Mikhail Bakunin é ainda lembrado hoje como mais famoso teórico do anarquismo.
Sua influência, considerável em vida, ampliou-se muito após sua morte. Mas nada
do seu passado predispunha Bakunin a uma vida de revolucionário, em constantes
exílios impostos ou auto-impostos pela Europa e pelos Estados Unidos. De fato,
Bakunin nasceu numa família rica e poderia ter seguido um destino privilegiado,
não fosse sua inquietação intelectual e as circunstâncias aterradoras de sua
Rússia natal.
Desde a juventude, Bakunin engajou-se progressivamente nas causas revolucionárias, compartilhando com outros grandes líderes muitas idéias e tantas outras divergências. A carta publicada nesta página é das mais curiosas do líder anarquista que chegaram até nós.
É dirigida aos redatores do jornal de Genebra, que havia publicado um artigo contra o qual Bakunin protesta, apesar de frisar que: “Não faz parte dos meus hábitos o de responder às injúrias e às calúnias dos jornais, pois teria de gastar todo meu tempo se eu quisesse responder a todas as bobagens que, sobretudo desde 1869, têm sido publicadas ao meu respeito”.
Bakunin abre uma exceção, em vista da importância do jornal e do que considera a extrema virulência do ataque recebido. Em quatro páginas densas, se defende das acusações levantadas contra ele.
Mas o que torna essa carta excepcional, e não apenas mais um dos inúmeros embates doutrinários que alimentavam o dia a dia da esquerda revolucionária européia (e que hoje estão em grande parte esquecidos), é a identidade do principal detrator de Bakunin, contra o qual o anarquista se insurge nestas páginas: ninguém menos que o próprio Karl Marx. Já no segundo parágrafo da carta, Bakunin revela o seu ressentimento:
"Entre meus caluniadores mais agressivos e insistentes − juntamente com os agentes do governo russo – menciono naturalmente o senhor Marx, o chefe dos comunistas alemães, que, sem dúvida por causa de sua tripla condição de comunista, de alemão e de judeu, cismou comigo. Ainda que pretenda nutrir igualmente um grande ódio contra o governo russo, nunca se ocultou, pelo menos contra mim, de agir de acordo com este governo. Para me denegrir aos olhos do público, o senhor Marx não só recorre aos órgãos de uma imprensa complacente como também se serve de correspondências e cartas íntimas, de documentos e conferências da Internacional Socialista e não hesita em fazer desta grande e bela associação, que ele contribuiu a fundar, um instrumento de suas vinganças pessoais... Mas não é para responder a Marx que farei uma exceção à regra de silêncio que me tenho imposto. Hoje, no entanto, senhores, eu tenho o dever de repelir suas mentiras ou, para usar uma linguagem mais parlamentar, seus erros, que se inseriram nas colunas do seu jornal."
No resto da carta Bakumin explica em detalhes as intenções ocultas e os equívocos de Marx e discorre sobre questões que fascinaram várias gerações, mas que tornaram-se para o público de hoje bastante obscuras.
Curiosamente, são muitos raros os documentos nos quais os líderes revolucionários do século XIX expõem de forma tão clara seus conflitos e divergências. Esta carta fez parte de três coleções prestigiosas, duas das quais formadas na Europa e uma nos Estados Unidos, antes de ser oferecida em leilão na Alemanha em 2007, quando foi adquirida por seu atual detentor.
20 de maio de 2012
Pedro Correa do Lago
Desde a juventude, Bakunin engajou-se progressivamente nas causas revolucionárias, compartilhando com outros grandes líderes muitas idéias e tantas outras divergências. A carta publicada nesta página é das mais curiosas do líder anarquista que chegaram até nós.
É dirigida aos redatores do jornal de Genebra, que havia publicado um artigo contra o qual Bakunin protesta, apesar de frisar que: “Não faz parte dos meus hábitos o de responder às injúrias e às calúnias dos jornais, pois teria de gastar todo meu tempo se eu quisesse responder a todas as bobagens que, sobretudo desde 1869, têm sido publicadas ao meu respeito”.
Bakunin abre uma exceção, em vista da importância do jornal e do que considera a extrema virulência do ataque recebido. Em quatro páginas densas, se defende das acusações levantadas contra ele.
Mas o que torna essa carta excepcional, e não apenas mais um dos inúmeros embates doutrinários que alimentavam o dia a dia da esquerda revolucionária européia (e que hoje estão em grande parte esquecidos), é a identidade do principal detrator de Bakunin, contra o qual o anarquista se insurge nestas páginas: ninguém menos que o próprio Karl Marx. Já no segundo parágrafo da carta, Bakunin revela o seu ressentimento:
"Entre meus caluniadores mais agressivos e insistentes − juntamente com os agentes do governo russo – menciono naturalmente o senhor Marx, o chefe dos comunistas alemães, que, sem dúvida por causa de sua tripla condição de comunista, de alemão e de judeu, cismou comigo. Ainda que pretenda nutrir igualmente um grande ódio contra o governo russo, nunca se ocultou, pelo menos contra mim, de agir de acordo com este governo. Para me denegrir aos olhos do público, o senhor Marx não só recorre aos órgãos de uma imprensa complacente como também se serve de correspondências e cartas íntimas, de documentos e conferências da Internacional Socialista e não hesita em fazer desta grande e bela associação, que ele contribuiu a fundar, um instrumento de suas vinganças pessoais... Mas não é para responder a Marx que farei uma exceção à regra de silêncio que me tenho imposto. Hoje, no entanto, senhores, eu tenho o dever de repelir suas mentiras ou, para usar uma linguagem mais parlamentar, seus erros, que se inseriram nas colunas do seu jornal."
No resto da carta Bakumin explica em detalhes as intenções ocultas e os equívocos de Marx e discorre sobre questões que fascinaram várias gerações, mas que tornaram-se para o público de hoje bastante obscuras.
Curiosamente, são muitos raros os documentos nos quais os líderes revolucionários do século XIX expõem de forma tão clara seus conflitos e divergências. Esta carta fez parte de três coleções prestigiosas, duas das quais formadas na Europa e uma nos Estados Unidos, antes de ser oferecida em leilão na Alemanha em 2007, quando foi adquirida por seu atual detentor.
20 de maio de 2012
Pedro Correa do Lago
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