O governo reitera sua disposição para o excesso de criatividade na gestão das contas públicas.
Enviou ao Congresso um projeto para alterar a Lei de Diretrizes Orçamentárias que autoriza reduzir em mais R$ 20 bilhões a meta de superavit primário (economia destinada a pagar a despesa de juros). A nova folga assim obtida se refere a desonerações de impostos.
Além disso, o Planalto já havia lançado mão do desconto de R$ 45,2 bilhões em despesas do Programa de Aceleração do Crescimento. A redução total no esforço para conter gastos governamentais, portanto, é de R$ 65,2 bilhões.
Se toda essa folga contábil for utilizada, a meta atual de superavit primário cairia de R$ 155,9 bilhões (3,1% do PIB) para R$ 90,7 bilhões (1,8% do PIB).
A equipe da presidente Dilma Rousseff, com isso, só faz acentuar a insegurança quanto a seu real compromisso com uma gestão austera das finanças governamentais -não bastasse o vexame do final de 2012, com os malabarismos contábeis de última hora para atingir a meta compromissada.
Beira o surrealismo econômico classificar esse desconto adicional como investimento, pois boa parte do valor a ser abatido proviria de desonerações à indústria de bens de consumo. E a justificativa de que um saldo de 1,8% do PIB permitiria reduzir mais a dívida líquida (que já caíra a 35% do PIB no final do ano), apesar de procedente, faz tábula rasa dos riscos advindos da erosão na credibilidade do governo.
Muitos analistas argumentam que o indicador a vigiar é a dívida bruta (que abrange o passivo de todos os entes de governo, como o BNDES), hoje próxima a 59% do PIB. E ela tem crescido.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, alega que seria pior uma redução explícita da meta, em lugar dos subterfúgios encontrados, pois isso diminuiria a margem de manobra do Executivo quanto ao Orçamento e estimularia no Congresso a tentação de criar novas despesas permanentes. Esta é a única justificativa minimamente razoável para a medida.
Isso só ocorre, contudo, porque a gestão orçamentária está fora do controle da sociedade, que deveria ser exercido por meio de um Congresso responsável e investido dessa função. Hoje, o Orçamento votado é autorizativo, não mandatório, o que contribui para um jogo de faz de conta: o Legislativo aprova uma Lei Orçamentária ficcional, e o Executivo finge que a cumpre.
Soa como ingenuidade, porém, esperar do Congresso que emerja de sua irrelevância na matéria, para além de reivindicar mais espaço para as emendas paroquiais dos parlamentares, e do Planalto que abandone o improviso arbitrário.
09 de fevereiro de 2013
Editorial da Folha
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