"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 28 de maio de 2013

NOVOS MUNICÍPIOS

 

Subir na vida é desejo óbvio e natural de qualquer cidadão — e isso também é verdade para vilas e vilarejos. Todos sonham com uma promoção para a condição de cidades.

Há quase 20 anos, uma emenda constitucional retirou dos estados brasileiros o poder de emancipar vilas e vilarejos.

O motivo era óbvio: a emancipação era exagerada. Atendia a motivos políticos, e deixava de lado a exigência essencial de que as comunidades tivessem recursos para enfrentar o aumento de despesas públicas indispensáveis no novo patamar.

A situação pode mudar novamente: está para ser votado na Câmara dos Deputados um projeto de lei complementar que devolve às Assembleias Legislativas o poder de criar novos municípios.

Se for aprovado e sancionado, nascerão, segundo um levantamento do jornal, mais de 400 municípios, elevando o total de 5.570 para quase seis mil.

O desejo de subir na vida, pelo visto, é comum tanto nas cidades como nos cidadãos. Mas subir na vida pode custar caro.

Entre 2001 e 2010 — bem recentemente, portanto — foi criada uma batelada de municípios com até oito mil habitantes, e cada um deles tem orçamento anual de cerca de R$ 20 milhões. Mas todos eles têm futuro incerto: os processos que os criaram estão para serem julgados pelo Supremo Tribunal Federal.

Os defensores da leva de promoções, reunidos na Frente Nacional de Apoio à Criação de Novos Municípios, que alega ter o apoio de 350 parlamentares de diversos partidos, afirmam, sem medo da decisão do STF, que Assembleias de diversos estados deverão votar sobre a criação de 250 novos municípios — e aprovar o pleito de 180. Mas, além do julgamento do Supremo, a questão também será decidida no Congresso, segundo uma emenda constitucional de 1996.

É natural que os políticos locais desejem a promoção. Mas a emenda de 96 criou condições severas para isso, baseadas no tamanho da população e na situação econômica da comunidade.

Ela também exige um plebiscito no qual os maiores interessados, ou seja, a população local, aprovem a transformação da cidade em município.

E há números a serem respeitados. Recentemente, uma pesquisa da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro estudou a situação de 58 prefeituras criadas recentemente. Nelas foram criados mais de 30 mil cargos públicos. E receberam um total de R$ 1,3 bilhão ao longo de cinco anos. Mas, na maioria das cidades, isso não significou melhoria de vida para a população.

Como lembrou uma fonte da Firjan, a criação do município não traz, por si só, aumento de recursos que beneficie os cidadãos: “Gerar novos municípios não implica necessariamente obter nova arrecadação”, disse ela.

O número de distritos promovidos a município já permite que os cidadãos que pensem em imitá-los avaliem, com cabeça fria, as vantagens da mudança — e, principalmente, os riscos de uma transformação que é mais complexa do que pode parecer.

28 de maio de 2013
Luiz Garcia, O Globo

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