"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 13 de agosto de 2013

PRECE EM SILÊNCIO

           
          Artigos - Cultura        
preceDoreExiste algo em comum entre os santos: todos eles insistem na necessidade da oração constante. A santidade parece ser a arte de transformar a vida numa prece interminável. Podemos manter esse diálogo ininterrupto com Deus nas mais diversas situações – em casa, no trabalho, na rua, no telefone, na internet, na brincadeira com o filho, na conversa com os amigos, no passeio com o cachorro. Procuro rezar nos momentos mais improváveis, mesmo quando atendo um telefonema por engano, em que a pessoa pergunta se “é da casa do Severino”. O nome Severino me faz agora lembrar um poema – e por isso agradeço.
Leio “O Diário da Felicidade”, do monge ortodoxo romeno Nicolae Steinhardt, e anoto uma palavra que até então eu ignorava: hesicasmo. Aprendo que hesicasmo é uma prece monástica em que se invoca sem parar o nome de Deus, mesmo silenciosamente. Quando estava preso nos cárceres comunistas da Romênia, Steihardt tornou-se um hesicasta. Seu diário é uma longa e contínua oração de graças.
Vivemos tempos sombrios, e tempos sombrios pedem oração constante. O menino de 13 anos matou a família ou houve uma armação para responsabilizá-lo? O pedreiro Amarildo foi morto pela polícia ou por um traficante? A jovem goiana é vítima de ciúmes ou ódio? Todas as hipóteses são igualmente terríveis! Ou devemos distinguir crimes que servem e crimes que não servem?
Um maquiador, usuário de crack e maconha, mata a facadas a própria mãe e mais três pessoas – inclusive uma criança. O que têm a dizer aqueles que defendem a liberação das drogas e o fim das internações psiquiátricas compulsórias? O assassino do cartunista Glauco ganha a liberdade por ser “inimputável”. Você aceitaria ser vizinho dele?
Há uma frase assustadoramente bela atribuída ao pintor russo Alexei von Jawlensky: “A arte é a nostalgia de Deus”. Fascinante dubiedade: ou bem a arte é a nostalgia que nós sentimos de Deus, ou bem é a nostalgia que o próprio Deus sente em relação ao universo.
Quem nega os sentidos mais profundos da oração silenciosa acabará fatalmente substituindo-a por slogans políticos que se tornam cada vez mais agressivos. Os clichês revolucionários que infestam a nossa cultura passam a ser de eventuais a majoritários; de majoritários a obrigatórios; de obrigatórios a fatais. Só uma sociedade espiritualmente doentia pode levar a sério arruaceiros financiados com dinheiro público e que se apresentam como libertadores. Contra eles, é preciso seguir o antigo conselho: “Vigiai e orai”
Publicado no jornal Gazeta do Povo e no blog do autor, Com o Perdão da Palavra
13 de agosto de 2013
Paulo Briguet é jornalista.

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