O que foi que na semana passada a ministra Maria do Rosário, dos Direitos Humanos, atribuiu à central de notícias da oposição?
O que Dilma, por sua vez, chamou de “desumano e criminoso”?
Lula, de ação praticada por “gente do mal”?
José Eduardo Cardozo, ministro da Justiça, de “manobra orquestrada”?
E Ruy Falcão, presidente nacional do PT, de “terrorismo eleitoral”?
No sábado 18, e no dia seguinte em 13 estados, um milhão de clientes do programa Bolsa Família invadiu agências lotéricas para sacar suas mesadas fora do dia marcado. Boatos davam conta de que o programa seria extinto ou suspenso. Ou que Dilma autorizara o pagamento de um bônus.
Houve quebra-quebra. A polícia foi acionada.
A ministra Maria do Rosário corrigiu-se poucas horas depois de ter pendurado na conta da oposição as consequências dos boatos. Qualificou de “singela” sua própria opinião — não mais do que "singela". E garantiu com a inocência que Deus lhe deu: “Não quero politizar”.
Ora, ora, ora…
Quem por meio de uma “manobra orquestrada” poderia fazer “terrorismo eleitoral”? Aliados do governo? Claro que não.
Uma vez politizado o episódio, politizado está. Só que aos poucos ameaça se voltar contra o governo. Na melhor das hipóteses teria sido um caso de má gestão polvilhado com mentiras.
Entre as tardes do sábado e do domingo, quando pessoas em desespero se empurraram e depredaram agências lotéricas na caça ao tesouro do Bolsa Família, dois gerentes regionais da Caixa Econômica sugeriram que um erro do sistema de pagamento seria o responsável pela liberação do dinheiro em desacordo com o calendário do programa. Um deles, Hélio Duranti, do Maranhão, foi preciso.
“Os boatos surgiram após um atraso no pagamento do benefício ocorrido em todo o país. A situação foi normalizada, mas muita gente procurou os caixas eletrônicos ao mesmo tempo e o dinheiro acabou”, disse ele. “Quem não encontrou ficou revoltado e quebrou os caixas”.
A ministra Tereza Campello, do Desenvolvimento Social, preferiu observar: “Não existe qualquer motivação para que a gente pudesse gerar esse tipo de intranquilidade para a população”.
Será?
A direção da Caixa Econômica atravessou a semana negando que tivesse mexido no calendário de pagamento. Até que na última sexta-feira, a Folha de S. Paulo encontrou em Caucaia, região metropolitana de Fortaleza, a dona de casa Diana dos Santos, 34 anos. Na sexta anterior ela fora a um caixa eletrônico sacar os R$ 32,00 do Bolsa Família referentes a abril. Ao inserir seu cartão, sacou os R$ 32,00 de abril e os R$ 32,00 de maio.
“Recebo o Bolsa Família há anos e nunca pagaram antecipadamente”, comentou Diana. “Acho que outras pessoas receberam também, avisaram aos conhecidos e virou essa confusão”.
A Caixa inventou então outra história depois que se desmanchou no ar a história que ela vinha contando. Soltou uma nota dizendo:
— A Caixa Econômica esclarece que vem realizando, desde março, diversas melhorias no Cadastro de Informações Sociais. Em consequência desse procedimento, na sexta-feira (17), primeiro dia do calendário de pagamentos de benefícios do Bolsa Família do mês de maio, o banco disponibilizou o saque independentemente do calendário individual.
O pagamento é feito levando-se em conta o último número do cartão magnético de cada bolsista. A Caixa liberou o dinheiro para pagar de vez a todo mundo, mas não avisou a ninguém. De resto, não explicou como uma operação dessa natureza pode melhorar seu Cadastro de Informações Sociais.
É razoável desconfiar que a Caixa mentiu outra vez.
Para mudar o sistema de pagamento do Bolsa Família permitindo saques em outras datas, o Conselho Deliberativo da Caixa teria de ser obrigatoriamente consultado — e não foi, segundo me contou um dos seus membros. Ou informado — e também não foi.
A Caixa esconde que houve uma falha no sistema, o que tornou possíveis os pagamentos fora de hora.
No dia em que a Folha pegou a mentira da Caixa, uma fonte da Polícia Federal, mediante a garantia prévia de anonimato, revelou ao O Globo em Brasília que fora localizada no Rio de Janeiro a central de telemarketing responsável pela difusão dos boatos.
Não disse o nome da central. Nem do seu proprietário. Não disse quem a contratou. Nem como a central teve acesso aos números de telefones de inscritos no Bolsa Família.
Sem acesso aos números de telefones como a central poderia disseminar boatos?
Enquanto a Polícia Federal não revelar o nome da empresa e não apresentar o criminoso que encomendou o serviço, sobreviverá a suspeita de que ela mente para livrar a cara da Caixa Econômica.
28 de maio de 2013
ricardo noblat
Nenhum comentário:
Postar um comentário