Muitas vezes o voluntarismo – atitude de propor soluções e políticas baseadas apenas em nossa própria vontade e à nossa maneira – e a liderança andam juntos. Mas nem sempre.
Quando andam juntos, o líder consegue que a maioria o acompanhe em seus desejos, aceitando inclusive que, para isso, regras sejam torcidas ou quebradas.
Tal comportamento é típico de regime autocrata ou de sistemas políticos em que a população tem baixo nível de consciência.
Por conta de nosso passado colonial e escravocrata, no Brasil temos resquícios perniciosos de voluntarismo. Ditos populares expressam essa condição, caso de “manda quem pode, obedece quem tem juízo”.
Tal sentimento está arraigado na sociedade, tanto por parte de quem manda quanto por parte de quem deve obedecer. Pior: devido à precária educação política, muitos acham, por exemplo, que a Presidência da República tudo pode – até mesmo afastar o presidente do Senado.
O voluntarismo também surge como uma reação exasperada à lentidão dos poderes públicos. Certa feita, Lula discursava no Palácio do Planalto dizendo que agora que o governo começava a investir é que ele via como era difícil investir no Brasil, por causa da burocracia.
A presidente Dilma Rousseff baseia muitas de suas atitudes em um marcante voluntarismo, que é acompanhado de boas doses de irritação e de cobranças públicas exasperadas.
E o pior é que nada acontece, ou continua a acontecer em ritmo de samba-canção, ou seja, muito devagar.
No momento, o voluntarismo deveria ser substituído por uma abordagem mais racional e menos emocional das questões que afligem o país. A partir das manifestações de rua realizadas em junho, o governo embarcou em duas canoas furadas: a proposição de uma Constituinte exclusiva e, depois, de um plebiscito sobre a reforma política.
As teses poderiam ter sido mais bem recebidas se tivessem sido costuradas com os parceiros políticos. Mas não. Foram colocadas no mercado político como fatos consumados. A primeira delas, a Constituinte exclusiva, naufragou. A outra periga não dar em nada.
Ao colocar o tema da reforma política no tabuleiro, o governo conseguiu, por um lado, dividir as atenções do noticiário sobre os protestos que derrubaram a popularidade da presidente. Por outro, por negociar mal a proposta, criou ainda mais descontentamentos em sua base aliada no Congresso.
Vale lembrar que estamos em véspera de ano eleitoral, e não interessa, principalmente aos deputados, aprovar mudanças estruturais no sistema político.
Em política, como em muitas outras coisas na vida, a forma vale tanto quanto o conteúdo. Uma bela ideia mal apresentada pode morrer no nascedouro. O contrário também vale: péssimas ideias podem prosperar por conta do discurso de quem as vende.
Reforma política é um tema mais do que necessário no país. Mas deve ser objeto de amplo debate antes que o Congresso se mobilize em direção a alguma decisão concreta. Foi assim no caso da Ficha Limpa. As discussões forçaram o Congresso a aprová-la. Não se precisou de Constituinte exclusiva nem de plebiscito.
Faria melhor a Presidência da República conversar com os aliados e a oposição, bem como com setores da sociedade civil e, até mesmo, com o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social sobre a pauta que seria negociada com o Congresso.
Seria mais uma expressão de liderança do que de mero voluntarismo.
12 de julho de 2013
Murillo de Aragão é cientista político.
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