Muito raramente, de tempos em tempos, cria-se na história política da humanidade uma situação chamada “vazio de poder” - um momento raro em que o velho não se sustenta mais e o novo ainda não surgiu. Há quem diga que esses momentos são bons. Há quem diga que o mesmo “ideograma chinês para palavra crise define também o conceito de oportunidade” , há quem diga até que “assim caminha a humanidade”.
Sempre correndo o risco de se apresentar como alguém que tem a chave da compreensão da história, eu insisto que tal tipo de situação deve ser vista com extremo cuidado.
Não houve, em toda história humana, nenhuma situação assim que não tenha permitido o surgimento daquilo que existe de mais primitivo nos instintos políticos. Foi assim na União Soviética, foi assim na Alemanha, na Espanha de Franco, na China de Mao Tse Tung e depois no Camboja de Pol Pot. Acreditem portanto quando eu digo – temos, sim, elementos para pensar que pode ocorrer o mesmo no Brasil dessas manifestações de junho.
Já escrevi antes sobre aquelas que considero as causas daquilo que está havendo. Deixei claro que para compreender o caos em que caiu o país, a chave é estudar o Partido dos Trabalhadores – sua origem, plano de poder e a crise estabelecida pelo Julgamento do Mensalão. Hoje o texto é especulação pura. É exercício no sentido de tentar responder o que todo mundo está perguntando – “E agora, o que vai acontecer?”
Tenho visto historiadores, sociólogos, filósofos e tanta gente com formação profissional muito melhor que a de um simples médico responder - “não se sabe”. Faço coro com eles! Deus me livre de me apresentar como alguém que é “especialista nas leis da História”. Não levo nenhuma estrelinha vermelha no peito, não, mas gostaria de me propor a uma tarefa inversa – escrever sobre aquilo que penso que NÃO vai acontecer. Aí sim; eu peço licença para me arriscar.
A primeira coisa a dizer é que o Brasil NÃO vai sair disso mais democrático. Vou dizer que as pessoas nas ruas NÃO estão mais conscientes do que no dia do capítulo final de “Avenida Brasil”. Afirmo que esse movimento NÃO começou espontaneamente e NÃO vai parar sem motivo algum. NÃO nasceu desses protestos nenhuma alternativa política séria a organização criminosa e associada ao narcotráfico que governa o Brasil, e o movimento das ruas NÃO é o sua parteira.
Tenho conversado com pessoas que dizem - “tudo bem, Milton, mas ninguém aguenta mais. Já é um início de mudança, não é?” Respondo que não, não é não.
Centenas de milhares, milhões de brasileiros estão nas ruas mas até agora não há um só discurso capaz de definir no fundo, e como um todo, o que as pessoas querem. Sabe-se muito bem o que as pessoas NÃO querem mais de jeito nenhum. NÃO querem mais o SUS nas atuais condições, não querem mais escolas de e delegacias desmoronando, não querem mais saber de política nem de partido algum, não querem a Copa do Mundo.. mas é estarrecedor perceber que não oferecem NADA como projeto de poder alternativo.
Pergunto a vocês: quantas mil pessoas querem a renúncia imediata da Dilma e novas eleições, hein?
Pergunto a vocês: quantas mil pessoas querem a renúncia imediata da Dilma e novas eleições, hein?
O país é constituído de dezenas de milhões de habitantes que não querem nem saber de casamento gay, que detestam essa história de legalizar a maconha, de aquecimento global, de tirar crucifixos dos tribunais, ou marchar com as vadias, que sabem que “médico cubano é para tratar pobre enquanto Lula e Dilma vão para os melhores hospitais”... Em resumo, gente conservadora mas que não tem absolutamente representatividade política nenhuma.
Talvez, vejam bem que estou escrevendo talvez, tenha chegado a hora dos “cientistas políticos”, historiadores, sociólogos, filósofos, enfim... Gente que estuda isso profissionalmente afirmar em público com todas as letras – Não há, até agora no Brasil, um projeto de alternativa de poder ao delírio petista que nos levou ao ponto que chegamos!
Gostaria de saber por que ninguém diz isso... Não se dão conta ou fingem que não sabem, hein? De uma coisa eu sei – e vou escrever aqui com todas as letras: Não há ordem social, sistema político ou governo legal (por mais cruel que seja) mais perigoso que a anarquia total... Nada é mais arriscado que o vazio, que a ausência da lei escrita, do respeito à Constituição e ao Poder Judiciário. É assim meus amigos que estamos navegando - num Brasil que não tem mais comandante
Estamos todos num navio à deriva...
para o meu pai,
25 de junho de 2013
Milton Pires é Médico.
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