Helio Fernandes mostra como lobistas e despachantes de luxo perpetuam a miséria do povo
Helio Fernandes
Por sugestão do comentarista Carlos Cazé, que enviou o texto, e por cortesia da comentarista Viviane Ramos, que digitou a matéria, vamos republicar hoje mais um memorável artigo de Helio Fernandes, publicado em 1995, no tempo da Tribuna da Imprensa, quando Fernando Henrique Cardoso ainda estava na Presidência, antes da privatização da Vale.
Notem que o artigo continua atual.
Matérias de denúncias como esta demonstram por que Helio Fernandes é considerado o maior jornalista do país. Puxa, que falta ele nos faz!
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O PARADOXO DO BELÍNDIA
O paradoxo da Belíndia (país riquíssimo em minérios e terras férteis, ondem vivem alguns “bolsões” e milionários, cercados por um povo paupérrimo e faminto) se explica pela perversa transferência de renda, das atividades diretamente produtivas, que criam empregos e pagam salários a milhares de trabalhadores, como a agricultura e a indústria, para os setores intermediários não produtivos, como bancos, corretoras, “promoters”, e especuladores de toda ordem. Essa transferência de renda se processa por meio dos mecanismos de rolagem das “dívidas” externa e interna.
Sobre a “dívida externa”, já escrevi dezenas de artigos, demonstrando sua ilegitimidade, principalmente pelo fato de ter sido contraída por governos desprovidos de mandato constitucional. E por suas dimensões, que chegaram a níveis absurdos, por força de juros flutuantes, que podiam ser elevados ao bel-prazer dos “banqueiros-exploradores”.
Só durante o “Governo” Sarney, pagamos mais de 100 bilhões de dólares, a título de juros dessa “dívida”. Não obstante, no mesmo período, a “dívida” subiu de 110, para 130 bilhões de dólares. Atualmente (em 1995), estamos pagando, anualmente, mais de 13 bilhões de dólares só de juros da “dívida externa”.
Apesar de FHC e Malan (então, respectivamente, ministro da Fazenda e presidente do Banco Central) terem, na campanha, enganado os eleitores, com declarações de que “a dívida tinha sido renegociada em condições vantajosíssimas para o Brasil” e que “nos próximos anos, não pagaremos nada”.
Quanto à chamada “dívida interna”, sua rolagem é uma das mais monstruosas injustiças sociais de que se tem notícia, em qualquer época e em qualquer país.
Trata-se do “refinanciamento” de “dívidas” contraídas por governantes corruptos, em geral para construir obras superorçadas, quase sempre prematuras, quando não totalmente supérfluas ou desnecessárias. E o pior é que esse “refinanciamento” é feito a juros extorsivos, que nunca encontraram paralelo em parte alguma.
Usando os mais cínicos argumento
s, os ministros da Fazenda, presidentes do Banco Central e demais autoridades da área econômica, defendem os juros extorsivos, como “instrumento essencial para manter a inflação “sob controle”.
Falam também que “precisam dos juros altos para INIBIR o consumo”. Mistificam a opinião pública, cometem crime de traição, pois o mercado consumidor interno é a melhor e a mais eficiente forma de desenvolvimento.
Nenhum país pode crescer sem ter um poderoso mercado consumidor interno.
Não precisamos recuar muito no tempo para encontrar três notórios “ministros da Fazenda”, rigorosamente engajados com os interesses de seus patrões, banqueiros ou empreiteiros.
1º – Maílson “Simbrega” da Nóbrega. Passou toda a sua “gestão” no Ministério da Fazenda, como teleguiado da FIESP e da Febraban. Graças a isso, conquistou prestígio junto ao “empresariado-de-papel”, que vive de privilégios do Banco Central, do BNDES e do Banco do Brasil.
Quando saiu do “Governo” Sarney, abriu um escritório de “consultoria” em São Paulo, que, na verdade, é um escritório de lobby e informações governamentais privilegiadas, que vai indo muito bem. E irá ainda melhor quando seu sócio, Gustavo Loyola, começar a dar as cartas no Banco Central.
2º – Marcílio Marques Moreira da Silva, que toda vida foi “assessor-carregador-de-pasta” de Walter Moreira Salles. Esse tinha muito prestígio com Tancredo.
Graças a isso, Marcílio foi nomeado “embaixador” em Washington e depois “ministro” da Fazenda. Agora ele é “abridor-de-portas” da corretora Merril-Lynch no Brasil. E quer “privatizar-doar” a Vale do Rio Doce e a Petrobras, para que seus patrões o mantenham no cargo.
3º – Eliseu Rezende, que, depois de ter sido diretor geral do DNER (no tempo de Andreazza, lembram-se?), e “ministro” dos Transportes do General Figueiredo, passou a ser “alto executivo” do Grupo Odebrecht.
Nessa função, “ajudou” muito a campanha de Collor em Minas Gerais. Essa ajuda serviu também para eleger o vice-presidente Itamar Franco. O qual, como homem honrado e leal que é, ao assumir a Presidência, viu-se quase na obrigação de retribuir-lhe a ajuda.
E convidou-o para o Ministério da Fazenda. Mas, justamente por ser honrado, demitiu-o poucos meses depois, quando ficaram claras as ligações do “ministro” com a Odebrecht. De volta ao setor privado, Eliseu agora trabalha 24 horas por dia pelas “privatizações-doações”.
Em suma: a chave do que se chama de Belíndia é essa ligação permanente dos homens da área econômica, que ficam pulando do governo para a iniciativa privada, da iniciativa privada para os governos.
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SERVINDO A UM LADO E AO OUTRO
Examinem a lista abaixo, e constatem a “alternância” de todos de um lado para o outro.
1 – Elmo de Araújo Camões – É o exemplo clássico de relação promíscua entre o Banco Central (BC) e o setor privado. Quando as bolsas estouraram, em 1989, por conta do Caso Nahas, sua distribuidora, a Capitânea, era o pivô do escândalo. Ele era presidente do BC e amigo do então presidente da República, José Sarney.
2 – Keyler Carvalho Rocha – Era diretor do BC na gestão de Camões. A CVM chegou a investigar suas operações.
3 – José Luiz Miranda – Foi para o Banco Interatlântico, depois de sair do BC.
4 – Alkimar Moura – Deixou a Diretoria da Dívida Pública para dirigir uma distribuidora, ligada ao grupo Pirelli. Volta ao banco, em 1993, ocupando a mesma função.
5 – Claudio Haddad – Virou sócio do Banco Garantia, cujo grupo controla a Brahma e a Lojas Americanas.
6 – Carlos Brandão – Integrante do conselho de administração do Banco Econômico.
7 – Fernão Bracher – Dono do Banco BBA.
8 – Luiz Carlos Mendonça de Barros – Foi diretor no Plano Cruzado, em 1986. É sócio do Banco Matrix.
9 – Pérsio Arida – Também foi diretor durante o Cruzado. De lá rumou ao Unibanco. É presidente demissionário do BC.
10 – Geraldo Langoni – Foi presidente do Banco Central. Atualmente é diretor do Instituto de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas. Usa o prestígio da Instituição para atuar como “promoter” do Grupo Rotschild, um dos maiores exploradores do Brasil em todos os tempos. É um dos maiores defensores da “privatização-doação”.
11 – André Lara Resende – É sócio do Banco Matrix, que teve um bom desempenho em 1994. O Banco Matrix teve um lucro de 100 milhões de dólares, em 1994.
12 – Antônio Carlos Lemgruber – É diretor do Banco Liberal. Presidiu o BC no início do governo Sarney.
13 – José Julio Senna – É diretor do Banco Graphus, depois de passagens pelo Boavista e pelo Banco da Bahia.
14 – Roberto Castelo Branco – Trabalha no Interatlântico.
15 – Luís Eduardo de Assis – Da diretoria de Política Monetária, no governo Collor, pulou para o Citibank, o maior credor externo do país.
16 – Pedro Bodin – Largou o governo para aterrissar no Icatu, da família Almeida Braga.
17 – Francisco Pinto – Foi executivo do Banco da Bahia de Investimentos.
18 – Armínio Fraga Neto – É um dos mais influentes executivos do especulador húngaro Georges Soros. Ganhou o emprego após ser diretor da Área Internacional do BC. Já trabalhou no Garantia e na corretora americana Salomon Brothers. Está cotadíssimo para retornar ao governo.
19 – Francisco Gros – Deixou a presidência do BC para ser executivo do banco americano Morgan Stanley. Antes, vendeu suas ações no Banco BFC. O Morgan Stanley é um dos maiores interessados nas “privatizações-doações”. Trabalhou com o gângster Sami Khon e foi pela segunda vez presidente do Banco Central.
Notem que o artigo continua atual.
Matérias de denúncias como esta demonstram por que Helio Fernandes é considerado o maior jornalista do país. Puxa, que falta ele nos faz!
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O PARADOXO DO BELÍNDIA
O paradoxo da Belíndia (país riquíssimo em minérios e terras férteis, ondem vivem alguns “bolsões” e milionários, cercados por um povo paupérrimo e faminto) se explica pela perversa transferência de renda, das atividades diretamente produtivas, que criam empregos e pagam salários a milhares de trabalhadores, como a agricultura e a indústria, para os setores intermediários não produtivos, como bancos, corretoras, “promoters”, e especuladores de toda ordem. Essa transferência de renda se processa por meio dos mecanismos de rolagem das “dívidas” externa e interna.
Sobre a “dívida externa”, já escrevi dezenas de artigos, demonstrando sua ilegitimidade, principalmente pelo fato de ter sido contraída por governos desprovidos de mandato constitucional. E por suas dimensões, que chegaram a níveis absurdos, por força de juros flutuantes, que podiam ser elevados ao bel-prazer dos “banqueiros-exploradores”.
Só durante o “Governo” Sarney, pagamos mais de 100 bilhões de dólares, a título de juros dessa “dívida”. Não obstante, no mesmo período, a “dívida” subiu de 110, para 130 bilhões de dólares. Atualmente (em 1995), estamos pagando, anualmente, mais de 13 bilhões de dólares só de juros da “dívida externa”.
Apesar de FHC e Malan (então, respectivamente, ministro da Fazenda e presidente do Banco Central) terem, na campanha, enganado os eleitores, com declarações de que “a dívida tinha sido renegociada em condições vantajosíssimas para o Brasil” e que “nos próximos anos, não pagaremos nada”.
Quanto à chamada “dívida interna”, sua rolagem é uma das mais monstruosas injustiças sociais de que se tem notícia, em qualquer época e em qualquer país.
Trata-se do “refinanciamento” de “dívidas” contraídas por governantes corruptos, em geral para construir obras superorçadas, quase sempre prematuras, quando não totalmente supérfluas ou desnecessárias. E o pior é que esse “refinanciamento” é feito a juros extorsivos, que nunca encontraram paralelo em parte alguma.
Usando os mais cínicos argumento
s, os ministros da Fazenda, presidentes do Banco Central e demais autoridades da área econômica, defendem os juros extorsivos, como “instrumento essencial para manter a inflação “sob controle”.
Falam também que “precisam dos juros altos para INIBIR o consumo”. Mistificam a opinião pública, cometem crime de traição, pois o mercado consumidor interno é a melhor e a mais eficiente forma de desenvolvimento.
Nenhum país pode crescer sem ter um poderoso mercado consumidor interno.
Não precisamos recuar muito no tempo para encontrar três notórios “ministros da Fazenda”, rigorosamente engajados com os interesses de seus patrões, banqueiros ou empreiteiros.
1º – Maílson “Simbrega” da Nóbrega. Passou toda a sua “gestão” no Ministério da Fazenda, como teleguiado da FIESP e da Febraban. Graças a isso, conquistou prestígio junto ao “empresariado-de-papel”, que vive de privilégios do Banco Central, do BNDES e do Banco do Brasil.
Quando saiu do “Governo” Sarney, abriu um escritório de “consultoria” em São Paulo, que, na verdade, é um escritório de lobby e informações governamentais privilegiadas, que vai indo muito bem. E irá ainda melhor quando seu sócio, Gustavo Loyola, começar a dar as cartas no Banco Central.
2º – Marcílio Marques Moreira da Silva, que toda vida foi “assessor-carregador-de-pasta” de Walter Moreira Salles. Esse tinha muito prestígio com Tancredo.
Graças a isso, Marcílio foi nomeado “embaixador” em Washington e depois “ministro” da Fazenda. Agora ele é “abridor-de-portas” da corretora Merril-Lynch no Brasil. E quer “privatizar-doar” a Vale do Rio Doce e a Petrobras, para que seus patrões o mantenham no cargo.
3º – Eliseu Rezende, que, depois de ter sido diretor geral do DNER (no tempo de Andreazza, lembram-se?), e “ministro” dos Transportes do General Figueiredo, passou a ser “alto executivo” do Grupo Odebrecht.
Nessa função, “ajudou” muito a campanha de Collor em Minas Gerais. Essa ajuda serviu também para eleger o vice-presidente Itamar Franco. O qual, como homem honrado e leal que é, ao assumir a Presidência, viu-se quase na obrigação de retribuir-lhe a ajuda.
E convidou-o para o Ministério da Fazenda. Mas, justamente por ser honrado, demitiu-o poucos meses depois, quando ficaram claras as ligações do “ministro” com a Odebrecht. De volta ao setor privado, Eliseu agora trabalha 24 horas por dia pelas “privatizações-doações”.
Em suma: a chave do que se chama de Belíndia é essa ligação permanente dos homens da área econômica, que ficam pulando do governo para a iniciativa privada, da iniciativa privada para os governos.
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SERVINDO A UM LADO E AO OUTRO
Examinem a lista abaixo, e constatem a “alternância” de todos de um lado para o outro.
1 – Elmo de Araújo Camões – É o exemplo clássico de relação promíscua entre o Banco Central (BC) e o setor privado. Quando as bolsas estouraram, em 1989, por conta do Caso Nahas, sua distribuidora, a Capitânea, era o pivô do escândalo. Ele era presidente do BC e amigo do então presidente da República, José Sarney.
2 – Keyler Carvalho Rocha – Era diretor do BC na gestão de Camões. A CVM chegou a investigar suas operações.
3 – José Luiz Miranda – Foi para o Banco Interatlântico, depois de sair do BC.
4 – Alkimar Moura – Deixou a Diretoria da Dívida Pública para dirigir uma distribuidora, ligada ao grupo Pirelli. Volta ao banco, em 1993, ocupando a mesma função.
5 – Claudio Haddad – Virou sócio do Banco Garantia, cujo grupo controla a Brahma e a Lojas Americanas.
6 – Carlos Brandão – Integrante do conselho de administração do Banco Econômico.
7 – Fernão Bracher – Dono do Banco BBA.
8 – Luiz Carlos Mendonça de Barros – Foi diretor no Plano Cruzado, em 1986. É sócio do Banco Matrix.
9 – Pérsio Arida – Também foi diretor durante o Cruzado. De lá rumou ao Unibanco. É presidente demissionário do BC.
10 – Geraldo Langoni – Foi presidente do Banco Central. Atualmente é diretor do Instituto de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas. Usa o prestígio da Instituição para atuar como “promoter” do Grupo Rotschild, um dos maiores exploradores do Brasil em todos os tempos. É um dos maiores defensores da “privatização-doação”.
11 – André Lara Resende – É sócio do Banco Matrix, que teve um bom desempenho em 1994. O Banco Matrix teve um lucro de 100 milhões de dólares, em 1994.
12 – Antônio Carlos Lemgruber – É diretor do Banco Liberal. Presidiu o BC no início do governo Sarney.
13 – José Julio Senna – É diretor do Banco Graphus, depois de passagens pelo Boavista e pelo Banco da Bahia.
14 – Roberto Castelo Branco – Trabalha no Interatlântico.
15 – Luís Eduardo de Assis – Da diretoria de Política Monetária, no governo Collor, pulou para o Citibank, o maior credor externo do país.
16 – Pedro Bodin – Largou o governo para aterrissar no Icatu, da família Almeida Braga.
17 – Francisco Pinto – Foi executivo do Banco da Bahia de Investimentos.
18 – Armínio Fraga Neto – É um dos mais influentes executivos do especulador húngaro Georges Soros. Ganhou o emprego após ser diretor da Área Internacional do BC. Já trabalhou no Garantia e na corretora americana Salomon Brothers. Está cotadíssimo para retornar ao governo.
19 – Francisco Gros – Deixou a presidência do BC para ser executivo do banco americano Morgan Stanley. Antes, vendeu suas ações no Banco BFC. O Morgan Stanley é um dos maiores interessados nas “privatizações-doações”. Trabalhou com o gângster Sami Khon e foi pela segunda vez presidente do Banco Central.
Helio Fernandes
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