Estamos vivendo um momento importante na história do Brasil com o julgamento do Mensalão. Surpreendentemente os nobres juízes estão condenando cada um dos réus, demonstrando a independência que precisamos para que a república funcione como deve ser: de forma justa. E começa agora a fase do julgamento onde o bicho vai pegar: os réus do núcleo político começam a ser julgados. Em especial José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares, a trinca de figurões do PT.
O retrospecto do julgamento não é bom para os réus. A manter-se a lógica, teremos uma condenação histórica que servirá como uma lição para a sociedade brasileira, de que o poder não é absoluto e de que ainda há juízes em Brasília. Mas é outro retrospecto que me incomoda.
Em minha palestra O Buraco da Fechadura trato do jeitinho brasileiro, nossa maior qualidade e maior defeito ao mesmo tempo. E mostro que o Brasil tem uma história repleta de anjos e demônios, fazendo um retrospecto de certos fatos recentes:
Em 1984, fomos às ruas com mais de 300 mil pessoas pelas Diretas Já, o nosso anjo salvador. Entusiasmados vimos o demônio da Câmara não aprovar a emenda. Brochamos.
Em 1985 elege-se o primeiro presidente civil após anos de governo militar: Tancredo Neves, o anjo salvador. E vem o demônio para matá-lo antes da posse. Brochamos.
Assume José Sarney, que lança o anjo sob a forma do redentor Plano Cruzado. Que logo vira o demônio dos oitenta e seis por cento de inflação ao mês. Brochamos.
Aí vem a Constituinte. O anjo Ulisses Guimarães conduz o povo às ruas e a gente muda tudo. Para ver o demônio nos dar uma montanha confusa de leis que tornam o país quase inviável. Nova brochada.
Surge então o anjo salvador: Fernando Collor de Mello. Que vira demônio e dá no que deu. Brochamos.
Então vem FHC, o anjo que coloca o país nos trilhos em seu primeiro mandato, para virar o demônio do segundo, abrindo caminho para a oposição. Nova brochada.
E então chega Lula, o anjo e seus comerciais. E traz com ele o demônio do Mensalão, da corrupção institucionalizada. Brochamos mais uma vez...
Que coisa! Parece sina: grandes mobilizações populares criando uma expectativa imensa que é depois transformada em decepção. E olha que eu só comecei em 1984. Se olhar antes tem mais.
Por isso estou acompanhando o julgamento do Mensalão com um entusiasmo contido. Comemoro cada pequena vitória, mas controlo imensamente minhas expectativas sobre o que vem pela frente. Enquanto lidaram com banqueiros, assistentes e políticos de menor expressão nossos juízes aplicaram a lei como deve ser. Mas chegou a hora dos tubarões e a partir de agora minha expectativa é zero.
Não, não é pessimismo. É apenas um pequeno truque que aprendi com o pioneiro da ciência da informação Saul Gorn, que um dia disse: “Sempre espere ficar desapontado. E você não ficará.”. To me poupando de outra grande brochada.
22 de setembro de 2012
Luciano Pires
O retrospecto do julgamento não é bom para os réus. A manter-se a lógica, teremos uma condenação histórica que servirá como uma lição para a sociedade brasileira, de que o poder não é absoluto e de que ainda há juízes em Brasília. Mas é outro retrospecto que me incomoda.
Em minha palestra O Buraco da Fechadura trato do jeitinho brasileiro, nossa maior qualidade e maior defeito ao mesmo tempo. E mostro que o Brasil tem uma história repleta de anjos e demônios, fazendo um retrospecto de certos fatos recentes:
Em 1984, fomos às ruas com mais de 300 mil pessoas pelas Diretas Já, o nosso anjo salvador. Entusiasmados vimos o demônio da Câmara não aprovar a emenda. Brochamos.
Em 1985 elege-se o primeiro presidente civil após anos de governo militar: Tancredo Neves, o anjo salvador. E vem o demônio para matá-lo antes da posse. Brochamos.
Assume José Sarney, que lança o anjo sob a forma do redentor Plano Cruzado. Que logo vira o demônio dos oitenta e seis por cento de inflação ao mês. Brochamos.
Aí vem a Constituinte. O anjo Ulisses Guimarães conduz o povo às ruas e a gente muda tudo. Para ver o demônio nos dar uma montanha confusa de leis que tornam o país quase inviável. Nova brochada.
Surge então o anjo salvador: Fernando Collor de Mello. Que vira demônio e dá no que deu. Brochamos.
Então vem FHC, o anjo que coloca o país nos trilhos em seu primeiro mandato, para virar o demônio do segundo, abrindo caminho para a oposição. Nova brochada.
E então chega Lula, o anjo e seus comerciais. E traz com ele o demônio do Mensalão, da corrupção institucionalizada. Brochamos mais uma vez...
Que coisa! Parece sina: grandes mobilizações populares criando uma expectativa imensa que é depois transformada em decepção. E olha que eu só comecei em 1984. Se olhar antes tem mais.
Por isso estou acompanhando o julgamento do Mensalão com um entusiasmo contido. Comemoro cada pequena vitória, mas controlo imensamente minhas expectativas sobre o que vem pela frente. Enquanto lidaram com banqueiros, assistentes e políticos de menor expressão nossos juízes aplicaram a lei como deve ser. Mas chegou a hora dos tubarões e a partir de agora minha expectativa é zero.
Não, não é pessimismo. É apenas um pequeno truque que aprendi com o pioneiro da ciência da informação Saul Gorn, que um dia disse: “Sempre espere ficar desapontado. E você não ficará.”. To me poupando de outra grande brochada.
22 de setembro de 2012
Luciano Pires
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