Ex-advogado do PT, o ministro José Dias Toffoli analisa a participação
no julgamento do mensalão. Para juristas, antigas relações profissionais com
réus do caso não seriam impeditivos para o magistrado analisar as acusações
A dois dias do início do julgamento do mensalão, advogados,
representantes da Procuradoria Geral da República e os réus do escândalo ainda
não sabem quantos magistrados vão de fato analisar o caso em plenário. A dúvida
cresce na mesma proporção em que aumentam na cidade as especulações a respeito
da participação do ministro José Antônio Dias Toffoli no julgamento. Juristas,
advogados envolvidos no caso e integrantes do próprio Supremo Tribunal Federal
(STF) se dividem sobre a participação de Toffoli na análise do processo. Isso
porque o ministro já advogou para o Partido dos Trabalhadores — legenda de onde
saíram os principais réus do caso do mensalão. Além disso, sua companheira, a
advogada Roberta Rangel, fez a sustentação oral de defesa de um dos 38 acusados
no início do caso. A pessoas próximas, Toffoli já revelou a determinação em
participar do julgamento. Ele está estudando até mesmo votos de atuais e
ex-ministros em casos que envolviam os interesses do governo que os havia
indicado.
A companheira do ministro deixou a defesa do ex-deputado federal
Professor Luizinho antes mesmo que ele virasse ministro do Supremo. Hoje, ela
não tem mais relação profissional com nenhum dos réus. Mas alguns juristas citam
o Artigo 252 do Código de Processo Penal como justificativa para pedir que
Toffoli fique fora do caso. Esse trecho da lei diz que o magistrado não pode
atuar nos processos em que o cônjuge ou parente de até terceiro grau já tenha
participado como advogado. Roberta Rangel e Toffoli não são casados, mas alguns
especialistas ouvidos pelo Correio acreditam que, hoje em dia, um relacionamento
estável tem o mesmo peso legal do casamento.
Entre os que são contra a participação de Toffoli, outro argumento é a
sua antiga ligação com o PT. Como ele também foi assessor jurídico da Casa Civil
durante a gestão do ex-ministro José Dirceu, isso é citado como justificativa
para os que defendem que ele fique de fora do julgamento do mensalão. Para o
presidente da Associação dos Magistrados do Brasil, Nelson Calandra, uma antiga
relação de trabalho não é justificativa para Toffoli deixar o caso. "A suspeição
é prevista quando o magistrado é amigo íntimo do réu, por exemplo. O fato de um
juiz ter, no passado, trabalhado junto com o acusado não implica na necessidade
de suspeição", comenta Calandra.
No meio jurídico, existe até mesmo a especulação de que Toffoli
poderia se declarar impedido de julgar alguns dos réus, como Dirceu ou Professor
Luizinho, sem abrir mão do processo como um todo. Mas o ex-ministro do STF
Carlos Velloso acredita que essa solução não seria possível. "Se houver
declaração de suspeição, tem que ser para o processo todo. O STF não mandou o
caso para o primeiro grau no caso dos réus que não têm foro privilegiado
justamente porque as acusações se interligam, é preciso julgar o processo como
um todo", comenta o jurista.
Indicativo
Dois ministros do STF ouvidos de forma reservada pelo Correio avaliam
que Toffoli não deveria participar do julgamento, embora acreditem que ele
decidirá por julgar a ação penal do mensalão. Entre os advogados, a maior parte
manifesta-se no sentido de que não há impedimento ou suspeição para que Toffoli
aprecie o processo. Defensor do empresário Marcos Valério, Marcelo Leonardo diz
acreditar que o ministro paulista estará em plenário julgando o mensalão. "O
ministro Toffoli já julgou dois agravos regimentais no curso dessa ação. É uma
indicação de que não há nenhum obstáculo", afirmou o advogado de Valério.
O presidente do Supremo, Carlos Ayres Britto, afirmou ontem que não
cogita a possibilidade de algum ministro da Corte propor o impedimento de
Toffoli nesse processo. "Ele pode decidir (se participará do julgamento) até o
dia da sessão ou até durante a sessão, se essa questão for suscitada." Britto
chegou a dizer, em entrevista a jornalistas na tarde de ontem, que o fato de
Toffoli ter participado em plenário da análise de questões de ordem referentes
ao mensalão "sinaliza a participação" dele no julgamento.
O presidente do STF, porém, retificou sua resposta na sequência.
"Ninguém estabeleceu esse vínculo entre o fato de o ministro Toffoli participar
da questão de ordem e a pré-disposição dele para participar do julgamento. Não
me preocupa isso, ele saberá decidir", afirmou o presidente da Corte. Uma pessoa
próxima ao ministro Toffoli revelou ao Correio que o ministro estudou outros
casos polêmicos em que os magistrados não pediram afastamento. "Ele pegou casos
que mostram como Maurício Corrêa se comportava em casos relacionados ao governo
Itamar; processos do Celso de Mello com relação ao Saulo Ramos; ou do Ilmar
Galvão no processo do Collor. São pessoas que não se julgaram impedidas de
votar", comentou a fonte.
Pedido de suspeição
Ontem, o STF recebeu a primeira manifestação oficial a respeito da
participação de Dias Toffoli no julgamento. O advogado de Mato Grosso do Sul
Paulo Magalhães Araújo apresentou petição defendendo que o ministro se declare
suspeito. O STF não deve acatar o pedido porque, como não é parte no processo, o
advogado não teria legitimidade para apresentar a petição.
O que diz a lei
Código de Processo Penal a respeito de impedimento e suspeição:
» O magistrado não poderá julgar processo em que seu cônjuge ou
parente de até terceiro grau tenha atuado como defensor, advogado, órgão do
Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da Justiça ou perito.
» Ele também não pode julgar os casos em que tiver desempenhado essas
mesmas funções ou servido como testemunha
» O magistrado não pode atuar nos casos em que já trabalhou como juiz
de outra instância
» É vedada a participação do juiz em um caso se ele próprio, seu
cônjuge ou parente de até terceiro grau for parte ou diretamente interessado no
feito
Código de Processo Civil:
» Não é permitido a um juiz exercer funções no processo de que for
parte; em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, atuou
como órgão do Ministério Público, ou prestou depoimento como testemunha. Também
é proibida a sua atuação nos casos em que atuou em outras instâncias ou quando
seu cônjuge ou parente de até terceiro grau trabalhou como advogado da parte.
» Há suspeição de parcialidade do juiz quando ele for amigo íntimo ou
inimigo capital de qualquer das partes; quando alguma das partes for credora ou
devedora do juiz, de seu cônjuge ou de parentes ou quando ele receber presentes
antes ou depois de iniciado o processo.
Correio Braziliense (DF) - 31/07/2012
HELENA MADER, DENISE ROTHENBURG, DIEGO ABREU e JOSIE JERONIMO
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