Protestos voltam a ocupar a capa do New York Times. Imprensa internacional destaca confrontos durante as manifestações
Mais uma vez, o jornal americano The New York Times dedicou um grande espaço de sua primeira página aos protestos que se espalharam pelo Brasil. O artigo do correspondente Simon Romero destaca que o crescimento das manifestações surpreendeu até mesmo quem as iniciou. Citando Mayara Vivian, uma das líderes do Movimento Passe Livre, o texto diz que ela “ficou assombrada, sem conseguir explicar” a multidão que tomou as ruas esta semana. “Nunca teríamos imaginado isso. É como a tomada da Bastilha”.
O texto afima que o Brasil, um país que já foi visto como um “exemplo estelar de crescimento de um poder democrático se encontra abalado por uma revolta sem caráter definido, sem líder, com um tema unificador: uma raivosa, e às vezes violenta, rejeição à política habitual”.
As manifestações em várias cidades brasileiras são comparadas ao movimento Occupy Wall Street, nos Estados Unidos, aos protestos anticorrupção que eclodiram na Índia nos últimos anos, aos movimentos por mais qualidade de vida em Israel, ou ainda à indignação com a crise financeira em nações europeias como a Grécia. “Os manifestações no Brasil estão fartos das estruturas políticas tradicionais, e cobram tanto o partido do governo quanto a oposição. E suas demandas são tão difusas que deixaram as lideranças confundidas sobre como satisfazê-las”.
Protestos no Brazil estamparam a capa do jornal The New York Times desta sexta-feira
Concessões específicas, afirma a reportagem, não foram suficientes para aplacar os protestos. Nem a tática da presidente Dilma de reconhecimento público da legitimidade da ira e das ambições dos manifestantes. Os ativistas afirmam que o movimento não surgiu do nada. Mas não conseguem explicar qual mudança levou uma multidão a sair às ruas em todo o país.
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A rede americana CNN, que também tem dedicado espaço à cobertura dos protestos no Brasil, lembrou nesta sexta-feira que as manifestações continuaram mesmo depois do recuo de várias prefeituras em relação ao aumento das tarifas do transporte público. A reportagem questiona se a decisão “veio muito tarde”. A matéria lembra a insatisfação com a alta carga de impostos tendo em contrapartida a oferta de serviços precários na saúde e na educação, e os bilhões gastos pelo governo nas preparações para a Copa do Mundo.
Confrontos – Os episódios de violência registrados durante os protestos desta quinta-feira também chamaram a atenção da imprensa internacional. O argentino Clarín ressaltou que “das manifestações, que haviam começado de forma pacífica, se desgarraram grupos que atentaram contra os principais prédios públicos”, citando os eventos em Brasília e no Rio de Janeiro, onde dezenas ficaram feridos. O jornal também citou os protestos em São Paulo, destacando que “militantes de esquerda foram hostilizados pelos mais radicais, que levavam facas”.
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O britânico The Guardian falou em 2 milhões de manifestantes em todo o país, com confrontos registrados em Belém, Porto Alegre, Salvador, Brasília, Campinas, São Paulo e também no Rio de Janeiro, onde, relatou o jornal, “uma minoria atirou pedras, incendiou carros e destruiu postes de luz”. “E a polícia respondeu atirando spray de pimenta e balas de borracha na multidão”.
O repórter fotográfico da agência Reuters Kai Pfaffenbach escreveu um texto explicitando sua paixão por fotografar jogos de futebol e reconhecendo que, ao ser enviado ao Brasil para registrar a Copa das Confederações, não esperava ter de fazer imagens também de confrontos nas ruas. Ele contou que chegou a ficar na mira de um policial durante uma manifestação e conclui: “Para nós [fotógrafos] é hora de usar equipamento de proteção para nos mantermos seguros”. “Quando eu fiz as malas na minha casa na Alemanha há duas semanas, eu não esperava nada desse tipo, por isso estou sem equipamento de segurança e tenho que improvisar”, admitiu. “Faltando dez dias para o fim do torneio, para ser honesto, eu não espero que os protestos parem até a final. Até mesmo uma grande apresentação da seleção não vai interromper a marcha das pessoas por condições de vida melhores e mais justas”.
Repórter fotográfico Kai Pfaffenbach registra ação policial durante protesto contra a Copa das Confederações em Fortaleza
Pfaffenbach acrescenta que, se voltar para trabalhar na Copa do Mundo, no ano que vem, vai trazer uma segunda mala com seu equipamento de segurança, “por via das dúvidas”. “Mas espero que não vá precisar disso. Seria ótimo se os políticos fizessem alguma coisa e reagissem às demadas do povo. Se isso acontecer, podemos esperar pela maior festa do futebol, mas se não, eu acredito que os protestos que estamos vendo agora serão apenas um leve aquecimento para confrontos ainda mais pesados no ano que vem”.
Futebol – No espanhol El País, o correspondente Juan Arias dedicou-se a falar sobre a declaração de Pelé que repercutiu negativamente em meio aos protestos. O jornalista avaliou que o ex-jogador pediu que as pessoas “esquecessem toda essa confusão” e apoiassem a seleção brasileira, “talvez sem entender a força das manifestações – que não são contra a seleção, mas contra os políticos que, segundo as pessoas acreditam, têm esbanjado milhões inflando os orçamentos da construção dos estádios”.
O texto ressalta que Pelé é “uma peça fundamental deste Mundial, mimado tanto pelo governo como pela Fifa”. E que as duas instituições agora são questionadas nas ruas. “Pelé se viu apanhado entre a fidelidade ao apoio oficial à Copa, contestado pelo movimento popular, e o medo de cair em desgraça com as pessoas que estão nas ruas. Sua angústia e sua retratação são compreensíveis”. “E talvez seu recuo signifique que o velho e astuto jogador viu que as ruas começam a triunfar, enquanto os palácios tremem”.
21 de junho de 2013
Veja
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