O alto e crescente custo, a escassez de recursos públicos para bancar mais subsídios, enquanto falta dinheiro para o transporte urbano, são objeções incontornáveis
A insistência do governo federal no complicado projeto do trem-bala Rio-São Paulo/Campinas chegou à fronteira da obsessão. Adiado pela terceira vez, devido à falta de interessados, o leilão foi remarcado para daqui a um ano. Incompreensível, se formos considerar apenas os fatos objetivos da questão.
Se o Brasil estivesse com sua infraestrutura em geral adequada às necessidades de movimentação de carga e deslocamento de pessoas, poderia fazer sentido debater um projeto de trem de alta velocidade. Mesmo assim, se as contas públicos também demonstrassem condições de suportar os subsídios, implícitos e explícitos, que este meio de transporte costuma exigir.
Mas nenhuma dessas condições existe, muito pelo contrário. As estradas estão cada vez mais precárias e lotadas, a malha ferroviária ainda acanhada e as capitais, engarrafadas. Vive-se a chamada “imobilidade urbana”, causada por baixos investimentos em sistemas de transporte de massa, em que se destaca o sobre trilhos, metrô e trens suburbanos.
Mesmo assim, continua na agenda do Planalto um projeto ilusório cujo custo apenas sobe: começou com uma estimativa de R$ 12 bilhões, passou para R$ 20 bilhões, agora está em R$ 33 bilhões e há estimativas que apostam em R$ 50 bilhões — a cifra que Dilma Rousseff mencionou, acossada pelo ressurgimento das manifestações de rua, como resposta às demandas por melhorias no transporte público. Não estava errada: o que poderá vir a ser gasto neste delirante projeto pode ampliar os metrôs do Rio e São Paulo, construir alguns outros e melhorar a malha de trens suburbanos.
Não se sabe sequer se as cifras são para valer. Quase certo que não sejam, dada a tradição de projetos oriundos do poder público sempre estarem com os custos subestimados. Até porque não há ainda projeto detalhado do trem-bala para uma estimativa de investimento consistente.
Como é do estilo do lulopetismo inaugurado pelas urnas em 2003, há uma estatal na área, a Empresa de Planejamento e Logística (EPL). Aí pode estar um empecilho ao sensato engavetamento do projeto desse trem. Porém, há muito o que fazer em planejamento de transporte no país, e a própria EPL está tratando de projetos de rodovias e ferrovias.
Se empresas ligadas ao caso do cartel montado para o fornecimento de trens para os metrôs de São Paulo e Brasília (Alstom e outras) estão interessadas no trem de alta velocidade, não importa. O projeto é dispensável por si mesmo, diante das outras prioridades óbvias que o país tem em transporte.
A opção não pode ser trem-bala ou nada. Melhorias na Dutra, nos aeroportos, sempre com a iniciativa privada, são mais aconselháveis. Assim como a destinação de boa parte do dinheiro público reservado ao projeto megalomaníaco para metrô e trens nas capitais. O pior erro é insistir nele.
14 de agosto de 2013
Editorial de O Globo
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