Corte Suprema derruba reforma do Judiciário proposta por Cristina. Juízes consideraram medida inconstitucional, em decisão que representa revés para a presidente. Plano previa a eleição por voto popular de integrantes do Conselho de Magistratura
BUENOS AIRES - Num revés para a presidente Cristina Kirchner, a Corte Suprema de Justiça da Argentina declarou inconstitucionais os artigos centrais da lei 26.855, aprovada recentemente pelo Congresso. A legislação estabelece novas regras para o funcionamento do Conselho da Magistratura, sendo considerada um dos pilares de uma questionada reforma do Judiciário empreendida pela Casa Rosada.
Há uma semana, a lei fora considerada inconstitucional pela juíza Maria Servini de Cubria, e nesta terça-feira a Corte ratificou sua resolução, apesar das pressões. Na véspera, o ministro do Planejamento, Julio De Vido, um dos membros mais poderosos do gabinete, assegurara confiar “em plenitude que será respeitado o que foi votado pelo Congresso da Nação”.
Para um setor cada vez mais amplo do kirchnerismo, o governo é vítima de uma conspiração política e judicial. Nas palavras do deputado ultraK Carlos Kunkel, de “uma nova forma de golpismo”. Mas as acusações do governo e seus aliados não intimidaram a Corte, que se opôs, por seis votos contra apenas um, à lei apresentada pela bancada kirchnerista e aprovada por estreita margem de votos na Câmara.
A nova norma, agora suspensa, eleva de 13 para 19 os membros do conselho, órgão encarregado de designar e julgar a atuação dos juízes de todo o país. A lei também estabelece, pela primeira vez na História, a eleição dos novos membros do conselho através de eleições populares, junto com candidatos à Câmara e ao Senado de partidos políticos.
A iniciativa foi repudiada pela maioria das associações de juristas da Argentina, que acusaram a Casa Rosada de tentar politizar o Judiciário e, sobretudo, ampliar seus poderes.
- Esta é uma das sentenças mais importantes da corte desde a redemocratização do país. A sentença é uma defesa da independência judicial - disse o jurista Andrés Gil Domínguez.
Os membros da Corte Suprema consideraram que “a lei contraria a imparcialidade do juiz frente às partes de um processo e de toda a cidadania, já que lhe exige identificar-se com um partido político enquanto cumpre a função de administrar a Justiça. Desaparece a ideia de neutralidade judicial frente aos poderes políticos.
O Conselho continua funcionando segundo a regra antiga: 13 membros, designados por seus pares. Sua reforma era considerada crucial para a Casa Rosada, em momentos de forte tensão entre Executivo e Judiciário.
Nesta terça-feira, a presidente não falou sobre a decisão judicial, mas sobre a de uma câmara federal que fechou um caso sobre a propriedade de um grande centro de exposições, que continuará em mãos da Sociedade Rural Argentina (SRA), atualmente à frente de uma nova paralisação de produtores rurais contra medidas do governo. “Como que ninguém fez nada? Faltava mais. Para que estão alguns juízes?”, perguntou Cristina no Twitter.
Os soldados mais combativos da tropa kirchnerista no Parlamento revelaram disposição em recorrer da decisão em tribunais internacionais.
- Espero que esta corte de prestigiosos juristas demonstre ser patriota - declarou, na segunda-feira, a deputada Diana Conti, uma das autoras dos seis projetos de lei da reforma judicial.
Mudança após caso Clarín
Já o ex-chefe de gabinete e atual senador K, Aníbal Fernández, afirmou que a Justiça “está se metendo onde não deve”.
A maioria dos membros da Corte Suprema foi designada após a eleição de Néstor Kirchner, em 2003. Até o ano passado, os magistrados eram elogiados pelo governo. Os conflitos surgiram em meio à disputa da Casa Rosada com o grupo Clarín, cuja definição também está nas mãos do máximo tribunal.
- Estamos muito satisfeitos. Se esta lei tivesse sido confirmada, estaríamos nos transformando na Venezuela - disse Alejandro Fargossi, atual membro do Conselho da Magistratura.
19 de junho de 2013
Janaína Figueiredo - O Globo
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