguem segundo os autos”, declamou nesta terça-feira o inevitável Rui Falcão. “E julgando segundo os autos não há base para condenação”, delirou de novo o presidente do PT.
A versão governista da história, diria Stanislaw Ponte Preta, já descambou para o perigoso terreno da galhofa. Investigações realizadas pela Polícia Federal e por uma CPI ergueram um himalaia de provas. A devastadora denúncia encaminhada ao STF pelo procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza foi encampada pelo Supremo. O processo tem quase 70 mil páginas. Mas a tribo dos cínicos não tem compromisso com o real: sem ficar ruborizada, réus e comparsas juram que o mensalão não existiu.
“O que houve foi uma tentativa de golpe contra o meu governo, tramada pela oposição com o apoio de setores da mídia”, mentiu Lula quatro anos depois do desbaramento da quadrilha. O principal beneficiário das bandalheiras deve a permanência no Palácio do Planalto à tibieza e à miopia política da oposição, que não se animou a apresentar o pedido de impeachment. Embora não leia, sabe que a imprensa independente contou a verdade. E está pronta para noticiar a história do golpe se Lula identificar ao menos os líderes da conspiração que inventou.
A mentira é declamada de meia em meia hora pelo chefe da seita ou algum devoto. “O que houve foi uma tentativa de golpe contra o presidente Lula”, repetiu nesta segunda-feira o eletricitário Artur Henrique, de saída da presidência da CUT. Ainda indignado com a destituição do companheiro Fernando Lugo, ele lembrou que “esse ataque à democracia pode acontecer no Brasil”. E formulou as perguntas tremendas: “Ou não foi isso que tentaram neste país em 2005?. Ou não tentaram depor e derrubar o presidente Lula com o apoio da imprensa?”
CONVERSA DE VIGARISTA
Se acredita nisso, Artur Henrique precisa comunicar urgentemente a Dilma Rousseff que está ameaçada de despejo do gabinete presidencial por um grupo de conspiradores que junta ministros do Supremo, dois procuradores-gerais da República, FHC e, claro, a mídia reacionária. O ex-ministro Márcio Thomaz também acha que é preciso prender a liberdade de imprensa. “A mídia tomou partido nesse caso e faz publicidade opressiva”, descobriu o ex-ministro da Justiça que prospera colecionando sentenças injustas.
Essa conversa de vigarista foi longe demais, advertem os brasileiros decentes. Como em qualquer julgamento, os ministros do STF devem decidir amparados nos autos. Lá estão as incontáveis provas dos crimes. Lá está a radiografia da quadrilha composta por figurões federais, parlamentares alugados, ministros bandalhos e empresários canalhas.
Quem sempre sonhou com um julgamento político foi Lula. Nestes seis meses, o estadista de eleição municipal andou visitando ministros que nomeou para comunicar que perdoar os pecadores companheiros seria uma bem-vinda demonstração de gratidão. Só soube agora que acrobacias malandras inverteram o sentido das palavras. Se inocentar os réus, o STF terá feito um julgamento técnico. Se optar pela condenação, terá promovido um julgamento político.
O acervo de espantos da Era Lula inclui um presidente que não sabe escrever e nunca leu um livro, uma presidente incapaz de dizer coisa com coisa, um senador que revogou o irrevogável, um ministro da Fazenda especializado no estupro de sigilo bancário e em assessorias de araque, um trem-bala que só apita no PAC, um ministro da Indústria que quebrou uma fábrica de tubaína com dois ou três conselhos, um ministro da Pesca que não sabe colocar minhoca em anzol, um ministro da Educação que acha certo falar errado, um advogado que virou ministro do STF depois de reprovado em dois concursos para o ingresso na magistratura e, entre tantas outras esquisitices, a única central sindical do mundo que se proclama única embora existam mais cinco.
Se tiver algum juízo, a CUT esquecerá a ideia de ampliar a coleção de assombros com o o primeiro movimento da história assumidamente a favor dos corruptos. Qualquer entidade pode discordar de uma decisão do STF. Nenhuma pode negar-se a respeitá-la, sob pena de virar um caso de polícia intolerável. Se for consumada a afronta inverossímil, a confederação sindical subordinada ao PT se transformará numa organização fora da lei em guerra contra o Estado de Direito.
Nada que uma boa cadeia não resolva.
12 de julho de 2012
Augusto Nunes
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