O governo confirmou mais uma vez sua vocação para a trapalhada e sua aversão ao planejamento, ao improvisar a proposta de renovação de concessões do setor elétrico. Surgiram ameaças de processos, erros de cálculo foram reconhecidos e acionistas minoritários da Eletrobrás protestaram contra a violação de seus interesses. Na quinta-feira, o Ministério de Minas e Energia divulgou um aumento das indenizações previstas para dez usinas. Nessa altura, muito tempo já havia sido gasto numa discussão desnecessária.
Empenhados em garantir já em 2013 a redução das tarifas de eletricidade, a presidente Dilma Rousseff e os responsáveis pela política energética precipitaram-se ao lançar seu arremedo de plano, negligenciaram detalhes de contratos, deixaram de combinar o jogo com todos os funcionários envolvidos e surpreenderam os dirigentes das empresas concessionárias. A polêmica só ocorreu, segundo o secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, porque algumas elétricas queriam lucrar mais que a indústria do petróleo.
Afirmações desse tipo foram desmentidas por funcionários do próprio setor público federal. A Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) tem direito de renovar as concessões de três usinas por 20 anos sem redução de tarifas, afirmou um dos diretores da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Julião Coelho. Os atuais contratos permitem a renovação automática da primeira concessão e esse benefício foi concedido a outras concessionárias. Há, portanto, um argumento baseado em cláusula contratual - mas o governo, segundo Zimmermann, respeita contratos e o marco regulatório.
No caso da Usina de Três Irmãos, da paulista Cesp, o erro foi cometido na base de cálculo da amortização. Tomou-se como início da operação o ano de 1982, mas o correto é 1992. Esse foi um dos casos revistos. Também houve erros em cálculos relativos a outras empresas, mas bem menores, segundo a agência.
O conselho de administração da Eletrobrás, controlada pela União, decidiu aceitar as condições ditadas pelo governo, com perspectiva de grandes perdas. Acionistas minoritários, no entanto, mobilizam-se contra a posição majoritária. A indenização oferecida é bem menor, segundo os críticos, do que os custos de amortização ainda pendentes. Neste ano, a empresa perdeu cerca de dois terços do valor de mercado. A maior parte da redução ocorreu depois do anúncio, em setembro, da proposta de renovação das concessões.
Até o procedimento escolhido pelo governo para sacramentar os novos contratos e a redução da conta de luz é contestável. Nenhuma insegurança jurídica decorre da Medida Provisória (MP) 579, disse o secretário executivo do Ministério de Minas e Energia. Errado, mais uma vez.
A edição de uma MP para redefinir a política energética já é uma aberração. Pela Constituição, MPs são admissíveis em casos de "relevância e urgência". Ninguém contesta a relevância de uma política para o setor elétrico, mas o critério de urgência é inaplicável. Ao traçar diretrizes para um importante ramo da infraestrutura como objeto de decisão urgente o governo apenas confirma sua incompetência administrativa. O recurso a uma MP, nesse caso, denuncia improvisação, evidencia mais uma vez um pendor para o autoritarismo e justifica todas as dúvidas quanto à segurança legal dos investimentos e outros negócios realizados no Brasil.
O Brasil precisa com urgência de mais seriedade e mais competência administrativa na política de infraestrutura, mas esse problema não pode ser resolvido por meio de MPs (neste caso, por meio de duas, porque uma segunda, com correções, foi publicada na sexta-feira). O governo já proporcionaria um alento aos cidadãos se pelo menos reconhecesse as próprias trapalhadas e se esforçasse para definir com clareza seus objetivos e instrumentos.
Se falassem menos em Estado forte e planejassem mais, as autoridades evitariam, entre outros vexames, o de ver construído um parque eólico de geração elétrica, na Bahia, sem o correspondente sistema de transmissão. Nenhuma falha desse tipo se corrige com MPs fora de hora.
01 de dezembro de 2012
Editorial do Estadão
Empenhados em garantir já em 2013 a redução das tarifas de eletricidade, a presidente Dilma Rousseff e os responsáveis pela política energética precipitaram-se ao lançar seu arremedo de plano, negligenciaram detalhes de contratos, deixaram de combinar o jogo com todos os funcionários envolvidos e surpreenderam os dirigentes das empresas concessionárias. A polêmica só ocorreu, segundo o secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, porque algumas elétricas queriam lucrar mais que a indústria do petróleo.
Afirmações desse tipo foram desmentidas por funcionários do próprio setor público federal. A Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) tem direito de renovar as concessões de três usinas por 20 anos sem redução de tarifas, afirmou um dos diretores da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Julião Coelho. Os atuais contratos permitem a renovação automática da primeira concessão e esse benefício foi concedido a outras concessionárias. Há, portanto, um argumento baseado em cláusula contratual - mas o governo, segundo Zimmermann, respeita contratos e o marco regulatório.
No caso da Usina de Três Irmãos, da paulista Cesp, o erro foi cometido na base de cálculo da amortização. Tomou-se como início da operação o ano de 1982, mas o correto é 1992. Esse foi um dos casos revistos. Também houve erros em cálculos relativos a outras empresas, mas bem menores, segundo a agência.
O conselho de administração da Eletrobrás, controlada pela União, decidiu aceitar as condições ditadas pelo governo, com perspectiva de grandes perdas. Acionistas minoritários, no entanto, mobilizam-se contra a posição majoritária. A indenização oferecida é bem menor, segundo os críticos, do que os custos de amortização ainda pendentes. Neste ano, a empresa perdeu cerca de dois terços do valor de mercado. A maior parte da redução ocorreu depois do anúncio, em setembro, da proposta de renovação das concessões.
Até o procedimento escolhido pelo governo para sacramentar os novos contratos e a redução da conta de luz é contestável. Nenhuma insegurança jurídica decorre da Medida Provisória (MP) 579, disse o secretário executivo do Ministério de Minas e Energia. Errado, mais uma vez.
A edição de uma MP para redefinir a política energética já é uma aberração. Pela Constituição, MPs são admissíveis em casos de "relevância e urgência". Ninguém contesta a relevância de uma política para o setor elétrico, mas o critério de urgência é inaplicável. Ao traçar diretrizes para um importante ramo da infraestrutura como objeto de decisão urgente o governo apenas confirma sua incompetência administrativa. O recurso a uma MP, nesse caso, denuncia improvisação, evidencia mais uma vez um pendor para o autoritarismo e justifica todas as dúvidas quanto à segurança legal dos investimentos e outros negócios realizados no Brasil.
O Brasil precisa com urgência de mais seriedade e mais competência administrativa na política de infraestrutura, mas esse problema não pode ser resolvido por meio de MPs (neste caso, por meio de duas, porque uma segunda, com correções, foi publicada na sexta-feira). O governo já proporcionaria um alento aos cidadãos se pelo menos reconhecesse as próprias trapalhadas e se esforçasse para definir com clareza seus objetivos e instrumentos.
Se falassem menos em Estado forte e planejassem mais, as autoridades evitariam, entre outros vexames, o de ver construído um parque eólico de geração elétrica, na Bahia, sem o correspondente sistema de transmissão. Nenhuma falha desse tipo se corrige com MPs fora de hora.
01 de dezembro de 2012
Editorial do Estadão
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