Na contramão da comoção planetária, e da homenagem solene prestada por respeitados chefes de Estado latino-americanos, a Casa Branca limitou-se a uma declaração grosseira e fria e – para horror de muitos latino-americanos – sequer ofereceu condolências.
O que se vê é que presidente mais demonizado – apesar de democraticamente eleito e reeleito – da história do mundo tinha muitos amigos e admiradores – e não só “estados inimigos” como Irã ou Síria, imediatamente e incansavelmente mencionados no ‘jornalismo’ e nos ‘noticiários’ nos EUA.
A ‘mídia’ nos explica agora que a simpatia se dirigiria ao petróleo venezuelano. Mas nenhum rei da Arábia Saudita jamais foi amado e homenageado como Chávez, vivo ou morto.
Em Chávez, nada era simulacro ou demagogia. Sempre dizia o que pensava – o que nem sempre é adequado, num chefe de Estado. Mas a maioria dos venezuelanos amava aquela franqueza, porque dava a Chávez uma densidade, uma realidade que poucos políticos têm: era, portanto, alguém em quem se podia confiar.
REAÇÃO A URIBE
A atitude não mudava em relação a outros governos. Embora tenha tido grandes brigas públicas com alguns governos, praticamente nunca criticou outro chefe de Estado, a menos que tivesse sido atacado antes. Manteve boas relações até com o governo direitista de Alvaro Uribe da Colômbia, durante vários anos; até que Uribe virou-se contra ele, o que Chávez interpretou (provavelmente com razão) como Uribe agindo sob ordens dos EUA.
Quando Manuel Santos, que fora ministro da Defesa de Uribe, tornou-se presidente da Colômbia, em agosto de 2010 e decidiu restabelecer boas relações com Chávez, encontrou a porta aberta. As relações foram imediatamente recompostas. Chávez era amigável com qualquer um que não o agredisse.
Mas havia mais que traços de personalidade e a busca de alianças – das quais Chávez precisava, se quisesse sobreviver, depois que o governo Bush declarou publicamente, em 2002, que tinha intenções de derrubá-lo (embora essa informação tenha passado praticamente sem qualquer notícia na imprensa-empresa dos EUA, há provas documentais consistentes do envolvimento de Washington no golpe militar de 2002 contra Chávez. Chávez tinha visão solidária do mundo. Ele e seu governo construíram inúmeras políticas que não se orientavam pelo princípio de que “nações não têm amigos: nações têm interesses”.
A IMPRENSA-EMPRESA
Por outro lado, a história de Chávez também mostra o enorme poder da imprensa-empresa, a chamada ‘mídia’, no serviço de modelar a opinião pública. Muitos governos conhecem bastante bem as realizações do governo Chávez, mas, porque a imprensa-empresa norte-americana e, por via de repetição, a imprensa-empresa latino-americana só veiculavam, quase exclusivamente, ‘informação’ negativa sobre a Venezuela, durante 14 anos – sempre ‘informação’ exageradamente negativa e não raras vezes, ‘informação’ falsa –, a maior parte da população no hemisfério ocidental jamais conheceu sequer os fatos básicos sobre a Venezuela ou sobre o governo de Chávez.
Poucos sabem que, depois que Chávez alcançou o controle sobre a indústria do petróleo, a economia da Venezuela passou a crescer muito bem; a pobreza foi reduzida à metade e a pobreza extrema, em mais de 70%. Poucos sabem que a maior parte desses ganhos veio do crescimento do emprego no setor privado, não de “esmolas do governo”. Poucos sabem que milhões de venezuelanos ganharam acesso a serviços públicos de saúde pela primeira vez; e que melhoraram todos os indicadores de educação (o número de matriculados no ensino superior duplicou); e que o número de aposentados saltou, de 500 mil, para mais de dois milhões.
De fato, a imprensa-empresa ocidental praticamente pintou a Venezuela como total fracasso econômico e político. E bem poucos sabem que nada há que assemelhe a Venezuela a algum tipo de “estado autoritário”. De fato, a imprensa-empresa venezuelana ainda faz, até hoje, campanha contra o governo.
É um tipo de ‘jornalismo’ que ensina a não saber o que Chávez fez pelo hemisfério – não só os bilhões de dólares que distribuiu como ajuda, pelo programa Petrocaribe e outros, mas também – como Lula da Silva explicou – o papel que desempenhou na promoção da unidade continental e da segunda independência da América Latina.
Essa independência é muito mais que questão de orgulho nacional ou regional; é mais, até, que uma das mais radicais mudanças geopolíticas, até aqui, do século 21. É mudança que teve consequências imensas para os latino-americanos, onde a pobreza já caiu, de 42% no início da décadas, para 27%, em 2009. Difícil imaginar esse tipo de avanço econômico e social, no tempo em que a região vivia sob tutelagem do FMI/Washington; de fato, na região, como um todo, entre 1980 e 2000, o crescimento do PIB per capita foi praticamente zero.
SÓ MENTIRAS
A maioria das pessoas em todo o hemisfério ocidental receberam uma visão à moda “Tea Party”, da Venezuela, com a imprensa-empresa liberal e de direita, praticamente idêntica, sem noticiar praticamente nenhum fato, só mentiras, sobre a Venezuela e seu governo.
Por tudo isso, trava-se hoje uma nova batalha pela definição do legado de Chávez – e muitos já lutam para preservar os ‘ganhos’ que conseguiram na campanha para demonizar Chávez. Para esses, a onda de simpatia e de respeito por Chávez e por seu governo que se vê crescer em todo o mundo é problema real.
Fato é que, durante os 14 anos de governo Chávez, os EUA perderam a maior parte da influência que sempre tiveram na América Latina, especialmente na América do Sul. Pode-se pois dizer com razoável certeza, que, na batalha contra Washington, Chávez venceu. E, com ele, a região e o planeta venceram. Por isso, será para sempre honrado, respeitado e lembrado – como foi, dia 8/3/2013, por praticamente todo o mundo.
(artigo enviado por Sergio Caldieri)
19 de março de 2013
Mark Weisbrot (Center for Economic and Policy Research, em Washington)
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