Quando Rodrigo Constatino começou a escrever na imprensa, pareceu-me ver surgir um bom articulista liberal, contra os equívocos estatistas e outros, especialmente por não se entregar ao irracionalismo de certa direita hidrófoba, e nessa linha produziu ele muitos textos de real interesse, inclusive uma magnífica diatribe contra o politicamente correto que inclusive recortei.
Infelizmente tal posição parece que se vai perdendo, como no recente artigo “O humanista que amava Stalin”, sobre Oscar Niemeyer.
Para começar, em se tratando do valor do artista, vemos da parte do autor a típica declaração de tecnicismo segmentador que tanto idiotiza a humanidade: “Não sou da área, não posso julgar.”
Para apreciar arquitetura, a mais social das artes, é preciso “ser da área”?
Alguém precisa “ser da área” para sentir a beleza de uma vila palladiana, de uma catedral gótica ou de um edifício de Mies van der Rohe?
Nunca aprendi a tocar um instrumento musical, infelizmente, mas passei as melhores horas de minha vida ouvindo Bach ou Beethoven, Schubert ou Brahms, etc. etc.
Quem olha para o Palácio Capanema, a Catedral de Brasília ou o Ministério das Relações Exteriores da mesma capital e não sente qualquer estesia é um cego arquitetônico, e pronto.
Nelson Rodrigues, inteligência fulgurante, escreveu uma frase infeliz que caiu no gosto geral, “toda a unanimidade é burra”. Creio, humildemente, que quem quebra a unanimidade que há sobre Mozart ou Homero, Caravaggio ou Shakespeare, entre centenas de outros, é que é burro.
Sei como o contato com o lobby esquerdista pode ser enlouquecedor, mas atribuir o reconhecimento de Niemeyer a ele, ou dizer que ele não o teria se estivesse do outro lado ideológico, é um equívoco.
Ninguém nega o fabuloso talento da nazista Leni Riefenstahl, nem a genialidade dos direitistas Fernando Pessoa ou Jorge Luis Borges, ou do colaboracionista Louis-Ferdinand Céline. Por outro lado, não me consta que alguém valorize a abominável arquitetura da época de Stalin.
Vi Niemeyer criticar violentamente Stalin, embora provavelmente o amasse na época da união planetária contra o Eixo, como metade do mundo naquela conjuntura.
Quanto ao “prêmio” ou “castigo” pela construção de Brasília, esse deveria pertencer a Juscelino Kubitschek, não ao arquiteto de muitos dos seus prédios públicos, que Constantino chama de “responsável pelo caríssimo projeto de construção” da própria.
A classe política que está em Brasília é o exato espelho do povo que a elegeu, e não da cidade em que se instalou.
Quanto às obras de Niemeyer terem sido construídas com nossos impostos, fico muito feliz com o uso da parte que me cabe.
Como homem que alcançou um custoso horror a todos os totalitarismos, que entende que nenhuma vantagem material compra uma única migalha da liberdade do indivíduo, considero Oscar Niemeyer, excelente pessoa e artista magistral, um indivíduo politicamente equivocado, o mesmo, por exemplo, que Chico Buarque, fabuloso compositor popular que não tive a satisfação de conhecer.
O mais lamentável do artigo, no entanto, fica para a perífrase a respeito de certa “palavra que vem antes de craque e depois de crânio” para definir o grande arquiteto, ou seja, crápula.
Sou inimigo figadal de todos os ismos totalitários que em má hora a humanidade criou, sou vítima periódica do lobby de intelectuais orgânicos gramscianos, sou um homem religioso, portanto minha visão do mundo está nas antípodas do saudoso mestre.
Sou, portanto, para usar a palavra merecida, de direita, o que me faz muito feliz num momento em que as piores oligarquias feudais do Nordeste são de esquerda.
Apesar disso, acho lamentavelmente agressivo, perigosamente próximo da conhecida direita hidrófoba a que me referi, e, mais que tudo, destituída de toda a caridade humana pelas características alheias com que não compactuamos, uma afirmação como essa.
13 de dezembro de 2012
Alexei Bueno é poeta
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