Eum sinal de que fez bem o Supremo Tribunal Federal em não desmembrar o processo, pois, sendo a última instância de nosso sistema judiciário, a decisão que sair de seu plenário é irrecorrível.
Se, com todos os cuidados tomados pelo relator Joaquim Barbosa para não atrasar o processo, ele levou cinco anos para chegar ao julgamento, imagine se a maioria dos processos estivesse tramitando a começar pela primeira instância do Judiciário.
Isso sem falar da tentativa rasteira de colocar sob suspeição o ministro Gilmar Mendes, incluindo-o em uma lista forjada de beneficiários do mensalão mineiro. Manobra tão primária que o suposto autor da lista, o empresário Marcos Valério, negou sua autenticidade em nota oficial.
A mais recente manobra da defesa é o pedido de vista do processo pelos advogados Márcio Thomaz Bastos e José Carlos Dias, sob a alegação de que o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, enviou na última semana um documento aos 11 ministros do Supremo ao qual a defesa dos réus não teve acesso.
Os advogados usam a justificativa de que a defesa tem a última palavra e precisam tomar conhecimento do que diz Gurgel para apresentar o contraditório.
Vários advogados consultados, no entanto, consideraram a manobra meramente procrastinadora, com pouquíssimas chances de ser acolhida.
O memorial que o procurador-geral Roberto Gurgel enviou aos ministros não é anexado aos autos e, portanto, não é um “novo documento” que precise ser analisado.
É comum os advogados fazerem tais memoriais às vésperas dos julgamentos, para facilitar o trabalho dos juízes, razão também alegada por Gurgel.
Têm sido feitas tantas tentativas de adiar o julgamento do mensalão que fica claro que o que querem os réus é mesmo não serem julgados.
O do ex-tesoureiro Delúbio Soares foi feito pelo advogado Arnaldo Malheiros. Já o ex-ministro José Dirceu, acusado pela Procuradoria Geral da República de ser o “chefe da quadrilha” tem 16 páginas em papel cuchê.
Antes da tentativa dos advogados dos réus, outros cinco advogados de São Paulo, ligados ao PT, mas sem atuação direta no caso, haviam enviado à presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, um manifesto no qual defendem que é inoportuno julgar a ação do mensalão durante o período eleitoral, alegando “desequilíbrio, em desfavor dos partidos envolvidos’,’ pelo fato de que as sessões do Supremo serão televisionadas, e o assunto será tema dos meios de comunicação justamente durante a campanha eleitoral.
Como o assunto já foi, por óbvio, devidamente analisado pelo plenário do Supremo, que não viu impedimento para marcar o julgamento a começar nesta quinta-feira, dia 2, esse é outro movimento que se destina mais a pressionar o Tribunal do que a ter efeito prático.
Outra pressão externa sobre o Supremo veio nada menos que do Tribunal de Contas da União. Surpreendentemente, com base em uma lei aprovada em 2010 e às vésperas do início do julgamento do mensalão, a ministra do TCU Ana Arraes (ex-deputada federal e mãe do governador de Pernambuco, Eduardo Campos) reverteu uma decisão anterior do próprio TCU e considerou legais os contratos da agência de publicidade DNA, empresa de Marcos Valério, com o Banco do Brasil, mesmo não tendo o empresário mineiro devolvido os “bônus de volume” como previsto.
Para o advogado de Marcos Valério, Marcelo Leonardo, a nova decisão do TCU, atestando a legalidade da apropriação do bônus, deve ser analisada pelos ministros do STF.
O TCU havia constatado anteriormente que a agência de Marcos Valério não fazia o repasse dos “bônus” ao Banco do Brasil, embora essa obrigação estivesse estipulada em contrato, dando prejuízo aos cofres públicos de mais de R$ 106 milhões.
Esse dinheiro era uma das fontes do valerioduto que financiou o mensalão. O objetivo da lei aprovada cinco anos depois do fato acontecido é justamente legalizar a posse desse dinheiro pela agência de publicidade e tentar descaracterizar o uso do dinheiro público no esquema do mensalão.
A manobra é tão acintosa que o próprio procurador do TCU está recorrendo contra a decisão. Como o TCU é um órgão auxiliar do Congresso, e não um membro do Poder Judiciário, essa manobra caracteriza-se como uma jogada político-partidária e provavelmente não terá efeito direto na decisão dos juízes do Supremo.
01 de agosto de 2012
Merval Pereira
Fonte: O Globo
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