"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 17 de junho de 2013

O GRANDE PROTESTO NACIONAL NÃO É SOBRE PASSAGENS DE ÔNIBUS

A juventude que vai às ruas no Brasil inteiro não se manifesta apenas contra passagens de ônibus. Já passou da hora de aceitar esse fato.

 
protesto fortaleza O grande protesto nacional não é sobre passagens de ônibusManifestantes em Fortaleza
 
Não, não se trata de vinte centavos na passagem de ônibus em São Paulo. E não se trata apenas de São Paulo: é nacional. Praticamente todas as regiões do país e suas grandes capitais são palcos desses protestos.
 
Quais as causas? São várias, inúmeras, e até mesmo um aspecto quase “sem causa” que, na verdade, é aquela motivação totalmente legítima de uma juventude que pretende fazer parte de algo grande e simbólico historicamente.
 
Mas, claro, há sim as motivações concretas. Claro que há. Dois textos ótimos circularam explicando o mesmo estopim. O querido Marvio dos Anjos tratou do tema em alguns tuítes que deram origem a esta bela análise; Alexandre Versignassi foi pelo mesmo caminho, de maneira bem didática.
 
Mas seria só a inflação? Creio que não. Ela é o estopim, a tal “gota d’água”. Há muito mais aí. São anos e anos de corrupção, de condenações que não resultam em nada, de dinheiro do povo indo pro bolso de ladrões enquanto os serviços públicos são uma porcaria.
 
E no país inteiro. Sim, os protestos, como já dito, tem amplitude nacional. E é exatamente por isso que a galera governista fica entre o repúdio-com-alguma-análise e a adesão-sem-dar-nome-aos-bois. Jovens de Fortaleza não vão às ruas porque São Paulo está ruim; jovens de Curitiba não o fazem por divergir de como está Brasília; jovens do Rio não estão inconformados com Salvador. E todos os vice-versa possíveis aí.
Aceitem os fatos, portanto: a revolta é nacional.
 
Criou-se a ideia de que o povo “aceita” os desmandos do governo, a corrupção impune, os mais variados escândalos, sempre em nome da popularidade dos mandatários. Governistas, não raro, respondiam às crises mais graves com pesquisas ou vitórias eleitorais.
 
Foi assim que cresceu essa geração que agora está nas ruas. Eles tinham de seis a doze anos quando o PT assumiu o governo e, agora, com capacidade e organização para ir às ruas, e sem aquele ranço idiota de quem estava na faculdade quando o governo era “neoliberal”, sabem MUITO bem o que está havendo e NÃO pretendem aliviar porque “há um projeto maior em curso” (a velha lorota dos que passaram esses dez anos encobrindo os desmandos do partido do coração).
 
O desespero também aparece no fato de que, pela primeira vez em muitos e muitos anos, o grande partido central não tem o menor controle sobre os manifestantes. Não são sindicatos ou entidade estudantil que recebem fábulas do governo, mas sim jovens que, no país inteiro, rebelam-se contra esse mesmo governo.
 
Assim, não se trata de vinte centavos em uma passagem. São dez anos de corrupção sem os responsáveis punidos, são os mais variados escândalos, são os gastos absurdos da Copa, são os preços que aumentam enquanto as pessoas perdem o poder aquisitivo…
 
A inflação é a gota d’água num balde de indignação e inconformismo NACIONAL que transbordou depois dessa década de abuso. A conta chegou agora e não adianta fingir desconhecer quem deve pagá-la. Aceitem a responsabilidade por tudo isso, pois parece estar acabando a “década do migué”.
 
Enfim, temos uma juventude corajosa e sem rabo preso com o partido do governo (até mesmo por memória afetiva de tempos colegiais). Os jovens-velhos que passaram esses anos todos encobrindo as mutretas não sabem o que fazer.
E isso é ótimo. O Brasil de fato precisava.
 
17 de junho de 2013
Gravatai Merengue

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