"Toda mulher que lava a roupa no tanque sabe como isso é importante, como uma lavadora automática melhora a vida no dia a dia, não é?", disse a presidente Dilma Rousseff em seu programa de rádio na última segunda.
Foi mais uma oportunidade para promover o Minha Casa Melhor, programa de venda facilitada de eletrodomésticos e móveis lançado pelo governo no dia 12 como tentativa de turbinar a economia pelo consumo num momento de queda de popularidade de Dilma --antes mesmo de a onda de protestos virar uma crise política grave.
Na locução, Dilma sugere ainda que as famílias do programa "Minha Casa, Minha Vida", que têm direito ao benefício, troquem a TV por "uma digital novinha, dessas bem modernas, para assistir aos jogos da Copa".
A estreia da presidente na retórica de garota-propaganda de eletrodomésticos e móveis, a pouco mais de um ano das eleições, tem um antecedente de peso entre a vizinhança: Hugo Chávez.
Em 2010, o então presidente venezuelano, morto em março passado, utilizou o mês que antecedia as cruciais eleições legislativas daquele ano para lançar o "Mi Casa Bien Equipada" --programa de venda subsidiada (e muitas vezes distribuição gratuita) de itens da linha branca importados da China e TVs.
"Tremenda máquina de lavar. Grandíssima, barata!", promovia Chávez, em transmissões televisivas. Para ele, o ponto não era aquecer a economia ou incentivar a produção local, mas aumentar o acesso da população mais pobre e mostrar que o consumo na "revolução socialista" valia mais que no "capitalismo".
Além da escolha de períodos politicamente sensíveis para o lançamento, os programas de lá e de cá têm outras semelhanças: há compra a prazo vinculada a bancos estatais, com juros bem abaixo do mercado, e um cartão específico para fazê-lo. A Venezuela de Chávez e do atual presidente Nicolás Maduro se orgulha de ter uma intensa ligação com o governo do Brasil e o maior número de agências de cooperação brasileiras em Caracas --uma das principais iniciativas é manter lá um posto da Caixa, que transmite, por exemplo, práticas de bancarização de população de baixa renda.
Os venezuelanos já levaram daqui ideias e técnicos do Minha Casa, Minha Vida para ajudar a desenvolver lá programas do setor, como o "Gran Misión Vivienda", lançado em 2011. Levaram também o marqueteiro de Dilma e Lula, João Santana --que batizou o Minha Casa, Minha Vida e o Minha Casa Melhor no governo brasileiro-- para trabalhar na campanha presidencial de Chávez de 2012.
Usaram em propagandas na TV na Venezuela uma adaptação do bordão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva: "Esto nunca se había visto en este país". Agora, o caminho parece ser o inverso. Com o programa de vendas de móveis e linha branca de Dilma, é a primeira vez que ideias usadas com sucesso primeiro no país vizinho estão sendo aplicadas no Brasil, guardadas as proporções.
Para o especialista Leonardo Vera, da Universidade Central da Venezuela, o "Mi Casa Bien Equipada" foi um "exitoso instrumento de marketing político" para o governo chavista. "Esse é um programa de retorno muito rápido e que deu um rendimento político favorável ao governo Chávez", afirma. Na Venezuela, o programa foi uma bandeira na campanha de Chávez e, depois, de Maduro --o logo do programa leva agora uma imagem estilizada do mentor esquerdista.
Segundo o governo, 940 mil famílias já foram beneficiadas desde 2010. No Brasil, a presidente tem comemorado publicamente a rápida aceitação do programa --foram 18,7 mil adesões em cinco dias--, mas não está previsto que ela fale na TV sobre o tema.
Questionado se a versão venezuelana tinha sido uma referência para o governo Dilma, o Ministério das Cidades, responsável pelo Minha Casa Melhor, disse "não ter informação neste sentido". Segundo a Folha apurou com uma fonte ligada ao tema, o lançamento de uma linha de crédito para eletrodomésticos e móveis ligada ao Minha Casa, Minha Vida era estudada desde o governo Lula e não houve "inspiração" venezuelana. A iniciativa só não teria sido anunciada em 2010, no ano da eleição de Dilma, porque não estava claro que garantia orçamentária teria. O embaixador da Venezuela no Brasil, Maximilien Sánchez Arvelaiz --entusiasta da cooperação bilateral em habitação--, disse não ter sido consultado pelo Brasil sobre a experiência do "Mi Casa Bien Equipada".
23 de junho de 2013
in coroneleaks
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